Jornal Correio Braziliense

Cidades

Dica é manter o olho aberto quando há um pequeno à solta

Preparar o ambiente, conversar com os filhos e dar bom exemplo. Dicas válidas não só para o Dia da Prevenção de Acidentes com Crianças, celebrado hoje, mas sempre, devido ao grande número de mortes dentro de casa ou nas imediações por ocorrências evitáveis

O desejo de chupar balinhas foi tanto que Miguel não mediu esforços. Pegou a cadeirinha do seu quarto, posicionou-a perto do guarda-roupa dos pais e subiu para alcançar a bolsa da mãe. Só que, em vez de uma guloseima, o menino tomou anfepramona, moderador de apetite cheio de contraindicações. A aventura terminou no pronto-socorro. Para o pequeno cientista Augusto, a ideia fascinante de fabricar tinta a partir da mistura de álcool, pedra e fósforo resultou em uma queimadura de terceiro grau na mão direita. Manuela não sossega dentro nem fora de casa. Recentemente, ela se jogou em uma piscina numa pizzaria da cidade. Foi imediatamente salva de um incidente mais sério pelos pais. Alguns segundos de distração também bastaram para Milenna cair do sexto andar no Sudoeste, sábado passado. Felizmente, a garota de 2 anos passa bem (Veja na página ao lado).

Com a curiosidade a mil e habilidades que surgem a todo momento enquanto se desenvolvem, meninos e meninas como Manuela, Augusto, Miguel e Milenna são a razão da comemoração de hoje: o Dia da Prevenção de Acidentes com Crianças. Instituída pela ONG Criança Segura, que trabalha o tema nacionalmente com parceiros da área da educação e da saúde, a data faz sentido devido ao alto número de vidas perdidas por conta de ocorrências evitáveis. Para se ter ideia, das 6.529 mortes por causas externas na faixa etária de zero a 14 anos em 2008, praticamente 30% se dão por razões acidentais. E muitas vezes dentro de casa ou nas imediações. Dados do Ministério da Saúde apontam que, só por afogamento, 1.332 crianças e pré-adolescentes morreram naquele ano (base mais atualizada da pasta) ; quase 4 por dia.

;É fundamental preparar o ambiente para as crianças, cuidando de escadas, tomadas, janelas. E também conversar. Os pais devem dizer por que é tão perigoso fazer determinadas coisas. Caso contrário, você acaba gerando uma curiosidade enorme. Aí, sim, a criança vai querer fazer;, diz Jaqueline Magalhães, coordenadora de Mobilização da Criança Segura. Aramis Lopes Neto, do Departamento Científico de Segurança da Criança e do Adolescente da Sociedade Brasileira de Pediatria, lembra que é também por meio do exemplo que os filhos aprendem. ;Se você sai puxando o garoto no meio dos carros, ignora a cor do sinal no semáforo, não adianta exigir que ele, quando sozinho, atravesse na faixa de pedestres;, afirma Lopes Neto.

Histórias
Incentivado pela irmã mais velha, Augusto quis produzir tinta. ;Ela me disse que se eu misturasse álcool, pedras e riscasse o fósforo, ia conseguir;, lembra o garoto de oito anos. No lugar de tinta, uma queimadura de terceiro grau na mão. ;Ele gritou durante três horas seguidas. Foi horrível, eu não sabia o que fazer;, conta Cássia Barros, 41 anos, mãe do garoto. Passados a dor, o susto e o trauma de Augusto, que por meses não quis nem chegar perto de álcool ou de fósforo, a lição ficou. ;Eu sei que não posso mexer com essas coisas;, diz o menino.

Cássia, que guarda o álcool na cozinha em local alto, nunca imaginou que Augusto usaria o produto deixado por operários que trabalhavam em seu quintal na ocasião. A advogada Gisele Barbosa Silva de Lima, 32 anos, também desconhecia a agilidade de Miguel para escalar guarda-roupas. ;Estava fazendo a janta e, vez por outra, vinha à sala ver se ele continuava brincando com os carrinhos. Até que eu cheguei e o vi com a minha bolsa aberta, comendo os comprimidos de anfepramona, um inibidor de apetite. Ele dizia que era balinha;, lembra a mãe.

As pernas chegaram a amolecer. Fazia tempo que Gisele não mexia naquela caixa de remédios. Por isso nem conseguia saber quantas ;balinhas; o garoto de dois anos e oito meses havia tomado. ;Por orientação do pediatra, voei para o hospital. O médico disse que, dependendo da dose, ele poderia ter até uma parada cardíaca. Mas tudo terminou bem;, diz a mãe de Miguel. A caixa de remédios da casa continua no alto do armário da cozinha. Mas agora a preocupação se voltou também para os objetos acomodados no guarda-roupa, mesmo nas prateleiras altas.

Tatiana Sócrates, mãe de Manuela, também já passou por muitos sustos. O pior deles ocorreu no início deste ano, quando a porta do box do banheiro onde fica a banheira da filha explodiu. ;Levei um susto com o barulho. Por reflexo, a babá se jogou em cima dela para protegê-la;, conta Tatiana. A menina de um ano e 10 meses teve um corte maior no tornozelo direito e outros menores no restante do pé. ;Poderia ter sido pior. Ela passou muito tempo chorando para não tomar banho lá. Daí resolvi não substituir a porta que quebrou. Quando ela tiver maior um pouco, a gente vai repor a peça;, conta a mãe, de 33 anos.