Cidades

Postos são boates a céu aberto

Moradores de várias quadras reclamam das lojas de conveniência em locais de revenda de combustível. Elas funcionam a noite inteira, atraem motoristas que deixam alto o som do carro e atrapalham quem quer sossego

Luiz Calcagno
postado em 18/05/2010 07:00
Após as agressões contra o oficial da Aeronáutica Anísio Oliveira Lemos, 46 anos, o Correio recebeu uma série de denúncias de moradores do Plano Piloto que passam pelo mesmo problema: lojas de conveniência que se transformaram em pontos de festas a céu aberto. As reclamações da comunidade seguem um padrão. Na maioria dos casos, são carros de som e pessoas bebendo cerveja durante toda a madrugada, de quinta a domingo.

Hélio Zanatta mora na 309 Norte, em frente a um posto de combustível: É o caso do posto no Eixinho L que fica na altura da 208 Sul. A servidora pública Débora Freitas, 42, moradora do Bloco J, conta que convive com algazarras há quase cinco anos. Ela e os demais condôminos já recorreram ao Instituto Brasília Ambiental (Ibram), à 1; Delegacia de Polícia (Asa Sul) e à Polícia Militar, mas a bagunça continua. ;No início, o local era ponto de encontro de colecionadores de carros, e era só até as 23h, mas eles saíram e ficaram os baderneiros;, contou.

Segundo Débora, em 2005, a PM chegou a prender pessoas por tráfico de drogas no local. A moradora conta que a barulheira não se restringe aos fins de semana. ;Pode ser qualquer dia, mas se intensifica de quinta a domingo. Uma vez, liguei para a polícia, e o barulho estava tão alto que o agente que falou comigo achou que eu estava no meio da festa.;

Outro morador do prédio, o representante comercial Rômulo do Nascimento Valente, 55 anos, conta que também poderia ter sido vítima de agressões, como Lemos. Ele já foi ao posto pedir para baixarem o som e chegou a discutir com alguns rapazes. ;Os bares fecham e eles vão para os postos. Um vigilante do prédio, uma vez, ligou para a polícia, e mandaram ele dormir;, conta. Um dos moradores chegou a convidar pais de funcionários do posto para tentarem dormir no prédio em noites de movimento.

O gerente do estabelecimento, Francisco Carlos Pereira, ameniza a situação. Ele admite que já houve baderna, mas argumenta que a situação melhorou muito. Segundo ele, quem vai ao local comprar cerveja à noite com som alto não costuma ficar no posto. ;A instrução que temos é para não ficarem aqui com o som ligado. Tem até placa informando. Por outro lado, só trabalho no turno da manhã;, comentou.

Pedras no telhado
Na 309 Norte, moradores do Bloco O também se queixam do problema. Nesse bloco, mora Daniel Benquerer Costa, 23 anos, acusado de ser um dos agressores do militar Lemos. Segundo o aposentado Hélio Zanatta, 58, já houve noites em que ele e a mulher não conseguiram dormir. A solução, acredita ele, é obrigar as lojas de conveniência de postos a fecharem às 22h. ;O problema é que o pessoal vem beber, com som alto, e faz uma algazarra muito grande. O lava a jato também funciona à noite e atrapalha o nosso sossego. Moradores deram queixa na 2; Delegacia de polícia (Asa Norte), mas não adiantou nada;, lamentou Zanatta.

Outro morador do prédio, o funcionário público Horácio Figueiredo, 53 anos, foi mais longe. Revoltado com a baderna, que chama de tortura, ele chegou a jogar pedras no telhado do posto. ;É um negócio insuportável. Não conseguimos dormir à noite. A loja de conveniência fica aberta 24 horas por dia. As pessoas bebem, riem alto, ouvem música, e aquilo parece acontecer na sua sacada.; Procurado pela reportagem, o gerente do posto não quis dar entrevista nem passou o contato dos proprietários.

