A menos de um mês de completar 50 anos, Brasília vive diante da ameaça de perder a autonomia política e ter a história marcada por uma intervenção federal. Caso os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) aceitem o pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), o DF seria a primeira unidade federativa do país a ser comandada por uma pessoa escolhida pelo presidente da República. Representantes do setor produtivo estão mobilizados para que isso não ocorra. Eles participam amanhã do protesto contra a intervenção encabeçado pela Ordem dos Advogados do Brasil no DF (OAB-DF). Segundo os empresários, uma eventual intervenção trará grande prejuízo à economia local e atingirá todos os brasilienses. A paralisação das obras do GDF e a demissão de trabalhadores são alguns dos prováveis reflexos.
Além de ser um atestado de incompetência para resolver os problemas advindos da crise política-administrativa que abalou o Executivo e o Legislativo locais, a intervenção federal pode trazer obstáculos para o andamento das obras de infraestrutura espalhadas pelas cidades. E, como consequência, prejuízos para o mercado imobiliário.
A tese é defendida pelo presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil no DF (Sinduscon), Elson Ribeiro Póvoa. ;A intervenção nesse momento é um golpe. Temos a Constituição e a nossa Lei Orgânica, que têm condições de resolver os problemas referentes à sucessão do cargo de governador. As leis estão vigentes e estão sendo respeitadas;, afirmou, dizendo que o Poder Judiciário está cumprindo o seu papel e separando o ;joio do trigo; nas investigações das denúncias de corrupção no DF. Póvoa salientou que, apesar de mensurar alguns possíveis efeitos da intervenção, a ;medida é imprevisível;. ;Dá para saber como ela começa, mas não como termina. Isso vai manchar o aniversário da cidade;, declarou.
O presidente da Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi-DF), Adalberto Valadão, é detalhista ao falar dos prejuízo ao DF decorrentes de uma suposta intervenção. ;O interventor deverá paralisar as obras para rever os contratos do governo. Imagina parar as obras do Noroeste, do Mangueiral, da Linha Verde? As vendas do setor imobiliário vão desacelerar e as pessoas vão ficar sem os empreendimentos, à espera das melhorias;, afirmou. Apesar de reconhecer a gravidade da crise política e de defender a apuração das denúncias do suposto esquema de pagamento de propina no DF, Valadão não apoia o pedido da PGR. ;O reflexo negativo atingirá a economia como um todo;, disse.
O atual processo de amadurecimento político vivido pela população do DF deveria ser repetido nas urnas em outubro, sugeriu o presidente do Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci-DF), Hermes Rodrigues Filho. ;A crise deve servir de lição para as pessoas saberem usar melhor o voto. Nós estamos passando por um problema que ninguém imaginaria que fosse acontecer;, ressaltou. A visão otimista do momento não é refletida no futuro do mercado imobiliário, caso haja a intervenção. ;A despensa de mão de obra das construções civis pode acarretar um efeito dominó no mercado. O peão vai deixar de comprar a televisão que a loja vai deixar de importar, e assim sucessivamente. O comércio deixa de vender e o processo de desenvolvimento da capital vai retrair;, explicou.
Efeitos sentidos
A crise política deflagrada pela Operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal (PF), em novembro teve reflexos negativos no primeiro bimestre deste ano no comércio do DF. De acordo com o presidente do Sindicato de Hotéis, Bares e Restaurantes do DF (Sindhobar), Clayton Machado, as vendas caíram de 30% a 35%. ;A queda tradicional de janeiro e fevereiro era de 10% a 15% inferior ao índice registrado nesse ano. A crise enclausurou as pessoas envolvidas direta ou indiretamente. Estão receosas de aparecer, ir a um restaurante, fazer um happy hour;, afirmou.
