Jornal Correio Braziliense

Cidades

Justiça de olho nos terminais

Oficiais verificam se rodoviários estão colocando menos de 60% da frota nas ruas. Eles garantem que não. Categoria ameaça greve geral


Os passageiros enfrentaram ontem mais um dia de transtornos. A frota circulou com 75% dos ônibus nos horários de pico, segundo o Sindicato dos Rodoviários, o que deve ocorrer até amanhã. Já os empresários garantem que apenas 52% dos coletivos estão nas ruas nos horários de maior movimento e, em função disso, eles pediram providências à Justiça, que, na semana passada, fixou multa de R$ 100 mil caso os trabalhadores circulassem com menos de 60% da frota. O Tribunal Regional do Trabalho (TRT) disse ontem que os oficiais vão continuar fiscalizando nos terminais o cumprimento da determinação.

O Sindicato de Empresas de Transporte Coletivo Urbano do DF (Setransp) pediu na Justiça do Trabalho a aplicação da multa ao sindicato dos trabalhadores, alegando abusividade do direito de greve. O juiz Paulo Henrique Blair, em seu despacho, esclareceu que o pedido de aplicação da penalidade será objeto de análise. ;A fiscalização quanto ao cumprimento da liminar continuará a ser exercida até o encerramento da instrução da ação cautelar;, disse.

O Correio percorreu ontem oito regiões administrativas (Ceilândia, Taguatinga, Samambaia, Recanto das Emas, Planaltina, Sobradinho, Paranoá e São Sebastião) e em todas elas os passageiros enfrentaram transtornos. Em Ceilândia Norte, no principal terminal da cidade, centenas de pessoas esperaram, em média, uma hora por um meio de ir ao trabalho ou estudar. As linhas mais procuradas eram as que seguiam para o Plano Piloto, Setor de Indústrias e Abastecimento (SIA) e Taguatinga. ;Fiquei um tempão na parada e não passou nenhum ônibus, aí desci para o terminal, mas até agora nada;, afirmou a vendedora Neli Coelho, 32 anos, que ia para o SIA e esperou mais de meia hora até conseguir transporte. Ela, porém, chegou atrasada ao trabalho.

Difícil embarque
O Correio acompanhou também a saga da doméstica Aldênia Menezes Gomes, 30 anos. Moradora da Estância Mestre D;Armas, em Planaltina, a mulher aguardou mais de uma hora para fazer o trajeto no qual não gastaria nem 20 minutos em dias normais. Ela conseguiu entrar no ônibus após a quarta tentativa. Espremida entre os outros passageiros, já imaginava o sofrimento na volta para casa. ;Não sei porque eles não param logo até resolverem tudo. Assim, sairíamos de casa sabendo que não poderíamos contar com os ônibus e daríamos outro jeito;, reclamou.

A necessidade de respeitar o horário de chegada ao trabalho fez a moradora do Paranoá Ana Paula Rodrigues, 30, sair mais cedo da cama. ;Entro no trabalho, no Sudoeste, às 8h. Costumo sair de casa às 6h40. Hoje (ontem) cheguei aqui 40 minutos antes e estou há duas horas esperando;, reclamou a doméstica. ;A minha patroa já teve de me buscar aqui por causa da greve;, completou. Para a amiga dela, Marizete José de Oliveira, 34, diarista, faltar ao trabalho é prejuízo. ;Ganho por dia. Preciso chegar cedo para fazer meu trabalho a tempo, mas desse jeito acho que vou perder meu dia;, lamentou a moradora do Paranoá.

População refém
No Recanto das Emas, a cena se repetia. As paradas não comportavam mais passageiros. Em meio ao caos do transporte público, os carros piratas lucram. Em menos de cinco minutos, a equipe de reportagem flagrou um veículo estacionado no ponto de ônibus da entrada da cidade para buscar passageiros. A passagem chega a custar até R$ 10, a depender do destino e da procura. ;Aqui toda hora passa, é muito comum;, relatou o militar Antônio Francisco do Vale, 30 anos, morador de Samambaia, mas que esperava ônibus no Recanto das Emas. Com a mobilização dos rodoviários, o metrô, que está circulando com sua capacidade total, fica lotado nos horários de pico.

E o que já está ruim pode piorar. Os usuários já se preparam para uma possível greve geral dos cobradores e dos motoristas de ônibus a partir de segunda. Os rodoviários têm assembleia marcada para as 10h de amanhã, no Conic. Os líderes sindicais já adiantaram que a tendência é que a categoria decida pela greve geral. ;O governo não se dispôs a negociar com a gente. Os empresários também não fizeram proposta. A única solução é a greve. Estamos lutando na Justiça para rodar com apenas 30% da frota;, avisou o diretor do Sindicato dos Rodoviários Lúcio Lima. Por meio da sua assessoria de imprensa, o GDF reafirmou não ter a intenção de interferir e não fala em aumento no preço das passagens, iniciativa apontada por empresários e pela categoria como uma possível solução. A volta para casa também foi sofrida para o brasiliense ontem.
Colaborou Ary Filgueira


Cronologia do movimento

10 de junho
Os rodoviários fizeram uma paralisação-relâmpago de três horas deixando mais de 600 mil passageiros sem ônibus no começo da manhã.

13 de junho
Os trabalhadores do setor, em assembleia, decidiram pelo movimento chamado Catraca Livre durante a semana.

14 de junho
Dividida, a categoria colocou em prática o movimento Catraca Livre, liberando os usuários do pagamento da tarifa.

15 de junho
Reunião entre patrões e empregados termina sem acordo.

16 de junho
Rodoviários começam a fazer o movimento Jornada legal, retirando de circulação 599 ônibus extras que reforçam as linhas nos horários de pico.


Opinião do internauta
Leitores comentaram no site do Correio a reportagem sobre a greve dos rodoviários e a pressão dos empresários para o aumento das passagens. Leia alguns comentários:

Paulo Guimarães
;Se aumentar a tarifa, meu Deus, vai ser um quebra-quebra e ônibus incendiados.;

Éder Aquino
;Até quando a família Canhedo vai ficar monopolizando o transporte em Brasília?;

Fabiano Oliveira
;Aumentando o salário mínimo para R$ 2 mil, poderia colocar a passagem a R$ 5 tranquilo.;

Geovani Pessoa
;Por que até hoje não houve licitação pública para as concessões desses serviços? Essa é a única forma de melhorar a qualidade do sistema de transportes coletivos e baratear as tarifas. Vamos ver as propostas dos candidatos para essa área.;

Jhonatan Oliveira
;Se alguém fizer uma pesquisa vai constatar que nem nos Estados Unidos, que é país de primeiro mundo, com o sistema de transporte que serve de modelo, a passagem não é cara igual à da capital do Brasil.;

Ana Tavares
;Com essa guerra entre governo e empresários, quem sofre é a população.;

José Maria Camargo
;Podem ter certeza de que algum aumento de passagem virá. O transporte coletivo no DF é uma verdadeira caixa-preta e não há licitações regulares nas linhas de ônibus, o que poderia baratear e gerar concorrência.;

Albertina Araújo
;Parabéns, São Sebastião! Se todos fizessem assim, acabaria com essa pouca vergonha.;

Roselene Cândida Alves
;O governo tem que se meter, sim, nas negociações, porque o transporte coletivo funciona mediante concessão e cabe ao GDF fiscalizar o bom andamento dos serviços. Não adianta dizer que é um acordo trabalhista. O povo merece respeito.;

José Barros
;Não vejo motivo para estatizar isso.;