Mais uma versão para o caso Villela. Nada de crime sob encomenda, planejado nos mínimos detalhes. Muito menos bandidos profissionais. Como num típico caso de ladrões amadores, uma dupla entrou no apartamento 601/602 do Bloco C da 113 Sul, na noite de 28 de agosto, e acabou matando três pessoas por desespero. Os latrocidas não usaram luvas nem limparam o cenário para dificultar o trabalho da polícia. Deixaram o prédio a pé. Depois, pegaram dois ônibus urbanos e fugiram de Brasília em um coletivo interestadual.
A terceira versão para o triplo assassinato ; que ocorreu há mais de um ano, provocou crises na Polícia Civil do Distrito Federal e já teve 10 outras pessoas presas e liberadas por falta de provas ; foi contada por Leonardo Campos Alves, 44 anos, ex-porteiro do Bloco C. Assassino confesso, ele contou sua história no prédio da direção da polícia brasiliense, na tarde de ontem, após chegar de Montes Claros (MG), onde estava preso desde a última segunda-feira. Mais tarde, deu entrevista exclusiva ao Correio (leia trechos acima), na 8; Delegacia de Polícia (SIA), responsável por sua prisão.
Nas duas entrevistas, Leonardo deixou várias dúvidas. Ele se contradisse e deu muitas informações incoerentes com as divulgadas pela polícia ao longo desses 15 meses de mistério. Levantou dúvidas até de delegados presentes na coletiva. Entre eles, o diretor-geral da Polícia Civil, Pedro Cardoso, que não deu o caso por encerrado. ;O crime não está completamente esclarecido. Demos um largo passo, mas temos que confrontar todas as provas testemunhais e materiais;, afirmou.
Leonardo Alves garantiu que somente ele e o sobrinho Paulo Cardoso Santana, 23 anos, entraram no apartamento e mataram com 73 facadas o ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) José Guilherme Villela, 73, a mulher dele, Maria Carvalho Mendes Villela, 69, e a empregada deles Francisca Nascimento da Silva, 58. A razão do crime é um dos pontos não esclarecidos pelo autor confesso. Primeiro, ele afirmou que a vontade de assassinar José Guilherme surgiu após ter sido ;humilhado; pelo ex-ministro ao pedir emprego, meses depois da sua demissão do Bloco C. Leonardo trabalhou no prédio por 15 anos e perdeu o emprego há cerca de dois a pedido dos moradores, devido a mau comportamento. ;Ele (José Guilherme) disse que se fosse arrumar emprego pra tanta pessoa teria que montar uma agência. Fiquei com vergonha de ser humilhado;, narrou Leonardo. Em seguida, o homem falou na intenção de apenas roubar o casal porque precisava de dinheiro.
Ameaça
Leonardo contou ter desembarcado em Brasília, vindo de Montalvânia, no dia do crime. Ele e o comparsa entraram no Bloco C após dar um sinal amigável para o porteiro do dia, que abriu a portaria sem perguntar onde ambos iriam. Já a dupla teve acesso ao apartamento 601/602 pela porta da área de serviço, que estava aberta. Não usaram luvas. ;Não tocamos em nada. Eu ameaçava a dona Maria (Villela) com a faca e ela abria tudo, depois colocava as joias e o dinheiro numa sacola;, contou o ex-zelador. As duas facas usadas pela dupla eram da casa das vítimas e teriam sido deixadas no local.
Após receber os bens ; além das peças preciosas, US$ 27 mil e R$ 500 em espécie ;, os dois mataram o casal. Leonardo afirmou que a empregada Francisca chegou quando ele e o sobrinho deixavam o apartamento. ;A empregada apareceu e, por isso, matamos. Ela morreu porque chegou na hora errada;, ressaltou. A dupla saiu sem fechar a porta. ;Como eu vinha carregando a sacola, empurrei a porta com a ponta do dedo, descemos as escadas e corremos até o Eixo (Eixinho L). Depois, pegamos ônibus, fomos para a Rodoviária (do Plano Piloto) e de lá para a Rodoferroviária, onde compramos passagem para ir embora;. O ex-porteiro e o sobrinho tomaram um ônibus para Montalvânia na mesma noite.
Leonardo morava na cidade distante cerca de 640km de Brasília desde sua demissão do Bloco C. Lá, montou uma loja de bijuterias e um bar. Negócios incrementados com as vendas das peças de ouro, diamante e brilhante levadas dos Villela. Dois ourives de Montes Claros confessaram, em depoimento na terça-feira, ter comprado os itens de Leonardo. Paulo Cardoso Santana está preso na penitenciária de Montalvânia por causa de outro latrocínio, cometido em agosto último. A transferência dele para o DF depende de longo trâmite judicial.
As prisões do ex-porteiro e do comparsa trouxeram à tona uma crise interna da Polícia Civil do DF. Isso porque foram feitas pela 8; DP sem o conhecimento da presidente do inquérito do crime da 113 Sul, delegada Mabel de Faria (da Coordenação de Investigação de Crimes Contra a Vida). Para diminuir o mal-estar, o diretor da corporação, Pedro Cardoso, afirmou durante a coletiva que, por enquanto, o caso continua com a Corvida.