Jornal Correio Braziliense

Cidades

Rádio ligada ao senador Gim Argello será investigada pelo governo

O Ministério das Comunicações verificará se regras de outorga na concessão da emissora foram descumpridas. Já a Caixa Econômica vai apurar sorteios de dinheiro vivo e indícios de que muitos premiados pela Nativa FM não existem

O governo federal vai apurar denúncia de que rádio sob a influência do senador Gim Argello (PTB) age de má-fé ao divulgar falsas promoções e realizar sorteios fora da lei. Emissora turbinada com recursos do Orçamento da União, a Nativa FM usa métodos questionáveis para atrair ouvintes. Em seu leque de brindes, oferece até R$ 20 mil em dinheiro vivo, o que é proibido pela legislação. E o mais grave: há evidências de que ganhadores anunciados na grade de programação não existem. Responsável pela fiscalização dos jogos que envolvem sorte, a Caixa Econômica Federal (CEF) anunciou ontem em nota que vai analisar o caso da Nativa FM para tomar providências. O Ministério das Comunicações vai investigar se houve descumprimento das regras de outorga na concessão da rádio. O ministro da pasta, Paulo Bernardo, comentou o assunto ontem: ;Isso tem que ser resolvido com fiscalização. Se tiver transgressão à lei tem de haver punição;.

Reportagem publicada na edição de ontem do Correio revelou que a rádio administrada por Jorge Afonso Argello Junior, o filho de 19 anos de Gim Argello, premiou com um tanque de gasolina um carro que não existe. Ao divulgar o ganhador, o locutor da emissora informou que o dono de um Megane de placa NFS 3658 seria o contemplado. Consulta ao sistema do Departamento de Trânsito esclarece, no entanto, que a placa é real. Mas pertence a um Uno Mille Fire de Caldas Novas (GO).

O diretor da rádio Nativa FM, Solano Reis, apresentou uma justificativa na tentativa de explicar a inconsistência da premiação. Disse que o locutor se confundiu, afirmou no ar que o ganhador era dono de um Megane, quando na verdade, esclareceu ontem ao Correio, ;o carro era um XTerra;. ;Ele só se confundiu, mas a pessoa existe;. Denúncia com uma lista de premiações que podem ter sido dadas a ouvintes fantasmas foi entregue ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDF). Nessa relação, há nomes de pessoas que não existem ou já morreram.

A isca da Nativa FM para atrair ouvintes são brindes generosos. Há ofertas de carro 0km, reforma da casa, viagem para qualquer lugar do planeta e até dinheiro vivo: R$ 20 mil. A Caixa Econômica alerta para a legislação que proíbe a distribuição de prêmios em espécie. O parágrafo 3; do artigo 1; da Lei n; 5.768 de 20 de dezembro de 1971 veda a entrega de dinheiro ou a conversão de brindes em moeda. Até a noite de ontem, a propaganda das promoções em espécie estava estampada na página oficial da emissora. O Ministério das Comunicações vai apurar se houve abuso na concessão pública da rádio que foi destinada ao ex-senador Luiz Estevão.

Amigos
O parlamentar cassado em 2000 arrendou a emissora ao radialista Antônio José Pereira Garcia, o Toninho Pop, em abril de 2009. Amigo de Gim, ele foi uma das apostas do senador para as últimas eleições. Concorreu à Câmara dos Deputados, mas perdeu. O apoio de Gim a Toninho Pop despertou ciúmes em outros candidatos. Mesmo assim, ele não se elegeu com os 21.326 votos que conquistou. Para ter direito de explorar por cinco anos a rádio liberada pelo governo a Luiz Estevão, Toninho Pop paga uma espécie de aluguel ao ex-senador. Começou nos primeiros seis meses com repasses de R$ 50 mil, valor que foi corrigido, primeiro, para R$ 75 mil e, agora, para R$ 100 mil mensais.

O contrato de arrendamento está em nome de Toninho Pop. A participação da família Argello foi definida por meio de contrato paralelo firmado com a empresa AMJ Ltda. de Jorge Affonso Junior. O assessor de comunicação do senador Gim Argello, Jorge Eduardo Antunes, informou que o rapaz não tem mais vínculo com a Nativa FM, pois em 3 de dezembro último encerrou o contrato com a emissora. O rompimento coincidiu com o período em que Gim renunciou à relatoria-geral do Orçamento da União de 2011 por conta de denúncias que ligavam repasses de recursos federais à rádio então administrada pelo filho. A situação do senador se complicou ainda mais depois das descobertas de que ele também conseguiu a liberação de emendas para entidades de fachada e cujo dinheiro acabou nas mãos de laranjas.

