As denúncias de irregularidade envolvendo o Shopping Popular de Brasília levaram o Governo do Distrito Federal a intervir no local. As duas associações que reúnem os feirantes perderam espaço para Jorge de Oliveira Braga, que foi nomeado administrador do local. Ao longo do último mês, o subtenente da Polícia Militar confirmou algumas suspeitas de irregularidades do centro comercial. E, a partir de hoje, iniciará um pente fino na documentação. Além disso, pretende ser rigoroso na concessão de uso dos 1.784 boxes e na fiscalização do natureza dos serviços oferecidos nos espaços. A nomeação de Braga foi publicada hoje no Diário Oficial do Distrito Federal pela Coordenadoria das Cidades do DF e não há previsão da duração que ele permanecerá à frente da administração. No último domingo, o Correio publicou uma reportagem mostrando o desvirtuamento do projeto original do Shopping Popular (veja Entenda o caso).
Ao assumir a administração da feira, há aproximadamente uma semana, Braga montou um posto policial no local, tirou o poder das associações, informou a mudança aos feirantes e requisitou documentos para comprovar a situação dos concessionários do espaço. ;Eu não sabia que a situação era tão precária. Aqui, ninguém sabe quem é quem;, explica. O interventor definiu o horário de funcionamento do shopping das 8h às 19h, de terça-feira a domingo, e proibiu a continuidade de obras nos boxes. Segundo o Diário Oficial do DF de ontem, qualquer intenção de alterar os espaços deverá ser comunicada ao novo administrador, que recorrerá à Coordenadoria das Cidades e à Secretaria de Governo do Distrito Federal para avaliar os pedidos. A partir de hoje, o policial fará o mapeamento dos feirantes. ;Queremos saber qual box foi vendido, quem comprou, porque permanece fechado e qual a utilidade de cada um. Alguns são usados apenas como depósito;, afirma.
A sala onde passou a funcionar a administração do Shopping Popular está tomada por produtos embalados e alguns espalhados pelo espaço. Segundo Braga, o material, de propriedade dos feirantes, foi recolhido por membros da Associação de Vendedores Ambulantes do Shopping Popular (Asshop) ao longo dos últimos anos. ;Levamos o caso à delegacia para investigar de quem são esses produtos e por que foram recolhidos. Soubemos que a associação entrou em algumas bancas para pegar peças. Queremos devolver tudo aos feirantes;, informa Braga. A 3; Delegacia de Polícia (Cruzeiro) investiga pelo menos 15 ocorrências abertas por feirantes contra a associação pelo mesmo motivo. ;Queremos moralizar a feira e fazer com que ela funcione;, garante.
Procurado pelo Correio, o presidente da associação, Caio Donato, limitou-se a falar sobre a apreensão do material. Segundo ele, 41 feirantes tiveram a inscrição no Shopping Popular cancelada pelo Governo do Distrito Federal em maio de 2009. Ainda assim, contrariaram a determinação e permaneceram no local ;Recolhemos todas as mercadorias dessas pessoas e guardamos com o número dos boxes e o nome dos proprietários, tudo fotografado na presença de vários feirantes. Fizemos tudo com base no Diário Oficial;, justifica. A feirante Margarida Carvalho, 53 anos, é proprietária de uma banca no Shopping Popular há dois anos e seis meses. Ela aprovou a mudança de gestão na feira. ;Precisamos de alguém com pulso firme para organizar tudo. Não queremos mais mentiras aqui. Queremos união.;
O coordenador das Cidades, Sérgio Roberto Cardoso, explicou que o novo administrador foi escolhido após surgirem as primeiras denúncias de irregularidades. ;Conversamos com o titular da Divisão Especial de Repressão aos Crimes contra a Administração Pública para que nos ajudasse nessa questão. Paralelo a isso, conversamos com o secretário de Governo e pedimos para ele nomear o administrador;, explica. Segundo ele, as associações costumam cuidar das feiras ; e pagar contas de água, luz, limpeza e segurança ;, mas quando a administração deixa de funcionar, o governo entra em ação. O caso está sendo avaliado pelo promotor da Defesa do Patrimômio Público Roberto Carlos Silva. Segundo a assessoria de imprensa do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, ele só se pronunciará depois de analisar todos os documentos relativos ao assunto.
SOLUÇÃO PARA AMBULANTES
O complexo de 20 mil metros quadrados foi loteado em 1.784 lojas e tem um estacionamento capaz de abrigar 1.375 carros. A estrutura foi erguida para abrigar vendedores ambulantes que se amontoavam nas áreas centrais de Brasília. A ideia era manter a fonte de renda dos trabalhadores informais. O Shopping Popular, no entanto, nunca prosperou. Muitos boxes permanecem fechados até hoje, alguns estão pichados e, com a saída da Rodoferroviária das redondezas, o movimento caiu ainda mais.
Entenda o caso
Interesse público X interesse privado
Dois anos e meio depois de inaugurado, o centro comercial tornou-se uma vitrine de irregularidades que desafiam o poder público. O objetivo social da construção do Shopping Popular ficou em segundo plano e o local se transformou em um negócio particular. Boxes cedidos pelo governo passaram a ser negociados entre ambulantes que vendem ou compram unidades por intermédio de uma associação criada para defender os interesses da categoria. Por meio de um termo de conduta redigido pela Corregedoria-Geral do DF e assinado no ato do sorteio das bancas pelo governo, os feirantes assumiram o compromisso de não alugar, emprestar, doar ou vender as lojas. O GDF pode tomar a área se o empreendimento estiver sendo usado para outros fins. Alguns antigos ambulantes não conseguiram manter as bancas com a venda de produtos de baixo valor e acabaram vendendo os boxes.
Perfil
Educado e direto Jorge de Oliveira Braga anda pelas dependências do Shopping Popular com um distintivo da Polícia Militar pendurado na calça jeans. O interventor é subtenente da PM e integra a corporação há 29 anos. Antes de ser escalado para administrar a feira, passou pela área de fiscalização da Subsecretaria de Defesa do Solo e da Água (Sudesa) e pela Secretaria de Ordem Pública (Seops). Ao longo da carreira, não lidou diretamente com os problemas dos vendedores ambulantes. Ao ser cotado para a vaga, Braga andou pela feira sem se identificar, buscando conferir de perto os boatos de irregularidades. Ele preza o diálogo com os feirantes e associações e garante transparência no trabalho enquanto estiver à frente do Shopping Popular. Educado e direto, foi bem recebido por todos na nova empreitada. ;Estou preparado para as dificuldades, sou policial à 29 anos;, disse.