Jornal Correio Braziliense

Cidades

Alunos de Planaltina transformam bambu em cofres naturais

Alunos do Centro de Ensino Fundamental Juscelino Kubitschek criam cofre com os talos da planta, aprendem a economizar e entendem a disciplina. O resultado atrai os pais

A matemática dos bancos de escola tem a fama de ser uma disciplina difícil, por envolver árduos cálculos e raciocínios, e abstrata, já que muitas vezes é ensinada às crianças e adolescentes de forma dissociada da realidade que os cerca. No Centro de Ensino Fundamental Juscelino Kubitschek (CEF JK), que fica no condomínio Mestre D;Armas, em Planaltina, o professor Nilson Carlos dos Santos, 38 anos, conseguiu subverter esses conceitos entre seus alunos. Para isso, usou um material bastante simples: o bambu, abundante na chácara onde mora na região. Cilíndricos, selados nas extremidades e ocos por dentro, os talos da planta podem ser facilmente transformados em cofres naturais. Para isso, basta fazer, no topo, uma abertura grande o suficiente para depositar moedas. Trabalhados dessa forma, os recipientes foram entregues às crianças do CEF JK, para que depositassem suas economias. A partir daí, operações de adição, subtração e multiplicação deixaram de ser apenas de números no papel. Começaram a corresponder a algo concreto, a uma empreitada pessoal de cada aluno.

O projeto, batizado de Bambu Real, foi implantado em meados de julho do ano passado por Nilson dos Santos, que leciona ciências naturais além de matemática, e por um colega que deixou a escola, o pedagogo Alexsandro Domingues. Na ocasião, alunos de duas turmas de terceira série passaram meses depositando pequenas quantias nos bambus, com o apoio dos familiares. Uma turma fez a experiência por seis meses. A outra começou mais tarde, em outubro de 2009, e participou por três meses. Enquanto faziam poupança, as crianças discutiam em sala de aula sobre o destino do dinheiro e recebiam noções de economia doméstica.

;Falamos sobre valor da conta de água, da conta de luz. Cada um teve que pesquisar o valor das contas da sua casa. Comparamos, discutimos sobre maneiras de economizar. As crianças ensinaram aos pais;, conta o professor Nilson dos Santos. Ele diz que houve um bom envolvimento das famílias. Além de contribuírem para acumular receita nos cofrinhos de bambu, pais e mães aceitaram entrar na discussão acerca de como cortar gastos no lar e, especialmente, evitar o desperdício de recursos como água e energia. Os estudantes também faziam planos sobre como aplicar o dinheiro do cofrinho quando terminasse o período letivo, data marcada para eles serem abertos. ;Discutimos, além da economia doméstica, a economia sustentável. Foi muito bem aceito. Muitas mães vieram me procurar querendo cofrinhos para os outros filhos, que não estavam na terceira série;, afirma Nilson.

Nos últimos dias de aula, os cofres foram serrados e o montante reunido por cada aluno, contabilizado. Eles tiveram que escrever um relatório sobre como tinham obtido suas economias e sobre como pretendiam utilizá-las, levando em conta as noções de consumo responsável e de não desperdício adquiridas em sala de aula. O dinheiro foi levado para casa.


Moderação até mesmo nas férias
As economias de muitas crianças sobreviveram ao período de férias, mostrando que a didática dos cofrinhos de bambu atingiu seus objetivos. Danielle Nunes, 9 anos, integrante da turma de terceira série que aderiu tardiamente ao projeto, acumulou R$ 25 em três meses. Gastou R$ 4 durante as festas de fim de ano, e iniciou o ano letivo de 2010 dona de um capital de R$ 21. O motivo do gasto? ;Saí com uma amiga da minha mãe e ela me comprou uma coisa para comer. Quando eu quis pagar, ela disse que era presente, mas eu dei o dinheiro mesmo assim. Aí, minha mãe disse para ela aceitar, porque era projeto da escola;, conta, mostrando-se uma devedora conscienciosa. Agora, Danielle pretende continuar poupando até ter R$ 100, quantia mínima necessária para abrir uma conta na Caixa Econômica Federal. ;Conversei com meu pai, quero guardar o dinheiro e ganhar um Poupançudo;, conta, referindo-se aos bonequinhos promocionais dados como brinde pela instituição financeira.

David Cardoso Caetano, 9 anos, teve total apoio do pai, da mãe e da irmã mais velha e conseguiu acumular R$ 200. Destes, restaram R$ 58. Os gastos feitos foram todos solidários. O menino destinou R$ 5 para o irmão mais novo comprar um lanche, R$ 20 para compras do salão de beleza da mãe e o restante como ajuda de custo para a irmã pagar a faculdade. ;Eles vão me ajudar de novo e este ano vou guardar. Só gasto se for importante;, afirma o garoto.

Danielle e David continuarão a ter o apoio da escola para levar seus planos adiante. Agora alunos da quarta série do ensino fundamental, eles voltaram a ganhar cofrinhos de bambu. É que o professor Nilson dos Santos conseguiu expandir o projeto. Este ano, 300 alunos das três turmas de terceira e três de quarta série vão participar. ;Conversei com a direção e com os outros professores, e vamos trabalhar em conjunto;, afirma. O educador quer ainda levar a experiência para o Centro Educacional Pompílio, também em Mestre D;Armas, onde dá aulas para jovens e adultos à noite. ;Muitos dos meus alunos da oitava série lá trabalham, pagam contas. Para eles, será ainda mais complexo e interessante;, diz.

Além disso, este ano, o Projeto Bambu Real terá um viés adicional no CEF JK: o das diversas maneiras de aproveitamento da planta. ;Já começamos a discutir isso no ano passado, no embalo da questão da economia sustentável, mas vamos aprofundar. Em 2009, fizemos porta-lápis com os talos de bambu que não serviam para cofres. Este ano, peguei a serragem que sobrou do corte lá na chácara e misturei com água e cola, para fazer papel. Usaremos tábuas para prensar e o mimeógrafo daqui da escola.; Nilson ressalta que o bambu, por ser da família das gramíneas, cresce de novo espontaneamente, sem precisar ser replantado.

As crianças e o dinheiro


A maneira como as crianças se relacionam com o dinheiro vem da observação da dinâmica doméstica. Procure dar o exemplo de consumo responsável.

Desde cedo, deve ser mostrada a diferença entre o consumo por necessidade e aquele para satisfazer um desejo.

Incluir a criança no planejamento econômico familiar ajuda na aquisição de noções básicas de economia. A organização de uma festinha de aniversário ou o planejamento de uma viagem de férias são boas ocasiões para chamá-la a participar.

Se você decidiu que é a hora de dar dinheiro para seu filho administrar, o ideal é começar com semanadas em lugar de mesadas. Ele vai saber administrar melhor a quantia em um período menor de tempo. A quantia deve ser bem baixa no início.

Especialistas apontam 7 anos como a idade para dar as primeiras quantias e ter conversas com a criança sobre o valor do dinheiro.

Os 11 anos são a idade em que a compreensão da criança já permite a ela administrar uma mesada. Mas não abandone as conversas e acompanhe como ela gasta seu capital, em especial durante a adolescência.