O que diz a lei
A Lei Distrital n; 4.092/08, chamada lei do silêncio, trata como poluição sonora qualquer emissão de som que possa ser considerada nociva à saúde e ao bem-estar das pessoas. A regulamentação limita os níveis de intensidade do som para cada área da cidade e define que estabelecimentos com nível de pressão sonora acima de 80 decibéis avisem a clientes sobre possíveis danos à saúde. A lei proíbe carros de som em áreas residenciais ou escolares e exige o isolamento acústico para casas noturnas. A multa para quem desrespeita a norma pode variar de R$ 3 mil a R$ 20 mil. Quem for notificado ainda pode ser preso por crime de desobediência, caso insista em manter o volume do som acima do nível determinado para sua região.


Opinião do internauta

André Luiz Moura
;Eu costumava abastecer, lavar o carro e consumir na loja deste posto, assim como minha namorada e alguns amigos. Já decidimos que nunca mais iremos lá. Com isso, menos quatro clientes assíduos.;

Felippa Silva
;Foi uma verdadeira covardia o que fizeram com o pobre do senhor, que, com toda a razão, foi reclamar do barulho. Já morei na 214 Sul, uma quadra de militares na qual os filhos deles fazem e acontecem (nem todos). E quando se chama a polícia, os soldados vêm com a conversa de que não podem fazer nada, mas, caso a gente queira registrar uma ocorrência...;

Elias Ajouz
;Sem pretender julgar ninguém, mas nada justifica que alguém espanque quem quer que seja por cobrar o respeito à lei vigente. Muito triste.;

Luiz Guerra
;A falta de educação desse pessoal do som alto é demais. Nesse caso, o mais indicado é dar uma multa bem salgada no sujeito, além de recolher o carro ao depósito do Detran. Pode também aproveitar e fazer o teste do bafômetro e concluir convidando-o a entregar a CNH. Agora, tem que ter vontade.;

Paulo Amorim
;Não sei o que precisa ser feito para configurar tentativa de homicídio. Se um agressor imobiliza a vítima e os outros quatro dão socos e batem sua cabeça contra uma pilastra e isso se enquadra apenas no crime de lesão corporal, alguma coisa está errada.;

Simone Cruz
;Aqui em Brasília, quando pedimos ajuda para o excesso de barulho, não somos atendidos porque já fiz isso algumas vezes. Quando morava em Goiânia, eu ligava para o 190 e, no máximo em 15 minutos, a policia chegava e advertia. Se a pessoa insistisse no barulho, na segunda chamada o equipamento era levado.;

Jacqueline Silva
;De que adianta reclamar? Para quem? Agefis? Administração da cidade? PM? PC? Ibram? Ouvidorias? Já reclamei em todas! O som continua funcionando e eles zombando da nossa cara.;

Raimundo Junior
;Para que serve a lei seca, se os próprios postos de combustível vendem bebidas alcoólicas? Cadê a ANP ou a Câmara Legislativa, que deveriam criar uma lei proibindo vendas de bebidas em postos de combustível? Os postos estão virando verdadeiras boates a céu aberto.;

Nilson Moraes
"O problema do excesso de barulho é sério. Já acionei a PM pelo 190 para que pelo menos passasse pela minha rua. Pergunta se eu fui atendido? Temos que criar leis contra esse tipo de abuso. Tenho bebê e idoso em casa e não suporto os vidros vibrarem por causa de música alta.;

Alessandro Silva
;Isso é caso de polícia, existe uma lei federal sobre perturbação ao sossego público. Nossas autoridades não fazem nada para acabar com a impunidade neste país. Vão pagar um preço alto, esperem.;

Walter Quirino
;Boicote ao posto da 214 SuL é alternativa para demonstrar população unida e consciente.;

Sinara Assis
;Aqui em Planaltina, acontece o mesmo, tenho um vizinho que costuma ouvir música eletrônica. No último sábado, começou às 16h e foi até as 2h do domingo. Realmente vivemos num tempo em que não se respeita mais os direitos dos outros. E o pior: não há a quem recorrer.;