Funcionário
Jorge Affonso Argello Júnior é assíduo frequentador da Nativa FM, no Setor de Rádio e TV Sul, desde 2009. Apesar de o assessor de Gim Argello informar que o jovem não tem mais ligação com a emissora, até ontem, uma foto do filho do senador constava no site oficial da rádio, entre os funcionários que trabalham no local. Ele aparece vestido com a camiseta com o slogan da Nativa.
Colaboraram Adriana Bernardes, Luciano Pires e Denise Rothenburg



Cinco perguntas para - Solano Reis diretor da rádios Nativa FM

Qual é o vínculo do senador Gim Argello com a Rádio Nativa FM?
Não existe nenhuma ingerência política do Gim na Nativa. O Gim nunca esteve na rádio. O que existia era uma empresa que administrava a rádio comercialmente e essa empresa tinha o filho dele como sócio. Não tem mais.

Jorge Afonso Argello Júnior trabalha com vocês?
Tem três meses que ele não aparece na rádio. Ele saiu do quadro societário da empresa que administrava a Nativa comercialmente. Nunca teve nada a ver com as promoções e premiações da rádio.

O que ocorreu no caso do sorteio de um tanque de combustível a um carro que não existe?
O que deve ter ocorrido foi um erro de pronúncia do locutor. Um dígito errado no site do Detran muda tudo. Mas se pegar o nome do cara e o CPF vai ver que ele existe e ganhou o prêmio.

Então o locutor errou inclusive o modelo e a marca do carro?
É, o locutor errou a marca do carro, a placa bate.

E sobre as promoções em dinheiro proibidas pela Caixa?
Isso para mim é uma novidade que fiquei sabendo agora, através
da própria reportagem de vocês. O dinheiro que a gente está dando aqui ainda vai ser sorteado. Ainda que contra a lei, não é fantasma, a gente vai dar o prêmio.

Opinião do internauta
Leitores comentaram, no site do Correio, a reportagem com a denúncia sobre a rádio ligada à família Argello. Confira alguns trechos:

Sérgio Gaze
;Temos que cobrar do Senado Federal, processo por quebra de decoro. Urgente!”

Elias Amorim
;Ei, não era esse cara que no ano passado estava no Congresso comemorando a conquista do seu 1; R$ bilhão? Isso mesmo, bilhão. Desse jeito fica fácil, não, senador?;

Lucy Barros
;A bola da vez é Gim Argello, se ele piscar é perigoso, será que ele não vê que a maré não está para peixe! Cale-se, Gim, nem procure se justificar, será pior. Você tem excelentes assessores que podem trabalhar em prol do resgate de sua boa imagem.;

Vilson Santos
;Estou de luto! Esse cara parecia sério. Que vergonha para o país.;

Jerusa Dantas
;Só digo uma coisa: um dia a casa cai.;

Simão Moreira
;É apenas mais um político enlameando ainda mais a má fama dos espertalhões do DF. Temos que ter a consciência de saber escolher na hora de votar.;

Marcus Rodrigues
;O rápido enriquecimento de Argello lhe rendeu pendências na Justiça. Ele responde a processo no STF por lavagem de dinheiro, crimes contra o patrimônio, apropriação indébita, ocultação de bens, peculato e corrupção passiva. Deus queira que um dia aconteça de eu ter R$ 1 bilhão.;

Luis Ho
;Este senador sem voto, suplente de outros sem moral, nunca me enganou. Sabe fazer amigos: José Sarney, Renan, Fernando Collor e outros, só grandes amigos, que sempre estão no poder.;

Karina Pena
;Promoções em dinheiro são vedadas? Tem muita rádio de Brasília fazendo isso diariamente, é bom investigar todas.;

Rosângela Barros
;É uma vergonha esse nosso país. Os políticos nos fazem de idiotas o tempo todo e a o Judiciário nada faz. Um detalhe, esses prêmios são com o nosso dinheiro. É mais um escândalo que vai sair impune.;

Alessandro Nascimento
;Dizem que há muita gente séria e honesta... Acredito que há poucos, muito poucos.;

Vilson Santos
;Não podemos mais confiar em ninguém mesmo. É o fim do mundo, só Deus pode nos salvar, no Brasil só tem político querendo se beneficiar de dinheiro publico. Isso é um absurdo! Eu particularmente confiava no personagem principal desta matéria, estou arrasado com essa reportagem.;

João Neto
;Como disse Charles de Gaulle: ;O Brasil não é um país sério;. Se fosse um país sério, o Conselho de Ética do Senado já teria tomado providências em relação a outros episódios em que o nobre senador se viu envolvido.;