Jornal Correio Braziliense

Cidades

iPhone está ameaçado no Brasil

A falta de uma rede de assistência técnica no país poderá comprometer o lançamento dos modelos da Apple, vendidos pelas operadoras de telefonia. As exigências legais de garantia aos clientes não têm sido cumpridas

Às vésperas do lançamento do iPhone4 no mercado brasileiro, prevista para setembro, a comercialização de todos os modelos do aparelho no país pode ser proibida caso a Apple Brasil não regularize a oferta de assistência técnica aos consumidores para os celulares fora do prazo ou das condições de garantia. Embora tenha representante formal por aqui, o fabricante não comercializa o produto diretamente, mas sim por meio de acordo firmado com as empresas de telefonia celular, como a Oi, a Claro, a Vivo e a TIM. Durante a garantia, se o telefone apresenta algum defeito de fabricação, o cliente é direcionado para a operadora e, geralmente, não enfrenta dificuldade com a troca. Mas caso o problema tenha sido provocado pelo próprio usuário ou ocorra fora do período de cobertura de um ano, a responsabilidade em oferecer assistência técnica vira um grande jogo de empurra. Isso quando não se torna inviável devido aos altos custos cobrados pelas operadoras para realizar o reparo, o que significa indiretamente pagar por um novo aparelho.

;A certificação do iPphone, homologada pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), foi pedida pela Apple Computer Brasil Ltda., localizada em São Paulo. Ou seja, o representante do próprio fabricante aqui no país assumiu a responsabilidade pela comercialização do produto perante à Agência, inclusive com o compromisso de ofertar assistência técnica que é uma das condições para aprovação do certificado. Se em algum momento o representante legal desaparece, a Anatel tomará providências. A resposta que a Apple está dando aos consumidores não funciona. Perante à Agência há uma carta dizendo que ela é a responsável. Ela não pode dizer isso à Anatel, sob pena de suspensão e posterior cancelamento do certificado caso a falha não seja corrigida no prazo de até 180 dias após a notificação;, garante o gerente de Certificação da Anatel, Itamar Barreto Paes.

Sem autorizadas

O advogado Ely Maranhão Filho, 39 anos, há mais de um mês uma tenta solução para o defeito em seu iPhone, comprado há pouco mais de um ano na operadora Vivo e, portanto, fora do prazo de garantia. ;Atualmente, o aparelho só carrega quando desligado, o que me impede de receber chamadas durante o processo, e está com mau contato no botão home. Mesmo trocando o carregador e experimentando na saída USB de diversos computadores, o problema do carregamento persiste;, conta Ely que, disposto a pagar pelo reparo se necessário fosse, acessou o site da Apple para verifica a rede autorizada.

;Segundo o site da Apple, a assistência técnica do iPhone é realizada pela operadora de celular que o vendeu. Ao procurar a Vivo, tive a desagradável surpresa de saber que não existe assistência técnica autorizada para iPhones no Brasil. Fui informado que, se o aparelho estivesse na garantia, seria trocado por um novo sem ônus. Mas como o meu não estava, teria que pagar o preço de um novo. Tentei entrar em contato com a Apple por meio de seu site, mas em total descaso não houve nenhuma resposta. É um absurdo saber que um aparelho caríssimo como este, na prática, é descartável;, desabafa.

Lixo

Após várias reclamações, Ely alcançou algum resultado, mas não ficou satisfeito. ;A operadora pediu para que eu levasse o aparelho para avaliação. Caso eles entendessem que eu fui culpado, o valor seria de cerca de R$1,2 mil para trocar por um aparelho novo. Se constatassem que eu não tive culpa, sairia por R$ 520. Isso é inaceitável porque uma bateria nova de celular custa cerca de R$ 50. Ainda que fosse pagar R$ 100 de mão de obra, não seria esse valor indecente que me ofereceram. Ou seja, nem a Apple, nem as operadoras oferecem assistência técnica no Brasil, tratando-nos como autênticos cidadãos de segunda classe. O mínimo que deveria ser feito é informar o comprador que quando o aparelho apresentasse defeito fora da garantia seu destino seria o lixo;, indigna-se.

Após contato do Correio e às vésperas do fechamento desta matéria, a Vivo entrou em contato com o leitor duas vezes. Na primeira, segundo ele, foi ofertado um desconto e R$ 800 na aquisição de um novo modelo de iPhone. Mais tarde, ofereceram a substituição do produto sem ônus, que foi aceita. ;Agora, estou na dependência de encontrar a nota fiscal do produto para concluir a troca;, diz.

A Apple não respondeu ao Correio. No última informação prestada ao jornal sobre o assunto, há cerca de um ano, a empresa afirmou que ;o consumidor deve falar com a operadora. Há um acordo com a Apple para a substituição do aparelho por outro mediante preço a ser determinado de acordo com a extensão do dano verificado;. A prática de direcionar o cliente para a operadora também é um procedimento adotado pelo site da empresa. Em todos os questionamentos sobre rede de assistência técnica há uma única resposta recomendando que o usuário entre em contato com a operadoras, inclusive com os números das respectivas empresas de telefonia.