A baixa no movimento dos estabelecimentos, no entanto, deve piorar caso ocorra a intervenção federal, prevê Machado. ;A comunidade e o governo local serão prejudicados. Se as pessoas não saírem para gastar, a receita vai arrecadar menos. A forma inteligente é fazer com que as instituições continuem fortalecidas e que o Poder Judiciário mantenha o trabalho focado na apuração das denúncias. Não precisamos de intervenção;, defendeu.
No entendimento do presidente Sindicato do Comércio Varejista do DF (Sindivarejista), Antônio Augusto de Moraes, a intervenção federal é uma medida extrema que pode ser evitada. ;Nosso sistema permite a escolha de outras situações antes de apelar para a intervenção. Devem ser cumpridas as etapas do processo previsto em lei, e só no último caso seja escolhida a intervenção. Além de paralisar os investimentos que estão sendo feitos no DF, teria diminuição da renda e do consumo e também demissões;, afirmou. ;O ;efeito cascata; atingiria todos os setores da sociedade.;
"Além de paralisar os investimentos que estão sendo feitos no DF, teria diminuição da renda e do consumo, e também demissões"
Antônio Augusto de Moraes, presidente Sindicato do Comércio Varejista do DF
Agenda
Quando - Nesta quinta (25/3), às 16h
Onde - Representantes de pelo menos 54 entidades da sociedade civil se reunirão para dar um abraço simbólico no prédio do Supremo Tribunal Federal (STF)
O que - Além do abraço, será entregue ao presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, um manifesto contrário ao pedido de intervenção no DF.
Depoimentos // Por que sou contra a intervenção
;A intervenção federal seria um golpe contra a população do Distrito Federal e traria prejuízo incomensurável para a economia local. Um dos motivos de preocupação são as obras em execução na cidade, que poderiam ser paralisadas. O efeito se estenderia também para projetos licitados ou em processo de licitação. Esse ato deixaria, ainda, dúvidas sobre a realização de obras para a Copa de 2014, em Brasília, uma das 12 cidades-sede do evento. Atualmente, o setor da construção civil é responsável por 65 mil empregos diretos no Distrito Federal e há mais de duas mil obras públicas em andamento. É preciso manter o emprego desses profissionais e as construções que trarão enormes benefícios para a população, como a Linha Verde e várias obras de saneamento básico e infraestrutura. Entre as obras já licitadas ; com recursos federais e internacionais previstos para o início do trabalho ; estão o Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) e a construção do túnel do Balão do Aeroporto. O DF tem condições de superar essa crise política, sem paralisar a atividade econômica e com preservação da autonomia da unidade federativa. Prova disso é que a cidade não parou, mas está encontrando o caminho de superação dessa fase, com manutenção da ordem pública e dos serviços prestados à população;.
Elson Póvoa, presidente do Sindicato da Indústria de Construção Civil do DF (Sinduscon)
;A hipótese de uma intervenção no DF tem que ser descartada em respeito à Constituição, à Lei Orgânica e aos direitos individuais dos brasilienses. Já existe a visibilidade de uma eleição indireta para escolha do novo governador da capital. Sinal de que a legislação está sendo contemplada e que o Poder Judiciário está fazendo sua parte. Não há motivos para que ela ocorra. Todo o setor produtivo é contra. A sociedade é contra. Então, por que insistir com o pedido de intervenção? A comunidade em geral não pode pagar o alto preço da intervenção federal no DF. Será um verdadeiro caos. As obras vão parar. A economia vai desacelerar. Por causa da crise política, as vendas tiveram queda de 30 a 35% nas vendas no primeiro bimestre desse ano, índice 10% a 15% acima do normal no período. Imagina se houver a intervenção federal? O interventor vai paralisar tudo como se fosse um ;grande balanço;. Acredito que o momento em que vivemos é uma oportunidade para as pessoas repensarem sobre as questões da cidade, de uma forma global. A forma inteligente é fazer com que as instituições continuem fortalecidas e que o Judiciário continue participando de maneira focada;.
Clayton Machado, presidente do Sindicato de Hotéis,Bares e Restaurantes do DF (Sindhobar)