O Ministério Público de Goiás (MPGO) quer a prisão preventiva do ex-comandante da Polícia Militar em Formosa (GO), major Ricardo Rocha Batista. Ele é apontado como líder de um grupo de extermínio com histórico de matanças no município de 90 mil habitantes distante 79km de Brasília e ao menos outras três cidades goianas onde chefiou tropa. O oficial concorria a uma vaga na assembleia legislativa estadual, mas teve o registro negado pelo Tribunal Regional Eleitoral há dois dias.
Promotores goianos pediram ontem a prisão do major. A decisão cabe ao juiz da 4; Vara Criminal de Rio Verde, onde ele responde processo pela morte de Alessandro Ferreira Rodrigues. O crime ocorreu em 7 de setembro de 2006. A vítima seria traficante de drogas na cidade e, à época da morte, Ricardo Rocha comandava o batalhão local.
O pedido do MPGO ressalta que o policial militar responde a cinco ações penais, todas por homicídio, sendo duas em Rio Verde e quatro em Goiânia. Em um dos processos na capital, Ricardo Rocha aguarda o julgamento. A denúncia mais recente foi protocolada em agosto e o responsabiliza, com outros sete PMs, pela morte, em Goiânia, de um adolescente de 16 anos. Crime ocorrido em 2001, quando ele comandava as Rondas Ostensivas Táticas Metropolitanas (Rotam).
Ao justificar a necessidade de prisão de Ricardo Rocha, o MPGO salienta que o major "representa risco à ordem pública, com sua conduta delituosa reiterada". "As provas colhidas já na esfera judicial comprovam que o requerido está envolvido em vários homicídios com características de execução. Está patente que o representado, solto, continuará a sobrepujar o combate à criminalidade, impondo a violência à sociedade para satisfação de sua sanha de justiça sanguinária", reforça o requerimento.
O pedido de prisão também observa que testemunhas de crimes atribuídos ao major tiveram de ser acolhidas em programas de proteção, em razão do temor de que, sem a proteção estatal, se tornassem também vítimas do oficial. Apesar disso, elas confirmaram em seus depoimentos na Justiça o envolvimento de Ricardo Rocha com os crimes.
Afastamento
A pedido do MPGO, o comando da PM goiana afastou o major do comando do 16; Batalhão da Polícia Militar, em Formosa, em março deste ano. Ele vinha sndo investigado por suspeita de envolvimento em um homicídio e no desaparecimento de pessoas, ocorridos em Alvorada do Norte, com indícios de atuação de grupo de extermínio. Além do oficial, foram afastados das funções seis policiais militares suspeitos de participação nas execuções.
Documento da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Goiás aponta que desaparecimentos de suspeitos de roubo de gado na região de Alvorada do Norte tenham conexão com a ação de grupo de extermínio integrado pelo major e outros dois PMs. Entre os casos citados estão os de Pedro Nunes de Brito e do adolescente identificado como Cleiton, vistos pela última vez quando eram colocados em um carro do Grupo de Patrulha Tática (GPT), na tarde de 26 de fevereiro.
Desde 17 de maio de 2009, o Correio publica reportagens sobre mortes com sinais de execução sumária, ocorridas em Formosa. Sob comando de Ricardo Rocha, PMs do Batalhão da cidade são investigados por matar 15 pessoas em menos de dois anos. Para promotores de Justiça, as ações têm características de grupo de extermínio.
Apoio de secretário
Ricardo Rocha foi denunciado pelo MPGO por participação em uma chacina com cinco mortes e por crime de pistolagem. Tudo quando ele era o subcomandante da PM em Rio Verde, no Sudoeste goiano. Após as mortes em série, Rocha foi transferido para Goiânia, onde comandou a Rotam entre 2003 e 2005. Época em que a PM mais matou na capital.
De 6 de março de 2003 a 15 de maio de 2005, foram registrados 117 homicídios em Goiânia cuja autoria é atribuída a PMs, a maioria da Rotam. Das 117 vítimas, 48,7% (57 pessoas) não tinham ficha criminal. Outras 60 (51,3%) eram foragidas da Justiça ou acusadas de algum crime. Em meio a investigação do MPGO sobre esses casos, o major voltou a Rio de Verde. Em seguida, foi para Formosa, terra natal e base eleitoral do então secretário de Segurança Pública de Goiás, Ernesto Roller, deputado estadual pelo PP e candidato a vice-governador na chapa de Vanderlan (PP).
Foi o próprio Roller quem nomeou Ricardo Rocha para assumir o 16; Batalhão. Em solenidades e entrevistas à imprensa do estado, Roller não economizou elogios ao major. Declarou que ele diminuiu a violência, mas nunca apresentou as estatísticas. Fazendeiros de Formosa também defendiam Rocha. Chegaram a fazer festa para ele após série de reportagens do Correio sobre a matança na região. Sobre os recentes afastamentos e prisões dos PMs que tanto elogiou, Roller não fala. Rocha ainda recebeu homenagem da PM, em Goiânia, na despedida do cargo que deixou para disputar a eleição.
Candidatura impugnada
Ricardo Rocha chegou a requerer o registro de sua candidatura a deputado estadual nas eleições deste ano, mas teve o pedido negado pela Justiça Eleitoral por irregularidade na sua inscrição eleitoral. Por ter se ausentado de três eleições, o major teve seu título de eleitor cancelado e só conseguiu regularizá-lo em abril deste ano, o que é vedado pela lei para registro de candidaturas.
O PM recorreu da decisão, mas ela foi mantida pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em decisão publicada na sessão realizada na quarta-feira (8/9). O major não foi encontrado para entrevista.