Jornal Correio Braziliense

Cidades

Destino da greve da UnB divide professores

Ao longo dos 2 meses de greve da Universidade de Brasília (UnB) nunca houve assembleia de professores mais nervosa do que a de ontem, que contou com quase 300 docentes. Duas polêmicas acirraram os ânimos. A primeira se referiu à decisão de manter ou não a paralisação. A segunda foi uma nota assinada pela diretoria da Associação de Docentes da UnB (ADUnB) que pede o impeachment do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva; e as prisões do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo; do advogado-geral da União, Luís Adams; e do reitor da UnB, José Geraldo de Sousa Junior.

[SAIBAMAIS]O racha entre os professores foi demostrado em números. A votação sobre a continuidade da greve terminou com 135 votos a favor e 134 contra. A contagem foi contestada e, por quase uma hora, o tumulto e a discórdia reinaram no anfiteatro onde a assembleia foi realizada. Colegas foram acusados de votar duas vezes e muitos defenderam nova contagem de votos. Por fim, a sugestão do professor do Departamento de Sociologia Sadi Dal Rosso foi acatada por maioria e a assembleia que definirá se a UnB abre ou não seus portões e valida o semestre letivo foi remarcada para segunda-feira. "Até lá, teremos novos fatos. Temos de encontrar um caminho de negociação satisfatório que resulte em uma saída unificada para a greve", ponderou Dal Rosso.

A distensão entre os professores se intensificou no fim de abril, quando o pagamento da Unidade de Referência de Preços (URP) foi garantido ao corpo docente. Apesar das garantias do Ministério do Planejamento e do parecer favorável da AGU, no pagamento de abril 125 professores ficaram sem a URP, que corresponde a 26,05% dos salários. Parte dos sindicalizados acredita que o objetivo da greve - forçar o governo a cumprir a decisão do Supremo Tribunal Federal que determina o pagamento da parcela - foi atingido. "A greve serviu para pressionar pelo cumprimento das decisões judiciais, o que já está acontecendo", defendeu o professor do Instituto de Química Ricardo Bastos.

Uma outra corrente acredita que o movimento dos técnicos, que ainda tentam garantir a URP, será enfraquecido com a retirada dos professores. "Se sairmos agora, é como se estivéssemos dizendo ;enfraquecemos no primeiro rugido do leão; e perderíamos todas as possibilidades que ainda temos de impedir o corte salarial", argumentou Rodrigo Dantas, vice-presidente do Sindicato Nacional de Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes).

Nota polêmica

Os professores receberam no início da assembleia uma nota assinada pela diretoria do sindicato da categoria que informa que a ADUnB está elaborando um processo jurídico para ingressar no Supremo Tribunal Federal com ações contra o presidente Lula e outros integrantes do go-verno federalA iniciativa foi motivo de chacota e de indignação por parte dos professores. "Isso não representa os professores. Essa nota foi assinada exclusivamente pela diretoria do sindicato", disse Dioney Gomes, do Instituto de Letras.

Em nota, o Comando de Greve repudiou a iniciativa da ADUnB. "Embora reconheçamos o direito da Diretoria da ADUnB de se dirigir aos sindicalizados, o Comando de Greve rechaça veementemente o teor da última nota publicada por essa diretoria. Esse tipo de postura não contribui para o sucesso do nosso movimento, principalmente agora que o governo tenta questionar a legalidade de nossa greve." O ataque foi reforçado com a reação do sindicalista Rodrigo Dantas: "Essa atitude é golpista e reacionária vinda de uma diretoria que dominou e saqueou a UnB na sua passagem pela reitoria. O que eles querem é derrubar o José Geraldo. É uma postura sabotadora porque eles têm outros interesses que não a integridade da universidade".

Governo dá ultimato

Líderes sindicais dos servidores se encontraram ontem com o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, e com os representantes da Presidência da República e do Ministério do Planejamento para tentar negociar uma solução para a greve. Segundo Mauro Mendes, dirigente do Sindicato dos Trabalhadores da Fundação UnB (Sintfub), a atitude do governo foi de intimação para que o funcionários técnico-administrativos acabem imediatamente a paralisação. "A condição imposta para a continuidade das negociações é que a greve termine. Também teríamos que devolver a URP", explica. A assessoria jurídica do Sintfub pretende ir ao STF para obter liminar semelhante à dos docentes e garantir a URP.

O sindicato tem até terça-feira para descruzar os braços. Caso contrário, a AGU pedirá à Justiça a ilegalidade da greve, com base em jurisprudência firmada pelo STF na aplicação da Lei n; 7.783, durante uma paralisação dos advogados da AGU. Se a Justiça decidir pela ilegalidade, os salários dos servidores e mesmo dos docentes podem ser integralmente cortado. "Isso é muito grave e enfraquece o movimento", lamentou Mendes.

Esclarecimentos

Em nota, o vice-presidente do Andes, Rodrigo Dantas, esclareceu o conteúdo das declarações dadas à reportagem na sexta-feira (7/5), sobre a nota assinada pela diretoria da ADUnB:

"Essa atitude é golpista e reacionária, vinda de uma diretoria que se identifica e se articula politicamente com o grupo que levou a UnB às páginas policiais dos jornais em sua passagem pela reitoria, conforme se pode verificar nos relatórios da CGU, do MP, do TCU e da PF. O que eles querem na verdade é derrubar o José Geraldo. É uma postura sabotadora do nosso movimento, que divide os docentes da comunidade universitária e nada contribui para a vitória de nossa greve", retifica Dantas.