Acusado de corrupção e correndo o risco de ser afastado do cargo de procurador-geral de Justiça, Leonardo Bandarra se apega à falta de provas cabais para seguir no comando do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) até 2 de julho, quando termina seu mandato à frente da instituição. ;Não tem uma gravação, um bilhete, uma referência, nada contra mim. O homem (Durval Barbosa) que tem prova contra todo mundo, contra o seu acusador, não tem nada;, sustenta.
Sobre a falta de materialidade alegada por Bandarra, no entanto, há controvérsias. A corregedora-geral do MPDFT, Lenir de Azevedo, considerou em seu relatório remetido ao Conselho Nacional do Ministério Público que há ;indícios de veracidade; nas denúncias de Durval Barbosa ; principal delator da Operação Caixa de Pandora ; contra o procurador-geral.
Bandarra atribui o estado de suspeição em que foi colocado à atitude de ter enfrentado Durval Barbosa (;Apresentei 12 ações criminais contra ele;) e à circunstância da disputa interna pelo cargo que ocupa. As eleições no MP ocorrem na próxima terça-feira. Na avaliação do procurador-geral de Justiça, suspeito de receber mesada para atuar em benefício de Durval, alguns promotores são capazes de ;cometer insanidades; para ocupar a chefia do Ministério Público. Confira abaixo trechos da entrevista concedida ao Correio na manhã deste sábado (29/5).
Como promotor de Justiça, o senhor pertence a uma carreira genuinamente atribuída aos ;mocinhos;, numa divisão ; grosso modo ; entre o bem e o mal. Como é que o nome do senhor foi parar em meio a um escândalo de corrupção, atividade típica de bandidos?
Justamente por estar enfrentando os bandidos. Desde que assumi o cargo de procurador-geral, o Ministério Público se preparou para fazer as investigações e se estruturou administrativamente para esse enfrentamento. Só eu apresentei 12 ações criminais, existem mais de 100 processos produzidos contra Durval Barbosa, que era o representante do crime organizado no DF.
Por que Durval se voltou contra o senhor e preservou outros algozes, promotores de Justiça que sempre andaram no encalço dele?
Porque as ações contra Durval eram feitas por mim, já que eu sou o procurador-geral e ele tem foro no Tribunal de Justiça. Existem várias outras pessoas que participaram dessas investigações; agora, por que ele veio contra mim, você tem de perguntar para ele.
Por ser um integrante do MP, o senhor tem experiência em reconhecer o perfil de testemunhas. O que há de verdade nos depoimentos de Durval Barbosa, que derrubaram uma geração de políticos no DF?
A única verdade que tem é o próprio depoimento do Sombra (jornalista Édson Sombra) e do Durval quando eles dizem que não têm uma prova contra mim. Não há uma gravação, um bilhete, uma referência, nada. O homem que tem prova contra todo mundo, contra o seu acusador, não tem nada.
Por que os depoimentos de Durval serviram para solapar um governo inteiro e não merecem crédito com relação ao senhor?
Desde julho do ano passado, quando começou a Operação, saíram as notícias e eu sempre tive o cuidado de me manifestar de forma ponderada, porque as investigações estavam sendo também feitas pelo MPDFT. Tenho a responsabilidade de não desqualificar essas investigações, sob a alegação de fazer a minha defesa. Se todo o governo caiu, foi porque ele mostrou as fitas e contra imagem é muito difícil ter argumento. As acusações têm que ser provadas. Nem tudo o que Durval fala se confirma, nem tudo é verdade.
O fato de não haver fitas, não significa, necessariamente, que o senhor seja inocente. O senhor recebia os R$ 150 mil de mesada para preservar Durval Barbosa?
Falavam que eu tinha apartamentos em São Paulo, em Águas Claras, no Rio de Janeiro. Toda hora sai um boato. Eu desminto um por um. Esse do lixo é uma grande mentira. A investigação ouviu todos os promotores de Justiça que combatem os contratos emergenciais do lixo. Todos dizem que o procurador-geral nunca tocou nesse ponto.
Por que então a corregedora-geral do Ministério Público, Lenir de Azevedo, chegou à conclusão de que há indícios de veracidade sobre os depoimentos de Durval Barbosa contra o senhor?
A resposta está na transcrição do diálogo da corregedora com o Sombra (jornalista Édson Sombra). Já em abril, a corregedora diz que quer me pegar e está fazendo tudo para isso.
Como era a relação do senhor com a corregedora antes do episódio da Caixa de Pandora?
A doutora Lenir, como todos os membros do MP ; quase todos ;, sempre me deu muita atenção e eu sempre dei muita atenção a ela. Nunca fui íntimo, mas sempre mantivemos relações cordiais.
Por que então ela se voltou contra o senhor? Que motivo teria para levantar falsos indícios ?
Eu não dei nenhum motivo. Ela fez aquilo que entendeu que deveria fazer. Mas fez errado.
