Entre católicos ou evangélicos, a representatividade política sempre foi considerada uma meta para a Igreja. Às vésperas das eleições, a pretensão de fazer nomes no Parlamento incentiva as forças religiosas a prepararem seus rebanhos para a disputa de assentos no Congresso Nacional e na Câmara Legislativa. Como consequência do vertiginoso crescimento de congregações evangélicas, esse segmento tem conquistado a cada eleição mais espaço nas tribunas políticas, expansão natural num meio em que a cada dez fiéis, três não aceitam votar em concorrentes não-evangélicos, como revela pesquisa obtida pelo Correio. A Igreja Católica, por sua vez, tentará reagir em 2010 à expansão dos irmãos de fé. Pela primeira vez, vai promover cursos de formação no período eleitoral incentivando seus devotos a votarem em concorrentes cujo perfil será doutrinado por lideranças religiosas.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) dão conta de que há na capital da República perto de 1,187 milhão de evangélicos distribuídos em 4,7 mil templos dos mais diversos ministérios. O cruzamento da estimativa com a informação de que 30% dessa comunidade dá preferência aos candidatos da igreja produz um resultado importante. Se de fato os fiéis reservam seus votos a concorrentes praticantes, como informa pesquisa realizada pelo Instituto Parlamento & Pesquisa, significa que o segmento tem de largada uma reserva de potenciais eleitores da ordem de 356,1 mil pessoas.
O Instituto Parlamento & Pesquisa ouviu, em abril deste ano, grupo de 1.020 evangélicos em 49 igrejas espalhadas pelo Distrito Federal. Os entrevistados eram, em sua maioria, mulheres entre 31 e 50 anos com ensino médio completo e renda acima de dez salários mínimos. Um dos questionamentos feitos às pessoas abordadas foi o de como deveria ser o candidato da igreja evangélica. A maior parte dos entrevistados (34%) respondeu que esse concorrente deveria ser mais compromissado com as causas sociais e contra a liberação das drogas. Outros 24% sugeriram que o postulante deveria ter moral ilibada. Um grupo de 12% acha que o mais importante atributo é o fato de o pretendente fazer parte da igreja.
Em outra pergunta, os evangélicos se mostraram cada vez mais sintonizados com o seu núcleo de vivência religiosa. A cada dois fiéis, um acha que o candidato deve fazer parte de seu ministério, ou seja, o evangélico da igreja Batista dará preferência aos concorrentes lançados em sua congregação, assim como os que frequentam a Adventista, por exemplo, também estão propensos a escolher os nomes surgidos no grupo ao qual pertencem, segundo a pesquisa de opinião. O Instituto Parlamento & Pesquisas também apurou que a maioria dos entrevistados é a favor de que o concorrente apoiado pelas lideranças evangélicas se divida entre as atividades políticas e os compromissos com a igreja.
Tabu
No meio evangélico, a orientação política não é considerada tabu. Em geral, as lideranças dessas igrejas não têm reservas quanto à rotina de pregação com vistas a melhorar a performance da congregação nas urnas. A naturalidade em lidar com o assunto facilita ao grupo atingir suas metas de representatividade no meio político. Líder da igreja Sara Nossa Terra ; que no Brasil e no exterior tem perto de mil templos e, em Brasília, 72 igrejas com frequência mensal de 45 mil pessoas ;, o Bispo Robson Rodovalho (PP) não teve dificuldades em se eleger deputado federal em 2006, primeira vez que tentou cargo eletivo. Alcançou, na época, 68,7 mil votos. Tinha pretensões de se lançar ao Senado este ano, mas para atender ao grupo que o apoia, será candidato à reeleição. ;A participação política é primordial para o segmento religioso, que trabalha com bandeiras e valores sociais. É no parlamento que os rumos da sociedade são traçados e a Igreja, que defende valores e princípios, precisa estar representada nesse meio para influenciar a tomada de decisões;, considera o bispo-deputado.
Ele alega que os cultos não são usados como palanques para campanha, mas admite que o trabalho é feito corpo a corpo entre os fiéis. ;Usamos o princípio da orientação pessoal da comunidade evangélica. Os líderes conversam com as pessoas de sua convivência, mostrando a realidade política e social;, diz Rodovalho. A estratégia tem apresentado resultados. Na Câmara Legislativa, por exemplo, quatro representantes evangélicos tiveram voz no parlamento local. Aguinaldo de Jesus (PRB), da Igreja Universal do Reino de Deus, Benedito Domingos (PP), que participa da Assembleia de Deus, Bispo Renato (PR), da Igreja do Apocalipse e, pela Catedral da Bênção, Júnior Brunelli, que renunciou ao mandato de deputado para escapar de um processo de cassação em decorrência do suposto envolvimento com o escândalo da Caixa de Pandora.
