As fraudes envolvendo a Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec) vão muito além das que culminaram na saída de Timothy Mulholland do cargo de reitor da Universidade de Brasília (UnB), em 2008, e na condenação de três empresários e um professor, no mês passado. Diferentes e tão ou mais graves irregularidades são apontadas por auditoria realizada pela Controladoria-Geral da União (CGU). O resultado do trabalho realizado pelo órgão vinculado à Presidência da República está em um relatório de 110 páginas, ao qual o Correio teve acesso com exclusividade.
O documento sigiloso detalha as ilegalidades contidas em nove ;projetos; gerenciados pela Finatec e mantidos com dinheiro público repassado pela UnB. Entre tantos itens, chama a atenção as semelhanças nos pagamentos por serviços prestados na área de informática. Indícios de um esquema criminoso, segundo os analistas da CGU. Eles destacaram coincidências como notas fiscais com layout e padrão de impressão muito parecidos, talões de notas ficais impressas pela mesma gráfica e contas bancárias para recebimento abertas no mesmo banco e agência (veja quadro).
Após analisar as notas fiscais, os técnicos do governo federal foram aos endereços das empresas emissoras dos comprovantes de pagamentos. Além de mostrar que todas tinham o mesmo contador responsável, concluíram que elas também não possuíam estabelecimento comercial.
Quatro funcionavam em casas e, pior, três não existiam. Ou sejam, seriam empresas de fachada. Por meio de apenas 16 notas fiscais emitidas por tais firmas e escolhidas aleatoriamente pelos analistas, a Finatec pagou R$ 55 mil em serviços como manutenção de computadores e impressoras. Tudo sem licitação.
Pagamentos ilegais
Além da emissão de notas fiscais aparentemente frias, os analistas da CGU constaram ilegalidades como ;pagamentos de serviços prestados à Finatec por professores em regime de dedicação exclusiva na UnB, contratação de ocupantes de cargo de direção da universidade pago com recursos do Centro de Seleção e de Promoção de Eventos (Cespe), pagamentos de serviços prestados à Finatec por servidores públicos;, e tantas outras. A auditoria do TCU reforça denúncias feitas pelo Ministério Público Federal e pelo Ministério Público do DF, após investigações concluídas em 2008 e que resultaram em ações judiciais contra ex-dirigentes da UnB e da Finatec.
Conforme mostrou o Correio ontem, um dos processos rendeu a condenação de quatro pessoas a penas que chegam a 10 anos e 10 meses de prisão por apropriação indébita, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. Elas, segundo o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), desviaram quase R$ 30 milhões que deveriam ser destinados à produção acadêmica da UnB. Todo esse montante saiu da instituição de ensino superior por meio da Finatec.
A fraude era encabeçada, segundo o TJDFT, pelo consultor gaúcho Luis Antônio Lima, e por sua mulher, Flávia Camarero. Além deles, foram condenados o sociólogo Eduardo José Grin, sócio do casal, e o professor de engenharia Antônio Manoel Dias Henriques, ex-diretor-presidente da Finatec.
Os quatro podem recorrer da sentença em liberdade. Advogados do grupo negam que tenha havido crime de lavagem de dinheiro ou desvio de recursos públicos. No caso de Luis Lima, da mulher e de Eduardo Grin, o defensor afirma que não houve crime de lavagem porque os valores foram depositados nas contas deles próprios. Já o advogado de Antônio Manoel Dias Henriques garante que seu cliente comprovou a origem de todos seus bens.
A lixeira
A Finatec protagonizou o escândalo da compra de mobília, incluindo uma lixeira de R$ 1 mil, para o apartamento funcional do ex-reitor da UnB Timothy Mulholland. Em novembro, a Justiça Federal inocentou-o da acusação de improbidade administrativa, mas o Ministério Público recorreu.
Conselho aprova volta da fundação
; Após ficar mais de um ano sob intervenção judicial devido às denúncias de irregularidades em vários contratos com a administração pública, a Finatec voltou à UnB no mês passado. O Conselho Universitário (Consuni) aprovou o recredenciamento na instituição de ensino em outubro. Por 34 votos a favor, 15 contra e duas abstenções, os professores entenderam que o retorno da Finatec será benéfico para a universidade.
Semelhanças suspeitas
Indícios de fraude apontados por analistas da CGU em pagamentos feitos pela Finatec por serviços prestados na área de informática.
; Notas fiscais com numeração baixa, emitidas do primeiro talão.
; Notas fiscais com leiaute e padrão de impressão semelhantes.
; Talões de notas ficais impressas pela mesma gráfica.
; Contas bancárias para recebimento abertas no mesmo banco e agência.
; Todas as empresas abertas como firmas individuais.
; Mesmo contador responsável para todas as empresas.