Conhecida por seus monumentos grandiosos e pela infinidade de estreitos canais e pontes, a cidade italiana de Veneza (1)ganhou na semana passada um toque de modernismo. A 12; edição da Bienal de Arquitetura da cidade, evento internacional mais importante do segmento, homenageia o cinquentenário de Brasília e reverencia a obra do arquiteto Oscar Niemeyer. O pavilhão brasileiro mostra ainda como a criação da capital influenciou o trabalho de arquitetos do país nos últimos 50 anos. A Bienal de Veneza ficará aberta ao público até 21 de novembro e, até lá, os visitantes do mundo inteiro poderão ver maquetes e fotos da cidade, além de outros trabalhos representativos de Oscar Niemeyer.
O tema da exposição brasileira é 50 anos depois de Brasília. A Fundação Bienal de São Paulo, responsável por representar o país em Veneza, entregou a coordenação do evento ao arquiteto Ricardo Ohtake, do Instituto Tomie Ohtake. Com base no tema pré-definido, o curador escolheu as obras mais marcantes de Niemeyer e levou também à Itália duas grandes maquetes de Brasília. Em uma sala vizinha, sete arquitetos de cinco escritórios, selecionados para a mostra, expõem seus trabalhos ; todos influenciados de alguma forma pela experiência de criação da capital.
Brasília e sua arquitetura moderna são relativamente bem conhecidas pelos especialistas da área. Ainda assim, entre os arquitetos estrangeiros, é grande o interesse em conhecer mais sobre o projeto do urbanista Lucio Costa e sobre a inovação dos monumentos traçados por Niemeyer. Um dos destaques principais do pavilhão brasileiro é uma maquete original da Praça dos Três Poderes, que mostra com detalhes o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal e o Palácio do Planalto.
Democracia
Para o curador Ricardo Ohtake, a praça mais conhecida de Brasília é uma das mais interessantes do mundo. ;As grandes praças da humanidade são fechadas, já a dos Três Poderes é completamente aberta, o que mostra como a arquitetura pode ser democrática. Isso também representa de certa forma o ideal de que os poderes ficam abertos à sociedade. É algo que tem atraído muitos interessados ao pavilhão brasileiro;, explica o curador.
Para Ohtake, chama a atenção também a integridade do projeto urbanístico da capital, meio século depois de sua criação. ;Nós sabemos que Brasília sofre com uma série de problemas, como obras que foram feitas sem seguir o projeto original. Mas a cidade manteve a integridade, tanto na parte urbanística quanto na arquitetônica;, afirma o curador da exposição brasileira na Bienal de Arquitetura de Veneza. Além da maquete da Praça dos Três Poderes, está exposta também uma réplica do Eixo Monumental, com os ministérios, a Catedral e o Complexo Cultural da República em destaque.
O portfólio de trabalhos de Oscar Niemeyer expostos na Bienal de Veneza não se restringe aos monumentos projetados para Brasília. O curador da mostra selecionou obras do arquiteto construídas no Brasil e em outros países, como o Teatro e Casa de Cultura de Le Havre, na França, a sede da editora Mondadori, em Milão, e o edifício da Bolsa de Trabalho, em Paris.
Entre os trabalhos projetados para o Brasil, há obras realizadas antes de Brasília, como o Complexo da Pampulha, em Belo Horizonte, e o Edifício Copan, em São Paulo, até trabalhos recém-inaugurados, como o novo Centro Administrativo do governo de Minas Gerais, em Belo Horizonte. ;Brasília representa a consolidação da arquitetura moderna brasileira, e o trabalho de Niemeyer tem relação direta com o que aconteceu na arquitetura do país nos últimos 50 anos;, afirma o curador, Ricardo Ohtake.
Nova geração
A experiência de criar a primeira cidade modernista do mundo influenciou direta ou indiretamente quase todos os arquitetos brasileiros. Os profissionais selecionados pela curadoria têm idade entre 30 e 50 anos e representam o ambiente criado no país a partir da inauguração da nova capital. Mário Biselli, Artur Katchborian, Ângelo Bucci, Daniel Corsi, Dani Hirano, Marcos Boldarini e Gustavo Penna trabalham em escritórios paulistanos e foram selecionados para representar a arquitetura brasileira do pós-Brasília.
Um dos escolhidos para representar o Brasil em Veneza, o arquiteto Marcos Boldarini afirma que a obra de Oscar Niemeyer é referência obrigatória para todos os profissionais. ;O Niemeyer influenciou todos os arquitetos brasileiros de alguma forma. O trabalho dele é referência para profissionais do mundo inteiro e isso ficou claro diante do grande interesse que o pavilhão brasileiro despertou na Bienal;, conta Marcos, que participou da abertura da mostra de Veneza. Boldarini se destaca por sua atuação na área de projetos de habitação para áreas de baixa renda, buscando soluções arquitetônicas inovadoras.
Mário Biselli, outro representante do país no evento italiano, lembra que a experiência da construção de Brasília é hoje metodologia básica no ensino da arquitetura no Brasil. ;Os conceitos fundamentais dessa arquitetura vão se revelar no nosso trabalho. Brasília foi a única cidade moderna construída a partir do zero. E cada arquiteto que nasceu a partir da inauguração da cidade teve uma visão diferente desse fato extraordinário;, destaca Biselli.
1 - Veneza
Além de chamarem atenção pela arquitetura, Brasília e Veneza têm outro ponto em comum. As duas cidades fazem parte do Patrimônio Mundial da Unesco. E a inscrição na lista da organização aconteceu no mesmo ano em ambos os casos: 1987.