Em função do desgaste, Brunelli não será candidato neste ano, mas transferiu para a irmã Lilian seu espólio político. A expectativa é de que ela não tenha dificuldades para se eleger com o apoio da Catedral da Bênção, liderada pelo Pastor Doriel de Oliveira, pai de Brunelli e Lilian. Também representando a comunidade evangélica, vão tentar vaga no Legislativo local Rodrigo Del Masso (PTN), da Sara Nossa Terra, o Apóstolo Alessandro (PTN), do Ministério Internacional da Restauração, além de Sandra Faradj (PSDB), da igreja Ministério da Fé. Entre os candidatos a federal, o suplente Ricardo Quirino (PRB), Virgílio Neto (PSDB) e Ronaldo Fonseca (PR) são os nomes escolhidos pela comunidade evangélica para tentar a sorte na política.
O número
1,187 milhão
Número aproximado de evangélicos no DF, distribuídos em 4,7 mil templos, de acordo com dados do IBGE
Investimento em formação e politização
Sem se prender a nomes, mas com a disposição clara de indicar o perfil do candidato ideal segundo o ponto de vista das lideranças religiosas, a Igreja Católica vai realizar uma experiência inédita. Em agosto, em período eleitoral, promoverá encontros de formação e politização com o objetivo de influenciar seus fiéis a votarem em postulantes com princípios aceitos pela Arquidiocese de Brasília. Os cursos serão realizados no Plano Piloto, em Taguatinga e Sobradinho.
Além de párocos, a Igreja vai convidar cientistas políticos e pessoas com formação acadêmica alinhadas com a doutrina católica para ministrar palestras. ;É a primeira vez que organizamos esse tipo de atividade e temos como objetivo chegar a um perfil ideal de candidato, esclarecendo às pessoas quais devem ser os atributos observados no momento da escolha de um representante político;, afirmou o vigário-geral da Arquidiocese de Brasília, monsenhor Marcony Ferreira.
O vigário-geral sustenta que não haverá debate entre os candidatos ;até porque são mais de 800; e que não serão discutidos nomes específicos, ;mas um conjunto de características consideradas ideais;. De acordo com o monsenhor, a Igreja não admite que seus fiéis usem o nome da comunidade católica para pedir apoio político. ;Aqueles candidatos católicos que dizem ter a aprovação da igreja estão falando por si próprios;, avisa o vigário.
Líder de uma comunidade estimada em 1,3 milhão de brasilienses, a igreja sempre tratou com reservas a investida no meio político. Mas, a cada eleição, os líderes religiosos desse segmento lidam com mais naturalidade com a intenção de fazer seus representantes junto aos poderes da República. E apesar de a Igreja oficialmente desautorizar a campanha personalizada entre suas lideranças, esse trabalho é comum na rotina cristã.
Um dos nomes que emergiram da Igreja Católica para a disputa de outubro é o de Paulo Fernando, vice-presidente da Associação Nacional Pró-Vida e Pró-Família. É considerado uma espécie de lobista contra o aborto no Congresso Nacional e agora tentará ter voz ativa na Casa. Adécio Sartori (PDT), fundador da Rádio Nova Aliança, se lançará à Câmara Legislativa. Washington Mesquisa, hoje suplente de distrital, buscará em outubro a titularidade do mandato. Aldecyr Maciel também tentará se juntar à bancada de católicos no parlamento local, hoje representada pelo presidente da Casa, Wilson Lima (PR), o pedetista José Antônio Reguffe (PDT) e Rôney Nemer, do PMDB. Todos candidatos em 2010. (LT)
O evangélico e a política
Pesquisa realizada pelo Instituto Parlamento & Pesquisas ouviu 1.020 evangélicos de 49 igrejas do Distrito Federal. Confira resultado:
O candidato apoiado pela igreja deve, necessariamente, ser do seu ministério (segmento dentro da comunidade evangélica)?
; SIM
Responderam 519 evangélicos ouvidos na pesquisa, ou 50,8% de um grupo de 1020 fiéis abordados
; NÃO
É o que pensam 456 dos entrevistados
O candidato apoiado pela igreja evangélica deve se dedicar somente à política?
; SIM
Na opinião de 880 fiéis ou 86,2% do total de entrevistados
; NÃO
Disseram 95 evangélicos questionados na pesquisa
Você votaria em candidato que não seja evangélico?
; NÃO OU NÃO SABEM
Responderam 298 evangélicos ouvidos na pesquisa
; SIM
Responderam 722 entrevistados