Jornal Correio Braziliense

Cidades

Sobram barcos e falta fiscalização no Lago Paranoá

Principalmente no período da noite, quando costumam ocorrer as festas mais agitadas. Apenas 26 militares fazem a segurança do Paranoá

Durante o dia, quem circula pelo Lago Paranoá em embarcações até é abordado por fiscais da Marinha. Os oficiais checam se o condutor é um Arrais amador ; pessoa habilitada para conduzir embarcações em vela ou motor, de esporte ou recreio, em águas abrigadas ;, se os documentos estão em dia e se as condições dos itens de segurança (coletes, extintor de incêndio e luzes de sinalização, por exemplo) são respeitados. Mas é à noite, quando há um movimento ainda mais intenso de festas a bordo de lanchas e veleiros, que as pessoas se divertem ; e muitas vezes colocam em risco a própria vida ou a dos outros, com o desrespeito às normas ; sem nenhuma autoridade por perto para garantir o cumprimento das regras. É o que garantem frequentadores assíduos do local.

No início da noite de ontem, o Correio registrou um flagrante do desrespeito às regras de segurança. De seis lanchas estacionadas às margens do Lago Paranoá, perto da Asbac, no Setor de Clubes Sul, Trecho 2, três estavam lotadas. Enquanto esperavam para assistir a um show, homens e mulheres em trajes de banho, em clima de descontração, dançavam e pulavam em cima das proas dos barcos. Havia lanchas amarradas umas às outras. Os veículos passavam muito próximos, causavam marolas e as pessoas se desequilibravam. Entre as 18h e as 19h, a fiscalização não apareceu.

Há 26 militares em sete embarcações para fiscalizar a frota de 28 mil barcos registrados em apenas uma Delegacia Fluvial, que atende ao Distrito Federal e Goiás. Desses, mais de 6 mil estão em Brasília. A cidade é a terceira em número de embarcações por habitantes no país, de acordo com a Marinha, que garante que o número de fiscais é suficiente. Aos fins de semana, por volta de 100 embarcações costumam circular por dia no lago. A Marinha faz em torno de 50 abordagens e, geralmente, 10% apresentam alguma irregularidade como documento vencido e falta de equipamento de segurança.

Uma infração cometida com frequência é a de beber e dirigir. A lei seca(1), em vigor desde outubro de 2008, não versa somente sobre os carros. A legislação também menciona o trânsito aquático. Quem está no comando de lanchas, barcos e jet-skis pode ser penalizado ao conduzir sob o efeito de álcool. A Marinha é responsável por fazer o teste do bafômeto com esses condutores. Mas, de acordo com donos de embarcações entrevistados pelo Correio, desde dezembro do ano passado o bafômetro não é visto nas águas do Lago Paranoá.

[SAIBAMAIS];Dessa época para cá não vi mais ninguém fazendo o teste. À noite não tem fiscalização nenhuma. As pessoas bebem muito e dirigem, andam sem as luzes de sinalização, fazem manobras irresponsáveis. Tem até gente sem habilitação que sabe que não vai ser abordado e pega a lancha para vir para o lago;, denunciou o empresário Marcelo Regata, 39 anos, morador do Lago Sul, dono de um veleiro. O engenheiro Djalma Otávio Nunes, 29 anos, navega toda semana e nunca se submeteu ao bafômetro. ;De dia tem fiscalização, mas só pedem os documentos. À noite, cada um faz o que quiser. Muita gente bebe e perde a linha;, disse.

O também engenheiro Luciano Costella, 38 anos, morador de Águas Claras, acredita que o problema não é somente a falta de fiscalização e aponta falhas no preparo dos Arrais. ;É necessário mais rigor para conceder a habilitação. A pessoa ganha o arrais sem nunca ter dirigido na vida. Acaba atrapalhando e colocando todo mundo em risco;, reclamou Costella. Marcelo Regata tem o título de arrais amador desde os 18 anos e também atribui a falta de habilidade de alguns condutores de embarcações à não exigência da prova prática para tirar a habilitação.

;Qualquer um pode ganhar o Arrais. É só fazer uma prova teórica. As pessoas não aprendem regras de navegação. Se tiver dinheiro, o cara compra uma lancha e sai por aí;, afirmou Regata. O delegado da Delegacia Fluvial, Rogério Leite, rebateu as afirmações dos condutores. ;Esse exame foi implantado através de estudos e chegou-se à conclusão de que essa prova é, sim ,efetiva. A prática a pessoa adquire no dia a dia;, garantiu Leite.

1 - Na terra e na água
A lei seca vale tanto para condutores de carros quanto para os de embarcações, sem nenhuma diferença. A tolerância é de apenas um miligrama de álcool por litro de ar expelido dos pulmões. Quem for flagrado com até três décimos (0,3 mg/l) sofre punições administrativas. Acima dessa quantidade caso uma outra pessoa habilitada e sóbria não possa conduzir o veículo ele é levado para o depósito e o motorista encaminhado para a delegacia.

O QUE DIZ A LEI
A Legislação Marítima Brasileira prevê que para poder dirigir uma embarcação, seja ela um jet ski ou um barco, é preciso ter autorização da Marinha Brasileira. A carteira de Arrais amador é concedida pela Capitania dos Portos de cada estado ou unidade da federação. O documento dá o direito a navegar a até aproximadamente 926 metros de profundidade. O único pré-requisito é ter mais de 18 anos. A permissão deve ser renovada a cada 10 anos. O teste possui 40 questões de multipla escolha e o candidato tem de acertar metade para ser aprovado. Entre as matérias cobradas estão estabilidade em correntes marítimas, manobras e noções de sobrevivência.