Auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) descobriu que servidores e juízes do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) recebem, indevidamente, vantagens pessoais incorporadas ao salário ou se beneficiam de pagamentos de quintos/décimos corrigidos em desacordo com a lei. As irregularidades identificadas na área de recursos humanos do órgão são resultado de investigações feitas entre janeiro de 2008 e fevereiro de 2009.
O relatório produzido a partir de análises dos auditores do TCU aponta desvios na gestão de pessoal que foram se agravando ao longo dos anos. Os técnicos identificaram, por exemplo, a cessão irregular de servidores para reforçar o quadro de órgãos públicos em outros estados, concessões de aposentadorias a magistrados que não respeitaram normas e legislações específicas, além de gratificações que vinham sendo pagas sem o devido respaldo jurídico. Parte dos desvios foi corrigida, conforme reconhece o próprio TCU e como informou o TJDF (leia matéria abaixo). Outros, no entanto, ainda precisam ser sanados.
Os técnicos do TCU encontraram 116 funcionários do TJ com remunerações acima do teto do funcionalismo. Na época da apuração, o valor máximo do salário de um trabalhador do setor público era R$ 24.500. Atualmente, esse limite está em R$ 26.723,13 ; montante definido pela Constituição como sendo o subsídio pago aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). A quantidade de supersalários surpreendeu os auditores e os gastos indevidos com quintos/décimos também: nas contas do TCU, o desembolso anual para esse fim chega a R$ 25 milhões.
Boa parte dos benefícios classificados pelo TCU como irregulares está sustentada por mandados de segurança concedidos nos últimos 20 anos. Os auditores contestam essas garantias e apontam falhas no sistema que acabaram camuflando jurisprudências que poderiam ter evitado abusos. O texto completo que lista todas as irregularidades encontradas no TJ foi votado pelo plenário do TCU na última semana de março e ratificado na segunda-feira passada.
Sem multas
Os ministros que participaram da sessão reconheceram que o Tribunal de Justiça do DF tem se esforçado para solucionar os problemas, por isso decidiram não aplicar multas aos atuais administradores. Ainda assim, o relatório final aprovado pelo TCU determina a adoção de medidas urgentes. O TJ terá de fazer valer as regras que dizem respeito à cessão de servidores, além de instaurar uma tomada de contas especial para apurar e punir os responsáveis por eventuais danos ao erário. O TCU determina que os valores pagos a título de vantagens pessoais sejam revistos, que os atos que oficializaram reajustes ao arrepio da lei caiam e que por vias administrativas o TJ promova a cobrança dos valores recebidos pelos servidores indevidamente.
No caso dos funcionários que ganham salários acima do teto do funcionalismo, o TCU já comunicou e o TJ terá de regularizar os pagamentos o mais rápido possível observando as orientações baixadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Há também recomendações que envolvem a jornada de trabalho de algumas categorias profissionais que fazem parte do quadro de funcionários.
Colaborou Samanta Sallum
MEMÓRIA
CNJ apontou problemas
Com base num relatório que apontava ;desempenho insatisfatório; no trabalho dos desembargadores, o Conselho Nacional de Justiça rejeitou, em janeiro último, o pedido do TJDFT de aumento do número de membros da Corte. Inspeção da Corregedoria Nacional de Justiça no Tribunal apontou algumas irregularidades e deficiências de procedimento. O CNJ avalia que os recursos recebidos pelo TJDFT, que tem o sexto maior orçamento dos tribunais de Justiça do país, não se refletem em eficiência. O mesmo ocorre em relação ao número de servidores. Enquanto a média nacional é de 114 por 100 mil habitantes, no TJDFT é de 272.
O diagnóstico foi a resposta que o TJDFT recebeu do CNJ ao pedido de criação de 50 cargos (45 para desembargadores e 45 comissionados para atender à estrutura dos futuros gabinetes). Um projeto de lei tinha sido encaminhado ao Congresso Nacional para aumentar o quadro do Judiciário no DF. Mas, antes de ir a plenário, é preciso um parecer do conselho. A Corte do DF, porém, entrou na lista dos 10 tribunais que tiveram melhor desempenho no cumprimento das metas estabelecidas pelo CNJ em 2009.
Providências em andamento
Apesar de ter se justificado à exaustão ao Tribunal de Contas da União (TCU) durante o processo de auditoria e apresentado documentos que justificam as decisões tomadas, o Tribunal de Justiça do DF informou que vai acatar as determinações do órgão de controle. Providências que já vinham sendo tomadas serão reforçadas, enquanto que outras complementares deverão ser desencadeadas nos próximos meses.
Em nota enviada ao Correio, o TJ diz que ;o atual presidente, desembargador Nívio Gonçalves, estava pagando os magistrados e servidores os quintos, graças a decisões judiciais com trânsito em julgado, como faziam os seu antecessores;. De acordo com o comunicado, o entendimento do tribunal nesse caso está em linha com manifestações do STF. ;Mesmo assim, o presidente do TJDFT, cumprindo determinação do TCU, já cientificou aos magistrados e servidores que suspenderá os referidos pagamentos;, reforça o documento.
A fiscalização feita pelo TCU em órgãos do Poder Judiciário vem se intensificando nos últimos anos. A ação, porém, é controversa. Não raro, interpretações dos auditores se chocam com as do CNJ e dos próprios tribunais investigados. Há um esforço conjunto para que todos afinem os procedimentos, mas esse debate ainda é embrionário. (LP)