Exigências
Só podem ser comercializados no Brasil, os produtos para telecomunicações certificados e homologados. De acordo com a Resolução n; 242, da Anatel, que regulamenta o assunto, a certificação de aparelho nacional poderá ser pedida apenas pelo fabricante. Se o produto for importado, como é o caso do iPhone, um outro representante poderá solicitar a autorização, desde que comprove estar regularmente estabelecido segundo as leis brasileiras, com endereço no Brasil, de forma a se responsabilizar pela qualidade, fornecimento e assistência técnica relativa ao produto. ;A regulamentação não detalha a assistência técnica. Mas está implícito que se a Agência certifica e o produto está válido, a assistência tem que ser mantida durante a vida útil do aparelho;, analisa Itamar.

Esse também é o entendimento do Código de Defesa do Consumidor (CDC) que em seu artigo 32 determina que ;os fabricantes e importadores deverão assegurar a oferta de componentes e peças de reposição enquanto não cessar a fabricação ou importação do produto. Cessadas a produção ou importação, a oferta deverá ser mantida por período razoável de tempo, na forma da lei;. ;Dessa forma, entendemos que o tempo razoável é a expectativa de vida útil do aparelho;, completa do diretor executivo do Procon-DF, Oswaldo Morais.


Risco generalizado


O problema não atinge somente os usuários de iPhone. A globalização ; que conferiu força às marcas no mundo inteiro e multiplicou as vendas ; não foi capaz de universalizar a assistência técnica. Dessa forma, o consumidor pode entrar em uma grande rede de loja ou hipermercado localizado no país, comprar um produto de um fabricante conhecido no Brasil e no mundo e só mais tarde descobrir que o produto chegou comércio próximo a sua casa por meio de um importador. É o caso do Playstation 3, da Sony. Embora seja vendido por lojas e hipermercados populares por aqui, o produto não possui assistência técnica autorizada porque não é comercializado pelo representante da marca no Brasil.

O diretor de criação Felipe Mello Honda, 22 anos, comprou o Playstation 3, mesmo consciente dos riscos. ;Na verdade, sabia que estava comprando um produto importado porque, antes de adquiri-lo em um site de uma loja nacional, fui à Sony e me falaram que não vendiam o aparelho aqui. Mesmo assim quis comprar. Estou consciente do possível prejuízo em caso de defeito, embora eu não concorde com isso. No site em que realizei a compra não havia qualquer aviso alertando o consumidor sobre a peculiaridade dessa negociação;, avalia.

Em resposta ao Correio, a Sony Brasil informou que ;somente oferece garantia para produtos fabricados ou comercializados por ela no Brasil. Os adquiridos em outros países ou por importadores independentes não possuem a garantia assegurada pela Sony Brasil. A empresa está trabalhando para que o PlayStation 3 esteja disponível no mercado nacional em curto prazo, quando os consumidores terão todo o suporte necessário por meio de uma rede completa de assistências técnicas autorizadas, bem como outros serviços de auxílio ao usuário;.

Para o advogado do Instituo Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Guilherme Varella, essa situação exige uma interpretação mais abrangente do Código (CDC). Ele cita como exemplo um ação julgada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 2005, que ficou conhecida como caso Panasonic. ;O STJ determinou que a representante da marca no Brasil se responsabilizasse pelo reparo ao consumidor, que havia adquirido um produto fora do país. O entendimento é que não há como se dissociar a imagem da Panasonic (1) do Brasil da marca mundialmente conhecida. Então, se os produtos estão sendo vendidos aqui em virtude do prestígio internacional do fabricante, o atendimento ao consumidor deve seguir o mesmo padrão;, explica Guilherme.

É com base nesse entendimento que o titular da 2; Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor (Prodecon) do MPDFT, Leonardo Bessa, pedirá explicações à Apple e à Sony Brasil. ;Vou instaurar uma investigação para verificar quais as dificuldades que esses empresas têm em atender aos consumidores. Afinal, o reconhecimento da marca internacional cria uma legítima expectativa no consumidor e o representante no Brasil tem que zelar por isso;, afirma.

1 - Caso Panasonic

A Panasonic do Brasil Ltda. teve que pagar uma indenização de R$ 4 mil a um consumidor por não ter atendido a um pedido de conserto de uma câmera de vídeo. A empresa alegou que o certificado de garantia se limitava ao território norte-americano e que, por isso, não seria obrigada a sanar o defeito.


Respostas

Respostas das operadoras sobre assistência técnica para o iPhone fora do período ou das condições de garantia

Claro
; Não respondeu.

Oi
; ;Em caso de reparos de aparelhos móveis, a assistência técnica para os clientes é responsabilidade exclusiva dos fabricantes de celulares. No caso específico do iPhone, a Oi apenas centraliza o recolhimento dos aparelhos de seus clientes para encaminhamento à assistência técnica.;

TIM
; ;Informa que atualmente faz a substituição de aparelhos iPhone adquiridos na operadora que apresentem algum defeito de fabricação em um período de 12 meses a partir da data de compra. Ressalta que está em fase final de negociações e que, em breve, mesmo após o prazo de garantia, o cliente poderá optar pela assistência técnica para troca do iPhone TIM.;

Vivo
; ;Quando o consumidor detectar um problema de funcionamento em seu iPhone deverá levar o aparelho juntamente com sua nota fiscal original ao ponto de venda onde o adquiriu. É verificado se há falha técnica ou evidências de mau uso (como queda aparente, dano por contato com líquidos, entre outros). Caso o aparelho esteja sob as condições de garantia, é prontamente trocado. Caso contrário (fora do prazo ou com evidências de mau uso), a Vivo oferece solução aos seus clientes, mediante pagamento de valor correspondente, conforme o problema apresentado.;