O Ministério Público de Goiás (MPGO) recomendou a internação de um menino de 13 anos que foi flagrado à 0h30 de ontem violentando sexualmente uma vizinha, na Cidade Ocidental (GO). O adolescente já havia estuprado outras seis mulheres nos últimos dois meses, além de ter praticado pequenos furtos na região, mas nunca foi encaminhado a uma instituição para menores infratores. Até o fechamento desta edição, o menino ainda não havia sido transferido para o Centro de Atendimento Socioeducativo de Luziânia (Case), onde pode cumprir internação de até três anos.
A última vítima de Júnior* foi surpreendida quando estava sozinha com a sobrinha, de 12 anos, e a filha, de 13. O menino pulou o portão da casa e rendeu a mulher de 34 anos com uma pistola de brinquedo. O adolescente então pegou uma faca da cozinha, com a qual ameaçou a vítima para que ela amarrasse as crianças e o acompanhasse até o quarto de casal, onde a violentou. Somente quando Júnior se distraiu com a bolsa da mulher ela teve coragem de atacá-lo para tomar a faca dele, ferindo as mãos do garoto. Uma das meninas que estavam presas em um quarto separado conseguiu soltar os pés da calcinha de lycra que os amarrava e correu para a rua para pedir ajuda aos vizinhos. Os gritos atraíram um policial militar, que flagrou Júnior nu, ao lado da vítima em choque. ;Ouvimos o choro e entramos na casa. Vi a mulher no chão, com a faca na mão. Ela estava com a blusa aberta, toda descabelada, em choque;, conta uma das vizinhas, que acompanhou o resgate.
Essa foi a primeira vez que o menino foi pego em flagrante, mas o adolescente já acumula sete ocorrências por estupro. Apesar dos testemunhos de vítimas e de provas dos atos infracionais, os pedidos de internação de Júnior sempre foram negados seguindo recomendações do MPGO. ;Fizemos nosso trabalho, mas não comento as decisões deles (MPGO). Agora o destino dele está na mão do juiz;, lamenta o delegado da Cidade Ocidental, Rafael Camargo. ;Se ele continuar solto, não para mais. Ele é igual ao pedreiro que matou os meninos de Luziânia, com certeza vai acabar assim.;
As vítimas de Júnior tinham apenas um ponto em comum: todas eram mulheres mais velhas. Uma das escolhidas pelo adolescente foi uma idosa que fazia compras em um pequeno mercado da cidade. A senhora, de mais de 60 anos, desmaiou ao ser atacada pelo garoto, e preferiu não prestar queixa na polícia. A dona do estabelecimento onde ocorreu o delito, Joana*, também sofreu os abusos do adolescente, em plena tarde de sábado, no último 16 de outubro. A mulher conta que Júnior parecia sentir prazer ao aterrorizar as vítimas, e que ele impunha autoridade por meio de ameaças. ;Eu não o vejo como criança. Ele fala grosso, intimida, tem atitude e gesto de homem;, testemunhou Joana. Segundo os depoimentos das mulheres que foram violentadas por Júnior, algumas vezes o menino ainda se colocava no papel de esposo das vítimas.
A comerciante violentada pelo adolescente ainda frisou o comportamento incomum do menino, que parecia não ter medo das consequências de seus atos. Para Joana, infelizmente, a segurança de Júnior é justificada. Embora a comerciante não tenha sido a primeira nem a última vítima a denunciar os atos libidinosos do garoto, ele nunca permaneceu detido por mais que algumas horas. No dia anterior, Júnior havia estuprado a funcionária de uma papelaria, e foram diversas as denúncias de ameaça e roubo registradas contra ele, mas o menino jamais foi internado em uma instituição para menores. ;Psicopatia, problemas mentais ou maldade: seja qual for a qualificação, esse menino não pode ficar solto. Nunca compreendi direitos humanos que protegem bandido;, criticou a comerciante.
Psicopata
Quando a família de Júnior chegou à SQ 11, há alguns meses, os boatos começaram a circular entre os vizinhos. Alguns comentavam sobre estupros cometidos por ele, e outros ainda afirmavam que o irmão mais velho dele havia sido preso por matar um homem a pedradas. O comportamento do adolescente, segundo pessoas que conviviam próximo a ele, era o de um menino normal de sua idade, mas não eram raros os momentos em que Júnior assustava as pessoas com suas atitudes. ;Quando pediram para que não jogássemos mais bola com ele, ele ficou parado, balançando a cabeça. Falava ;deixa eu jogar, eu roubo para vocês;;, conta um dos meninos da vizinhança. Pessoas que moram próximo à ultima vítima de Júnior ainda relatam ter ouvido passos vindos do teto de suas casas, como se o garoto estivesse andando nos telhados para estudar a rotina dos vizinhos. A mulher de 34 anos foi abordada quando o marido estava na faculdade. ;Ele planejava para dar o bote no momento certo. A mãe disse que ele já fez tratamento mental, mas ele é um psicopata;, revolta-se uma vizinha.
Nos depoimentos prestados à polícia, o adolescente sempre negou as acusações contra ele. A tática, segundo os vizinhos, é a mesma todas as vezes em que ele comete um delito: o menino e a mãe negam envolvimento com as vítimas, e o garoto permanece em liberdade. Júnior não frequenta a escola e não é capaz nem mesmo de escrever corretamente o próprio nome. Os moradores da rua onde ele vive ainda contam que brigas familiares eram frequentes e que, em uma delas, o menino chegou a tentar estrangular a própria mãe no meio da rua.
* Nomes fictícios em respeito ao Estatuto da Criança e do Adolescente
Depoimento
;Ele veio aqui na minha loja às 13h30 de sábado, nem baixou o portão e mandou uma cliente deitar no chão. Eu falei ;meu filho, em nome de Jesus, não faz isso;. Ofereci a ele R$ 200 que eu tinha para pagar um boleto. Ela desmaiou, então ele veio para cima de mim, dizendo que só saía satisfeito. Eu fiz tudo o que a lei manda, e ele não foi preso. Ainda recebi a visita da mãe depois. Há uns 15 dias ela esteve aqui acompanhada de um senhor, para me comover, me impressionar com a dor e o sofrimento dela. Disse que teve dois filhos assassinados, que a polícia tinha marcação com ela. Como mãe, compreendo, mas não vou retirar nada. Ela é uma mulher humilde, que tapa o sol com a peneira ao vir dizer que o filho não tem condições de ter feito isso. Eu só fiz o Boletim de Ocorrência uma semana depois do que aconteceu. Agora mudou tudo, nada que eu disser é comparado ao que a minha família é hoje. Eu e minha filha estamos na fila de espera para conseguir um psicólogo. Como fui estuprada, eu estou tomando um coquetel de remédios. Só de injeções tive de tomar 28 doses de uma só vez, e até o meu cabelo está caindo. Minha filha tem muito medo, não vai mais para a escola, fica embaixo da cama. Agora só atendo clientes assim, com as grades fechadas, recebo só quem eu conheço e confio, por uma janelinha. Assim ninguém está comprando nada. Eu só queria trabalhar, sempre trabalhei para manter minha família e hoje não tenho esse direito. Estou presa sem ter feito nada.;
Joana*, vítima do adolescente estuprador
O que diz a lei
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê as seguintes medidas para o adolescente que praticar um ato infracional: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, regime de semiliberdade e internação em estabelecimento educacional. A última, listada no art. 121 do ECA, prevê período máximo de internação de três anos quando tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência à vítima. A internação também pode ser recomendada quando houver reiteração no cometimento de outras infrações graves.