Jornal Correio Braziliense

Cidades

Estudantes do Caub I fazem exposição sobre Brasília

Alunos do ensino fundamental exaltam sua admiração por Brasília por meio de versos e cartões-postais confeccionados durante uma exposição especial organizada pela escola

Aproximadamente 30km separam o Riacho Fundo II do Plano Piloto. Na manhã de ontem, porém, as duas regiões pareciam mais próximas para quem esteve no Centro de Ensino Fundamental Agrourbano Caub I, na primeira cidade. Alunos e professores transformaram o colégio em um museu temporário em homenagem a Brasília. Cada sala, corredor ou jardim ganhou um pouco da essência da capital do país. O fascínio dos monumentos, a grandeza dos candangos, o sabor das frutas do cerrado, o povo brasiliense ; nada importante foi esquecido.

Ali, o sonho de Juscelino Kubitschek se misturou aos pensamentos de dezenas de meninos e meninas que, em sua maioria, estiveram poucas vezes no centro de Brasília, mas guardaram lembranças suficientes para ter vontade de presentear a cidade no ano em que ela completou meio século de existência. O conjunto de exposições recebeu o nome de Patrimônio de Brasília. Professores de todas as disciplinas incentivaram os estudantes a se envolverem um pouco mais com a história da capital, desde o início do ano letivo.

Na quinta-feira (8/7), finalmente, todas as faces do projeto puderam ser exibidas. A diversidade tomou conta da escola. Havia música (com muita Legião Urbana ecoando pelos corredores), comida típica, arquitetura em maquetes e artes por todo canto. Os estudantes fizeram cartões-postais à mão, com imagens pouco exploradas nas lembranças tradicionais, para mostrar que Brasília é muito mais que o Plano Piloto. Estamparam com traços de lápis de cor o balão da entrada do Gama, as esculturas vistas na chegada ao Recanto das Emas e à Praça do Relógio, em Taguatinga. Pintaram também Brasília sob o olhar de vários movimentos artísticos. A Brasília cubista, vista sob vários ângulos ao mesmo tempo; a impressionista, sem contornos nítidos; e a expressionista, em cores violentas e cheias de sentimento.

A cidade em versos
Já nas aulas de matemática, as crianças e adolescentes aprenderam que um monumento é erguido, entre outros fatores, graças a cada pequeno ou grande cálculo. Nas de português, descobriram como expressar amor a Brasília por meio de palavras, a enxergar sempre o melhor ângulo dessa cidade. Para isso, valeram-se da seção Crônica da Cidade, do Correio Braziliense, assinada diariamente pela jornalista Conceição Freitas.

As palavras da cronista inspiraram os adolescentes. Cada um buscou dentro de si o que via de bom na vida em Brasília. Alguns optaram pela crônica, o formato mais próximo do dia a dia, em que o texto é como uma conversa sincera e agradável entre amigos, com uma percepção sensível da realidade. Outros se sentiram mais à vontade em escrever cartas para parentes que não moram em Brasília convidando-os para conhecer as maravilhas da capital.

Todos fizeram o exercício de tentar enxergar a poesia do cotidiano. Foram ao Plano Piloto várias vezes para buscar inspiração. ;Deu até emoção de ver os menorezinhos, ao subir na torre, quando eles viram aquela paisagem maravilhosa lá de cima. Os olhos deles brilhavam;, descreve a vice-diretora Gedilene Lustosa. Levaram também o Correio para dentro de sala de aula. ;Até eu, que nasci em Brasília, descobri coisas que não sabia sobre a minha cidade durante o projeto;, relatou a professora de português Margarete Magalhães.

Leram também uma antologia de textos do gênero que mesclava de Clarice Lispector e Carlos Drummond de Andrade, entre outros grandes nomes da literatura brasileira. Os estudantes conseguiram bons resultados. Para recompensá-los, Margarete reuniu os melhores textos e organizou em um livro. A publicação ganhou o nome de Brasília em crônicas e cartas. São 26 páginas com 16 crônicas e cinco cartas. O livro foi impresso no Caub I, sem muita pompa, em papel comum e letras de computador. A intenção era guardar uma lembrança do aprendizado. ;É impressionante como eles se envolveram e gostaram de escrever;, avalia a professora.

Talentos

A estudante do 3; ano Mayara Costa, 18 anos, mergulhou no universo da crônica. ;Eu sempre gostei de escrever. Brasília me trouxe inspiração por ser diferente de todas as outras cidades. Descobri um talento que tenho, o de escrever crônicas;, orgulha-se a adolescente, autora de dois textos presentes na coletânea. Kélvia de Oliveira, 17, está no 1; ano e nunca tinha escrito uma crônica. ;Vou pouco ao Plano Piloto. Mas toda vez que vou até lá, acho tudo muito bonito e organizado. Dá vontade de escrever;.

O projeto Patrimônio de Brasília serviu também como uma injeção de autoestima para os estudantes. ;Eu não era muito de crônica, mas começamos a ler a Crônica da Cidade e eu quis tentar. Gostei de falar sobre o dia a dia, deixo a imaginação voar. O que eu mais gosto é que parece que sempre vai ter uma continuação;, concluiu Najla Christianne, 16 anos, aluna do 2; ano.

Como encontrar
O livro Brasília em crônicas e cartas está disponível na biblioteca do CEF Agrourbano Caub I, no Riacho Fundo II. Informações:
3901-8069.


