Jornal Correio Braziliense

Cidades

Associação de Vendedores do Shopping Popular é alvo de denúncias

A Associação de Vendedores Ambulantes do Shopping Popular (Asshop) é frequentemente citada nas histórias de irregularidades narradas pelos feirantes contemplados com loja no pavilhão ao lado da Rodoferroviária. Vendedores insatisfeitos com a atuação dos dirigentes da entidade procuraram o governo, a Câmara Legislativa, a Polícia Civil, o Ministério Público e a Justiça para se queixar da conduta de lideranças da categoria.

Na última quarta-feira, o ambulante Osvaldo Silvano da Silva prestou depoimento na 3; Delegacia de Polícia, no Cruzeiro. Ele relatou caso de arrombamento ao box em frente à banca onde vende produtos medicinais, como ervas, chás, pastas e pomadas. ;Eu vi o que aconteceu e contei para a polícia;, disse Osvaldo. O vendedor acusa o presidente da Associação de Ambulantes de ter cedido na marra a banca de sua vizinha para outra pessoa.

A Asshop é atualmente dirigida por Caio Alves Donato, que está no cargo há anos, antes mesmo da transferência dos camelôs para perto da Rodoferroviária. Desde 2009, com pouco mais de um ano de funcionamento da feira permanente, Donato virou alvo de denúncias de colegas à polícia e a outros órgãos da administração pública.

Entre as acusações, há uma com data de 22 de julho de 2009. Na denúncia encaminhada à Comissão dos Direitos Humanos, Cidadania e Ética da Câmara Legislativa, o feirante Luiz Lemos Viana relata casos de supostas irregularidades, como distribuição de lotes e favorecimento a pessoas não cadastradas. Ele aponta o presidente da Asshop como autor das incorreções.

O depoimento prestado por Viana coincide com a versão de outros feirantes do Shopping Popular. ;Quem negocia tudo na feira é essa direção que está aí. Eles dizem quanto é e definem quem pode ter um espaço no pavilhão;, diz o ambulante Valdivino dos Santos Silva, que tem uma banca de CDs e DVDs no shopping.

Manoel Mendes de Souza alerta que o governo separou 48 boxes para serem usados como lanchonetes. Desses, apenas 18 foram sorteados. Mas todas as áreas estão com estrutura montada. ;Como é que pode isso, quem foi que disse que a associação tem o direito de distribuir como quiser os espaços?;, questiona Mendes. O Correio teve acesso à cópia de um cheque da Associação de Ambulantes no valor de R$ 4 mil nominal a um ex-feirante e que seria referente à compra de uma das bancas do pavilhão. A quantia corresponde, em média, ao custo da obra que os ambulantes têm para fazer o acabamento do espaço com ferragens e colocar a banca em funcionamento.

Alvo das críticas e denúncias dos colegas, o presidente da Asshop, Caio Donato tem um pé na direção da associação de feirantes e o outro na política. Ele é presidente do PRTB, partido que elegeu Liliane Roriz, filha do ex-governador Joaquim Roriz, ao cargo de deputada distrital. Desde a eleição de Agnelo Queiroz (PT) no último domingo, Caio ; um entusiasta da vitória de Weslian ; não tem ido à feira. Os colegas acham que ele viajou.

Um grupo de ambulantes questiona na Coordenadoria das Cidades, órgão do GDF responsável por lidar com as feiras permanentes, a reeleição da atual diretoria do Shopping Popular. ;Ninguém foi chamado a participar, como é possível alguém ser reeleito com mandato até 2013 se nem eleição houve;, indaga Edilene Fernandes.

Investigações
Os depoimentos de feirantes chamaram a atenção da Polícia Civil, que abriu uma investigação para apurar as possíveis irregularidades cometidas no Shopping Popular. ;Há relatos dando conta de uma série de fraudes que estão sendo checadas pela Decap (Divisão Especial de Repressão aos Crimes contra a Administração Pública);, disse o diretor da Polícia Civil, Pedro Cardoso.

Também está em andamento na Promotoria de Defesa do Patrimônio Público (Prodep) do Ministério Público uma investigação sobre o funcionamento do Shopping Popular. O promotor responsável pela apuração, Roberto Carlos Silva, alerta que a venda de boxes da feira cedidos pelo governo é contra lei e pode gerar consequências até penais para os autores das negociações. ;Há uma série de punições para quem descumpre essa regra, que podem ir da anulação do contrato de cessão, resultar numa ação de improbidade para o caso de quem está no exercício do cargo público e até mesmo provocar uma ação penal;, alerta. E acrescenta: ;É absolutamente impossível comprar ou vender o que é cedido pelo governo, situação em que o bem tem caráter personalíssimo, quando não há hipótese de nenhum tipo de transferência, nem mesmo para um herdeiro como o próprio filho;.

Representante do GDF responsável pelo Shopping Popular, o coordenador de cidades do governo, Sérgio Roberto Cardoso da Cruz, disse que determinou a uma equipe que faça um levantamento no pavilhão para constatar se há irregularidades. ;Essas reclamações em feiras são muito comuns, toda hora alguém se queixa de alguma coisa;, afirmou Cardoso, que está no cargo desde março deste ano. Questionado especificamente sobre desvios aparentes, como a construção de lojas com a integração de vários boxes, disse: ;Sobre isso aí eu não posso falar, tenho que ver primeiro;. O Correio tentou contato com o presidente da Associação de Feirantes, mas não conseguiu localizar Caio Donato.

Memória


Briga que durou anos


A construção do Shopping Popular foi resultado de uma briga de anos entre camelôs e o governo, que desautorizava a permanência dos ambulantes no Setor Comercial Sul, imediações da Rodoviária do Plano Piloto e próximo ao Gran Circo Lar, mas não conseguia encontrar solução pacífica para a retirada das bancas.

O impasse incentivou milhares de vendedores de telefones celulares, relógios, roupas, quadros a até remédios a fazer das calçadas de endereços movimentados na cidade seus locais de trabalho. Em 2000, a prefeitura do Setor Comercial Sul chegou a entrar com uma ação no Ministério Público do Distrito Federal pedindo providências para ajudar na transferência do comércio informal.

O sinal de uma mudança na situação dos ambulantes foi dado ainda em 2006, durante o período de transição da administração de Joaquim Roriz para a gestão de José Roberto Arruda. Em 21 de novembro de 2006, o GDF conseguiu negociar a posse do terreno ao lado da Rodoferroviária com a União, proprietária do lote. As obras do pavilhão, no entanto, só ficariam prontas mais de um ano após a doação da área.

O Shopping Popular foi entregue em 15 de janeiro de 2008 e inaugurado em 21 de abril daquele ano. Mas nunca alcançou as expectativas de funcionamento. Sem movimento e com menos da metade de sua capacidade em uso, o lugar não atrai compradores. Das 1.784 bancas, 580 estão ocupadas. Muitos feirantes sorteados desde 2008 para ter um box no Shopping Popular mantêm as lojas fechadas na expectativa de valorização.
(LT)