O setor atacadista sofreu mais uma derrota judicial, na tarde de quinta (12/8). Por seis votos a quatro, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) entenderam que o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) tem legitimidade para questionar, por meio de ação civil pública, o extinto Termo de Acordo de Regime Especial (Tare), substituído posteriormente pelo Regime Especial de Apuração do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o REA ; que simplifica a apuração do imposto e reduz consideravelmente a carga tributária. O mérito do caso será julgado pelos desembargadores do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT). Caso a primeira instância aprove a proposta do MPDFT de acabar com os benefícios fiscais na capital federal, as empresas serão obrigadas a devolver os valores do ICMS não pagos até agora.
Em junho, o TJDFT acolheu, em caráter liminar, uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) impetrada pelo MP para acabar com o REA, que está em vigor desde 2008. O órgão alegou que a renúncia fiscal é indevida e inconstitucional. Mas o tribunal não chegou a analisar o mérito por achar que o órgão fiscalizador não tem legitimidade para propor este tipo de ação. E determinou a extinção dos processos que tratam do assunto. A maioria do plenário acolheu a tese de que o regime especial funciona como incentivo fiscal e, portanto, precisaria de aprovação do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) ; colegiado que congrega os secretários de Fazenda do Brasil ; para entrar em vigor. Mas isso não ocorreu.
Com o fim do REA, os empresários amaçaram deixar o DF para se fixar em outros estados brasileiros. O Sindicato do Comércio Atacadista no DF (Sindiatacadista-DF) calculou que cerca de 500 empresas migraram para outros estados do Brasil, nos últimos dois meses. Essa mudança teve reflexo direto no desemprego de aproximadamente 15 mil pessoas. Com a falta de incentivo e a menor concorrência no atacado, o preço final do produto também pode aumentar em até 20%. Medicamentos, cosméticos e materiais de construção são mercadorias que podem ter o preço elevado com a falta de concorrência do mercado.
No recurso que chegou ao Supremo Tribunal Federal, o MP defende que a concessão de benefícios deve ser ligada a medidas compensatórias para arrecadar tributos para o Estado. O ministro relator, Ricardo Lewandowski, reconheceu a legitimidade do MP e determinou o retorno dos autos para a primeira instância, onde será julgada a constitucionalidade da ação. Os ministros Joaquim Barbosa, Ayres Britto, Ellen Gracie, Marco Aurélio, Celso de Mello e o presidente, Cezar Peluso, seguiram o relator. Segundo Gracie, o artigo 129 da Constituição Federal concede ao MP legitimidade para proteger o patrimônio público.
O ministro Gilmar Mendes, que divergiu da decisão, alertou para os efeitos da anulação do REA. ;O benefício está promovendo aumento de arrecadação do ICMS e gerando empregos diretos e indiretos. E a razão desse resultado parece ser muito simples: o regime especial de apuração de ICMS, na qualidade de incentivo fiscal, constitui um chamativo para as empresas que desejam se instalar no DF, movimentando a economia local e trazendo benefícios em cadeia para toda a população. Se isto for verdadeiro, chega a ser irônica a ação do Ministério Público;, disse o ministro. Com a decisão de ontem do STF, outras 700 ações que tramitavam no tribunal pelo mesmo motivo, seguirão igual destino. O prejuízo das empresas brasileiras pode chegar a R$ 8 bilhões.
O presidente do Sindiatacadista, Fábio de Carvalho, disse ter sido pego de surpresa pela decisão. Mas amenizou: ;É danosa para o setor, mas não é uma grandiosidade ainda;. Ele espera agora a decisão do mérito no Tribunal de Justiça do Distrito Federal. ;É a única esperança para o setor atacadista não sair correndo de Brasília;, analisou.
Entenda o caso
Todas as unidades da Federação possuem regimes especiais de apuração de impostos voltados exclusivamente para o setor atacadista, que diminuem a carga tributária e ajudam a garantir a competitividade das empresas locais e a atraem investidores de fora. Por serem encaradas como incentivo fiscal, essas legislações precisariam de aprovação do Confaz, conforme determina a Constituição Federal. Mas, para acelerar o trâmite, essas leis costumam entrar em vigor antes disso.
No Distrito Federal, até 2008, existia o Tare, revogado antes mesmo de ser questionado na Justiça. Naquele mesmo ano, o governo substituiu o Tare pelo REA. No TJDFT, o relator da matéria foi o desembargador Romeu Gonzaga Neiva. Sem benefícios, empresários ameaçam deixar o DF e alertam para o risco de desemprego e queda na arrecadação. Atacadistas locais reclamam que o benefício é reconhecido em todo o Brasil, menos no DF. Eles defendem um bom senso entre o comércio e o MPDFT.