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'O encantador de cavalos' vem a Brasília e fala sobre equoterapia

Na cidade para um show relâmpago, Monty Roberts, fala da técnica desenvolvida pela Associação Nacional de Equoterapia. Ele destaca importante técnica que permite grandes progressos no tratamento de crianças portadoras de necessidades especiais

O pequeno Gabriel de Souza Miguens, 6 anos, parece voar quando monta um cavalo. O garoto abre os braços, fecha os olhos, gargalha e, como se demonstrasse total controle sobre o animal, faz um sinal de ;positivo; à plateia que o assiste. Para ele, não existe momento mais sublime do que o ato de cavalgar. Gabriel, que é portador de síndrome de Down, tem no contato com cavalos uma sensível melhora suas funções cognitivas.

A mãe, Célia Rosane de Souza, 43, ao descobrir que o menino nascera com a alteração genética, procurou todo o tipo de ajuda para que o filho não ficasse debilitado. Após apostar caro em métodos que acabaram fazendo Gabriel evoluir pouco, Célia descobriu a equoterapia(1), um processo que auxilia no desenvolvimento do equilíbrio, postura e coordenação motora de pessoas com necessidades especiais.

Foi na Associação Nacional de Equoterapia (Ande), com sede na Granja do Torto, que Gabriel, ainda aos 2 anos, teve seu primeiro contato com os cavalos. Em poucos dias, a mãe já sentiu que o comportamento dele havia mudado para melhor. ;Eu fiquei extremamente feliz porque os resultados foram quase imediatos. Ele melhorou sob todos os aspectos: concentração, aprendizado e equilíbrio. Sem dúvida nenhuma, é um método que merece ser respeitado e estendido a mais crianças.;

A Ande, que é uma entidade filantrópica, completa esta semana 21 anos. A instituição se mantém graças a doações de pessoas que se sensibilizam com o projeto de equoterapia ; atividade que atende, hoje, a mais de 200 crianças com deficiência. O número é bem maior do que o registrado nos primeiros anos de sua fundação, mas a estrutura do local ainda está longe de atender a demanda de quase 200 mães que esperam a oportunidade de inserir seus filhos no programa.

Para comemorar a data em grande estilo, a entidade convidou para os festejos um dos maiores especialistas no assunto: Monty Roberts(2), conhecido mundialmente como ;o encantador de cavalos.; O americano é famoso por domar equinos sem o uso da violência. Chamado de louco por alguns, criou uma técnica chamada join-up (em tradução livre, equivale a juntar-se), que consiste em se comunicar com os animais por meio da linguagem deles.

Segurança
Roberts se apresentará amanhã na Granja do Torto, na sede da Ande, próximo ao Parque de Exposições. Toda a arrecadação com ingressos será revertida para ações institucionais da entidade, como a cobertura de uma pista de equoterapia. Para o ;encantador de cavalos;, trabalhos como esse devem ser valorizados e expandidos. ;É uma iniciativa muito interessante e mostra que o Brasil está no rumo certo quando usa o cavalo para promover ações dessa natureza. O Brasil é um líder da América do Sul e medidas assim só o fazem evoluir ainda mais;, disse ele, em entrevista coletiva realizada ontem, após uma breve apresentação de montaria.

Bem-humorado, Roberts deu dicas de como os cavalos devem ser tratados quando são usados para fins terapêuticos. ;A primeira coisa que devemos observar é se ele (o cavalo) passa segurança. Eles devem ser calmos, bem domados. Outra coisa é evitar dar comida na boca do cavalo, principalmente quando ele é mais novo. Ele pode ter um comportamento agressivo;, recomendou.

Júlia Prachedes, 11 anos, assistia vislumbrada à performance de Roberts na arena montada para a prática da equoterapia. A menina nasceu com uma doença rara: a síndrome de Rubinstein, que deixa a criança com baixa estatura, nariz pontiagudo e orelhas deformadas, entre outras anomalias. Com idade mental de cinco anos, Júlia também integra o projeto da Ande. A mãe da garota, Isabel Cristina Prachedes, 43, orgulhosa, registrava com uma câmera todos os momentos da filha em cima do cavalo, apelidado de ;Tronco;.

Isabel conta que esperou quatro anos para conseguir inserir Júlia na equoterapia, mas garante que a espera rendeu bons frutos: ;Valeu a pena, porque os resultados são fantásticos. Minha filha, hoje, consegue dormir mais tranquila, está menos ansiosa e o seu raciocínio está bastante avançado. Ela gosta tanto de vir para cá que eu nem preciso chamá-la. Se for para estar aqui às 6h, ela vai me acordar. Isso aqui é um presente para mim e para minha filha;.

Um dos fundadores da Ande, o coronel aposentado Lélio de Castro Cirilo aposta que a equitação é um dos métodos mais eficientes para a reabilitação de algumas doenças. Ele só lamenta não poder assistir mais crianças naquele espaço. ;Temos uma fila enorme de gente querendo entrar no projeto, pois existe comprovação da aplicação do método como resultado positivo. Lutamos pela causa da equoterapia porque ela traz retorno, mas nossa intenção é expandir e, no momento, não podemos por carências financeiras e estruturais;, ressalta Lélio. Em tempo, ele avisa: ;Temos um número pequeno de cavalos. Também necessitamos de alguns móveis e de ajuda financeira para montarmos uma estrutura capaz de contemplar um número maior de crianças;.

1 - Estímulo ideal
A equoterapia foi reconhecida como método terapêutico em 1997 pela Sociedade Brasileira de Medicina Física e Reabilitacional e pelo Concelho Federal de Medicina (CFM). Na parte física, o praticante é levado a acompanhar os movimentos do cavalo, tendo de manter o equilíbrio e a coordenação para movimentar simultaneamente tronco, braços, ombros, cabeça e o restante do corpo, dentro de seus limites. O movimento tridimensional do cavalo provoca um deslocamento do centro gravitacional do paciente, desenvolvendo o equilíbrio, respiração, postura e coordenação, estimulando os músculos e a circulação sanguínea.

2 - Interação com o animal
Monty Roberts desenvolveu a técnica de join-up observando como os cavalos selvagens se comunicam entre si.
Join-up (juntar-se) consiste em comunicar-se com o cavalo em seu próprio ;idioma;, convencendo o animal a aceitar o homem como seu líder de forma natural, sem o uso da violência. Roberts é filho de um homem rude cujos métodos de tratar com cavalos eram convencionais na época, ou seja, cruéis. Após ter conseguido domar um cavalo em apenas três dias, Roberts resolveu provar ao mundo que existem maneiras de se controlar cavalos em pouco tempo sem agredi-los.

Colabore
Quem quiser ajudar na causa, tanto com doações financeiras quanto com móveis ou cavalos, deve ligar no telefone: 3468-7092.

"É uma iniciativa muito interessante e mostra que o Brasil está no rumo certo quando usa o cavalo para promover ações dessa natureza"
Monty Roberts, ;o encantador de cavalos;

O número
200

Número de crianças
especiais atendidas na Ande. Outras 210 estão na fila

O show
A apresentação de Monty Roberts, ;o encantador de cavalos;, será amanhã, às 20h, na sede da Ande, na Granja do Torto. Informações sobre os ingressos podem ser obtidas pelo endereço eletrônico: www.equoterapia.com.br.