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Cidades

Microcrédito soma R$ 35,7 milhões

Adquirir independência financeira por meio de um negócio próprio, mesmo que pequeno, é o sonho de muitas pessoas. Levantar fundos para começar o empreendimento é a dificuldade da maioria delas. No Distrito Federal, o microcrédito orientado, modalidade que garante empréstimos de pequena monta a juros baixos, com uso monitorado dos recursos, tem sido bem-sucedido em chegar às mãos de potenciais empreendedores.

O programa Banco do Povo(1), vinculado à Secretaria de Trabalho do DF que concede crédito a partir de R$ 1 mil a comerciantes autônomos, artesãos e microempresas formais e informais, emprestou no ano passado R$ 15.745.550 a 18.756 pessoas. O Banco do Nordeste e a Organização de Interesse Público da Sociedade Civil (Oscip) Providência, que também atuam no DF, comunicaram ao Ministério do Trabalho a movimentação de R$ 20 milhões em operações de microcrédito no mesmo período. No total, os microempréstimos somaram R$ 35,7 milhões em 2009.

Os programas Banco do Povo, do governo do DF, Crediamigo, do Banco do Nordeste, e as linhas de microcrédito da Providência são as três principais vias de acesso ao crédito para o pequeno empreendedor no DF, recomendadas pela representação local do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae-DF). ;O Sebrae faz um trabalho de preparar a empresa para o crédito. O empreendedor nos busca para orientação, vemos como está a situação dele e mostramos quais são as opções para ele tomar o empréstimo. Se for o primeiro crédito, damos um curso de capacitação de gestão;, explica Marilene Almeida, consultora do Sebrae-DF.

Fonte
O Banco do Povo opera com recursos do Fundo de Geração de Emprego e Renda (Funger), alimentado com recursos do DF, provindos de dotações orçamentárias e aplicações financeiras. O programa Crediamigo e a Providência são registrados no Ministério do Trabalho. Por isso, podem ter acesso a recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e ao tributo de 2% do compulsório de depósito bancário. A Providência trabalha ainda com repasses do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal, além de usar a receita de aplicações próprias.

Max Coelho, coordenador do Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado do Ministério do Trabalho, explica que os programas de microcrédito das administrações de unidades da Federação e municípios não recebem os recursos do FAT e do compulsório previstos na Lei n;11.110/2005, que regula os empréstimos para pequenos negócios, por serem parte das políticas públicas das gestões locais. ;Um programa de um governo estadual só pode integrar a nossa rede se criar uma entidade independente, uma Oscip, por exemplo. O que não quer dizer que essas iniciativas não sejam válidas, parceiras;, diz.

Para Coelho, o microcrédito tem avançado no DF, mas não o suficiente para atender à necessidade dos micro e pequenos empreendedores locais. ;Ainda existe carência. São pouquíssimas organizações. O volume movimentado no ano passado foi modesto;, diz ele. No Brasil, em 2009, circularam R$ 2,2 bilhões destinados ao microcrédito.

Max Coelho acrescenta que no país também existe um vácuo a ser preenchido. ;A necessidade desse modelo de crédito, não contemplada pelos bancos, foi sendo suprida por uma rede de organizações não governamentais e cooperativas. Só mais recentemente bancos públicos e privados têm se aproximado da questão. Real-Santander e Itaú-Unibanco são exemplos de bancos que constituíram organizações para oferecer microcrédito;, afirma.

Acompanhamento
Mais do que um empréstimo de pequeno valor, com juros mais baixos do que os do mercado, o microcrédito tem a vantagem de abarcar uma parcela da população que fica à margem do setor bancário. Por não poderem pleitear valores de grande monta, ou oferecer garantias de pagamento, potenciais empreendedores ficam sem capital de giro. Derrubando tais barreiras graças à rapidez, a exigências simples para liberação do dinheiro e a opções como a do aval solidário, em que vários microempreendedores se reúnem para serem os fiadores uns dos outros, o microempréstipode chegar até mesmo ao trabalhador informal e alçá-lo à formalidade.

Um outro diferencial do microcrédito produtivo é a presença de agentes, que têm a função de verificar se o tomador de empréstimo de fato toca algum negócio, de avaliar a saúde financeira do empreendimento e de dar orientações ao microinvestidor. O Banco do Povo, da Secretaria de Trabalho, por exemplo, trabalha atualmente com 15 agentes e promete aumentar o número para 56 até maio deste ano.

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Ex-Creditrabalho
O programa Banco do Povo é o antigo Creditrabalho, que funcionou na Secretaria de Trabalho do DF por 15 anos e foi rebatizado há cerca de dois. Uma portaria publicada no Diário Oficial do DF de ontem fortaleceu o programa, ao vinculá-lo às diretrizes da Lei Orgânica do DF e da Lei Complementarn; 704/05, que determina a criação de políticas para combate ao desemprego e para a erradicação do trabalho informal.

Do isopor aos caminhões refrigerados
Arildo Furtado de Araújo, 50 anos, sempre levou jeito para vendas. Tanto que, até o início dos anos 2000, trabalhou com representante comercial da Arisco no Distrito Federal. Perdeu o emprego quando a empresa desapareceu na fusão com a Unilever. Após algum tempo distribuindo currículos sem sucesso, seguindo a dica de um amigo, decidiu entrar, por sua conta e risco, no mercado de venda de polpas de fruta congeladas no atacado.

;Me disseram que o mercado tinha potencial. Comecei a trazer do Rio Grande do Sul, da Bahia e de Pernambuco. As encomendas chegavam de ônibus, em caixas de isopor, e eu revendia para bares, restaurantes e lanchonetes;, conta ele, que desde o início teve a ajuda da esposa, a dona de casa Edna Lerback de Araújo, 42 anos.

Como o investimento começou a pesar no bolso, Edna e Arildo procuraram a Secretaria de Trabalho e fizeram o primeiro empréstimo, em 2003, no valor de R$ 3 mil. O segundo foi de R$ 6 mil, o terceiro de R$ 9 mil e o último, há alguns anos, de R$ 12 mil. Hoje, o negócio já deslancha sozinho. O casal, que trazia de outros estados 400 quilos de polpa por semana, hoje traz 10 mil quilos em caminhões refrigerados, fretados via agenciador. Também tem quatro funcionários e câmara refrigeradora própria. Eles não precisam mais pagar R$ 2,8 mil de aluguel para usar o refrigerador de um outro estabelecimento. ;O crédito foi fundamental para nos dar um fôlego;, diz Edna.

A artista plástica Thelma Regina de Miranda Passaglia, 58 anos, também deu o primeiro passo com um empréstimo modesto quando quis começar a comercializar seus vasos de cerâmica. Thelma, que vivia de aulas de artesanato, tomou R$ 5 mil junto à Secretaria de Trabalho. ;Eu precisava. Meu capital de giro era meu cheque especial;, brinca.

O segundo empréstimo já foi de R$ 10 mil. A artista plástica investiu em maquinário, funcionários, material e no aprendizado de novas técnicas. Hoje, além de cerâmica, produz espelho, porta-retratos e caixas estilizadas. Tem fábrica no Guará, marcenaria no Park Way, duas bancas na Feira da Torre e ainda vende no atacado. ;É super-rápido e fácil. O segredo é pagar direitinho. Então, eles vão aumentando seu limite;, ensina.