Sob suspeita

Tudo o que será escrito aqui está sob suspeição, como toda crônica é suspeita. Nela não existe a objetividade fria e cortante dos fatos. A realidade, para um cronista, se submete a uma outra dimensão, a da subjetividade. Daí que a crônica humaniza quem escreve e quem lê, porque ela convoca os dois, leitor e escrevente, a se retirar da veracidade aritmética dos fatos e transporta para uma cosmogonia mais fluida, mais malemolente, como um algodão-doce ou uma maria-mole. Foi o que fizeram os garotos e as garotas do Centro de Ensino Fundamental Agrourbano Caub I: deixaram a matemática de lado e começaram a olhar o ao redor com os olhos do coração. Descobriram, assim, que é preciso criar um mundo particular, todo dia, toda hora, todo instante, para dar conta do mundo real ; esse que não é fácil. No exercício de escrever crônicas, os meninos e as meninas vão se descobrindo, descobrindo ou redescobrindo a cidade e fortalecendo os laços de humanidade, porque desarmados da dureza do cotidiano. E transformaram meu dia rotineiro de ontem num dia de nuvens gordas, frio carinhoso e noite feliz. (Conceição Freitas)


Olhar de estudante

Conheça alguns textos do livro dos estudantes do Caub I:

# O azul de Brasília
Najla Christianne ; 2; ano
Brasília, capital privilegiada pelo sol mais lindo que há de existir. Dizem que aqui o sol nasce diferente em cada horizonte. O azul de Brasília se inicia nas alturas. O céu das manhãs da capital é cada dia mais azul, e as manhãs cada vez mais lindas causam a inspiração aos brasilienses para uma nova rotina. Existem dias nublados, em que a chuva marca sua presença, matando a seca do nosso cerrado. Durante as noites fechadas, o calor é suavizado pela brisa gelada, acompanhada de estrelas perfeitas e de um lugar que causa admiração aos olhos de qualquer um. Neste céu azul, dia e noite, Brasília é inspiração. Pode-se, assim, entender por que é a cidade das luzes.

# Festa em Brasília
Cintia Castelo ; 2; ano
Brasília, uma capital linda e bem preservada, enlouqueceu no dia da estreia do Brasil na Copa do Mundo, na África do Sul. Com o trânsito parado, as pessoas foram trabalhar de carro. Resultado: um milhão de veículos circulando e enormes engarrafamentos. Os brasilienses lotaram bares, praças e ruas do Plano Piloto e das cidades satélites. O barulho das vuvuzelas soava por todo lado e o brilho estampado no olhar da tão esperada estreia. Os índios não podiam ficar de fora. E celebraram ao seu modo, jogando futebol pelados, na Esplanada. É isso aí! Vale tudo para festejar a ida do Brasil rumo ao hexa! Cada brasiliense festejando do seu jeito, com sua cultura. Afinal, Brasília é a capital das mais diversificadas culturas!

# Vende-se um jantar
Dieicy Lima ; 3; ano
Comunidade de gente humilde pode esperar de tudo um pouco. Pessoas se ajudam um pouquinho aqui, um pouquinho ali; todo mundo se conhece. Em uma terra de grandes riquezas, em uma bela noite, com o céu estrelado, enquanto se contempla uma imagem maravilhosa, para uma pessoa na sua frente com uma panelinha e pergunta: ;Quer comprar uma janta?;. Foi o que aconteceu recentemente em uma cidadezinha chamada Caub. Duas adolescentes felizes observavam os ;gatinhos; que passavam. Olhavam com bastante atenção. Algumas pessoas se aproximam. Não se imagina que a intenção do indivíduo era oferecer, ou melhor, vender um jantar. Depois que as moças recusaram o jantar, a pessoa saiu resmungando, como se alguém fosse obrigado a aceitar e comprar um jantar de um desconhecido qualquer.

# Um lugar diferente
Mayara Costa ; 3; ano
Quem chega a Brasília sem estar preparado para o clima acaba levando um grande susto, pois ele pode ser muito seco ou muito úmido. Em um dia comum, acordamos pela manhã e nos deparamos com aquele frio pedindo casacos superaquecidos, porém uma, duas, três horas depois trocamos o casaco por roupas leves, frescas. A mudança continua e surge uma nova vontade de ficarmos apenas de roupa de banho, por causa do calor. Para quem já conhece Brasília, fica mais fácil, pois já sabe que se deve andar preparado para os transtornos do dia. Agora, quem não conhece acaba sofrendo um pouco. Uma coisa bastante confusa e que chama a atenção é a chuva. De uma hora pra outra vem aquela chuvinha. Abrimos o guarda-chuva, andamos um pouco e, quando viramos a esquina, nem uma gota ali caiu.

Quantas vezes isso já ocorreu com os cidadãos dessa cidade complicada de se entender! Às vezes o dia começa frio, depois quente, e, quando chega a noite, o frio volta. Esta, sim, é uma cidade diferente, onde, além do clima, se nota uma calmaria sem tamanho, apesar de não ser uma cidade tão pequena. Buzinar? Só com grande precisão. Aqui os motoristas respeitam as faixas de pedestres. Claro que também há exceções, pois, se não houvesse, Brasília seria praticamente perfeita. Apesar de ser um lugar diferente que se leva um pouco de tempo para entender, é uma cidade adorável. Aqui não passamos por catástrofes, muita chuva e nem de muito calor. Não sofremos tanto pelo barulho das buzinas dos carros. O que nos deixa com um grande alívio de sobrevivência.