Um dos argumentos usados pela corregedora Lenir foi construído a partir da análise da quebra de sigilo telefônico de Deborah Guerner, dados que indicam uma intensa comunicação entre o senhor e a promotora de Justiça acusada de agir de acordo com os interesses de Durval em troca de R$ 1,6 milhão. Qual a relação que o senhor mantinha com ela?
Esse laudo eu quero ver. Tentei no Supremo Tribunal Federal, que não me deu acesso; então, como é que vou comentar? Quando há um laudo de uma linha telefônica, você não tem como saber se a ligação se completou. Se eu te ligar 100 vezes e você não atender, vai aparecer que eu te liguei 100 vezes mesmo que você não tenha atendido nenhuma dessas ligações.
Mas o senhor viveu esses momentos, independentemente dos laudos. Certamente tem uma memória do que ocorreu. O senhor mantinha uma relação estreita com Deborah Guerner?
Eu conversei sempre com a Deborah, como converso com vários membros do Ministério Público. Liguei algumas vezes para ela, como ela ligou para mim, da mesma forma como faço com vários outros integrantes do MP.
Há registros de mais de 500 telefonemas em três anos, uma média de uma ligação a cada dois dias, indicativo de proximidade; Esse número é seu. É da corregedora Lenir de Azevedo. Cadê? Onde eu posso ver? O senhor não confirma essa frequência?
Não confirmo nem desconfirmo. Esse é um número que tem de aparecer em algum momento. Antes disso, não faço juízo de valor, primeiro quero saber as circunstâncias.
Como procurador-geral de Justiça, imagina-se que o senhor seja bem-informado sobre o que ocorre no Ministério Público. Sabia da existência de uma investigação do MPDFT em que Guerner é apontada como uma pessoa diretamente interessada em negócios envolvendo o lixo e que ao marido dela é atribuída uma sociedade na WRJ, uma das empresas cotadas para receber uma fatia do setor?
Essa é uma alegação que, segundo me consta, ela nega. Ela diz que o marido nunca foi dono dessa empresa. Então tem que se provar isso.
Mas então o senhor tinha conhecimento da investigação?
Não. Essa questão do lixo foi aventada pela primeira vez no site do Kuppê (Roberto Kuppê), em 2007. Sobre essa notícia, eu entrei com representação criminal em que o jornalista está sendo processado e uma representação ao procurador-geral da República para investigar o conteúdo dos fatos. Essa investigação foi realizada e arquivada porque não tinha fundamento. Outra referência que tem sobre isso é a proposta de Ajustamento de Conduta que a governadora Maria de Lourdes Abadia fez em 2006. Recebemos a proposta, que foi encaminhada para os promotores do Patrimônio Público e Meio Ambiente. E essa proposta foi negada.
Deborah participou das tratativas desse TAC?
Hoje se fala à boca pequena que ela teria feito essa minuta de Termo de Ajustamento, mas isso nunca ficou provado e ela também nega. Participar de tratativas é interferir em cláusulas no ajustamento de conduta. Quando a governadora foi entregar o TAC, estava na minha sala a doutura Deborah, além de outras pessoas. A doutura Deborah estava lá porque a governadora Maria de Lourdes Abadia mantinha um relacionamento com ela. Chegou a pedir para a Deborah ser afastada para ser subsecretária de governo. No dia da reunião, ela conduziu Abadia até o gabinete.
Recentemente, Deborah Guerner pediu para ser avaliada por uma junta médica que decidiria sobre a possibilidade de a promotora ser aposentada por motivos médicos. O senhor assinou a portaria criando a comissão, que foi desautorizada pelo Conselho Nacional do MP. O senhor não deveria ter se declarado impedido no caso?
Não tenho nenhum motivo para ter impedimento, suspeição ou para me afastar de qualquer ato. O requerimento que foi feito ao corregedor nacional por um promotor de Justiça fala que a junta médica foi escolhida por mim, o que é mentira, fala que eu marquei a perícia rapidamente, o que não é verdade, o processo está tramitando desde fevereiro e que eu teria escolhido as datas, quando as datas são colocadas pelos médicos. Então, um promotor mentiu para o corregedor nacional, que comprou a mentira e a representou para um conselheiro, que deu uma liminar.
O senhor é uma vítima dentro do Ministério Público?
O que existe dentro do Ministério Público são pessoas que passaram de todos os limites por conta da busca de uma cadeira de procurador-geral. Estamos em plena eleição e sempre tive bom desempenho nas eleições. Havia um medo de que eu conseguisse fazer o meu sucessor no cargo. A busca pelo poder está levando alguns promotores a cometer insanidades e a colocar o nome da instituição no lixo.
O senhor se sente envergonhado de estar protagonizando um episódio que pode manchar o Ministério Público?
Não me sinto nem um pouco envergonhado. Me sinto, sim, injustiçado, porque eu não fiz nada de errado. Foi pelas ações impetradas por mim que Durval aceitou fazer a delação premiada. Se eu tivesse colocado qualquer coisa debaixo do tapete, nada disso estaria acontecendo, então eu não tenho motivo nenhum para me envergonhar.