Gabrielle Goes
;Brasília está entregue a pichações, ao crack, à jogatina, à pirataria e seus afins etc. Não suporto mais ouvir os carros de som com promoções, é um absurdo. Fora os CDs piratas que infestam o centro de Ceilândia, cada um com um carrinho de som com sua música. E nos ônibus, celular virou rádio.;

Emerson Cesar
;Eu moro no Setor Sol Nascente (Ceilândia) e não sei mais o que faço com tanta falta de respeito aos moradores de nossa região. Aqui na área onde moro, são mais de sete bares próximos um do outro, e tudo o que eles fazem é barulho madrugada adentro nos fins de semana.;

Rosemary Martins de Oliveira
;Vim morar bem distante do centro, já pensando em viver tranquilamente, mas, infelizmente, ao lado do meu condomínio tem outro e muitos vizinhos barulhentos, que adoram tocar e bem alto. É como se eu morasse ao lado de um palco de rock. O que posso fazer?;

Wilton Rodrigues
"Será que agora que teve sangue rolando vai ser tomada alguma providência? Em Planaltina-DF, além dos vizinhos barulhentos, há os carros de passeios que fazem bastante barulho das 6h da manhã até de madrugada. E a polícia diz que não pode fazer nada!”

Fábio Araújo
;O posto da 310 Norte é um inferno. O lava a jato funciona das 7h às 20h, de segunda a segunda, e ainda por cima lá clonaram o meu cartão de débito. Já reclamamos até na Câmara Legislativa e nada;

Ernani Oliveira
;Moro perto de um posto da gasolina na QNL 30 de Taguatinga Norte e é um barulho infernal. O som ambiente instalado no posto parece mais uma discoteca; o lava a jato é ensurdecedor. Cadê a Agefis, cadê o Ibram? Vamos fiscalizar.;

Dates Leite
;Aqui na SQS 403 é um inferno à noite. O pior é que não temos mais onde e a quem reclamar; as leis são desrespeitadas e a Agefis só existe para a mídia e o governo.;

Thais Neuberger
;Fiz uma reclamação no 156 sobre um bar perto do edifício onde moro e hoje completam-se 80 dias sem resposta. Ficamos de mãos atadas, pois os órgãos não atendem conforme deveriam.;

Francisco Vieira
;Quanta ilusão. Os espancadores darão um quilo de arroz ou cumprirão medidas alternativas. No Brasil, nem estupro dá cadeia.;


Restrição durante o dia
Enquanto alguns postos de combustível permitem que clientes liguem som alto e bebam em frente às lojas de conveniência, outros restringem o uso de bebidas até mesmo antes das 22h. É o caso do posto da QI 15 do Lago Sul. ;Um ambiente familiar, de respeito com a vizinhança, é saudável para todo mundo;, ressalta o gerente, Isaías Gonçalves de Cassimiro.

Durante o dia, não se pode consumir bebidas na área do posto. Os funcionários também pedem que quem ligar o som alto nas proximidades do estabelecimento baixe o volume. ;É só falar com jeito;, ressalta o gerente. A dentista Vanessa Carbonel mora na QI 11 e tem problemas com o posto local. Por isso, ela só vai ao da QI 15. ;Eu acho positivo que os postos de gasolina controlem a venda de bebidas alcoólicas;, opinou.

Para o presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Combustíveis Automotivos e de Lubrificantes do Distrito Federal (Sinpetro-DF), José Carlos Ulhôa, a proibição da venda de bebidas alcoólicas nas lojas de conveniência dos postos das 22h às 6h do dia seguinte é uma ;hipocrisia;. Segundo ele, apesar disso, o sindicato repudia as algazarras e qualquer tipo de violência que ocorra dentro ou próximo dos estabelecimentos. ;Não queremos nada disso nas nossas lojas;, defendeu.

Ulhôa reforça a importância dos cartazes informativos nos estabelecimentos. ;Não sou polícia nem fiscal para dizer o que pode ou não. Se o indivíduo bebe do lado de fora da loja, o que eu posso fazer? Temos chamado a polícia, que vai imediatamente ao local e tira as pessoas de lá;, disse. (LC)

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação