O Setor de Autarquias Sul (SAS) é uma das regiões com o trânsito mais caótico do Distrito Federal. Por conta do grande fluxo de veículos, os escassos estacionamentos públicos são disputados por milhares de motoristas. Quem não consegue uma vaga se vê obrigado a parar em fila dupla ou a ficar refém de flanelinhas. Um grupo seleto de servidores de alguns tribunais e ministérios, entretanto, não precisa enfrentar essa batalha diária. Eles têm à disposição espaços reservados, protegidos por cancelas e seguranças. Mas essas vagas privativas foram demarcadas em área pública. A maioria dos órgãos públicos que mantêm estacionamentos com guarita e acesso restrito não possui autorização para o fechamento da área. A Agência de Fiscalização do Distrito Federal promete notificar os responsáveis pelas vagas cercadas ilegalmente(1) para que o espaço seja liberado a todos.
A reportagem do Correio identificou oito áreas cercadas e isoladas por cancelas nas seis quadras do SAS. Segundo a Administração de Brasília, apenas um estacionamento de uso exclusivo dos órgãos públicos é regular: o da Caixa Econômica Federal, na Quadra 5. Nesse caso, as vagas privativas estão dentro da área do lote do edifício, não em espaço público. Nos demais, ou a área reservada é pública, ou o responsável não pediu autorização à administração regional para restringir o acesso ao local.
Na Quadra 3 do Setor de Autarquias Sul, toldos azuis sobre as vagas chamam a atenção dos motoristas. Enquanto dezenas de proprietários param seus carros em cima da calçada e ao longo do meio-fio, a maioria das vagas privativas fica vazia. O estacionamento é de Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e, de acordo com o GDF, a área está no terreno do instituto. Com isso, a restrição do acesso não seria ilegal. Mas o órgão foi notificado pela Agência de Fiscalização porque não tem autorização para colocar os toldos de cobertura, que não foram aprovados pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (Seduma). A assessoria de imprensa do INSS disse que a obra teria recebido o aval do GDF, mas o governo local contesta a informação.
Alguns seguranças chegam a ameaçar quem tenta passar pela guarita. Uma equipe do Correio encontrou aberta a cancela do estacionamento do Tribunal Regional Federal (TRF), na Quadra 2. Parou um carro descaracterizado no local e, pouco depois, quando deixava a área cercada, foi abordada pelo segurança, que ameaçou chamar a Polícia Militar. ;Essa área não é pública?;, questionou a reportagem. ;Pode até ser pública, mas é proibido entrar. Da próxima vez, não deixo vocês saírem e chamo a PM;, ameaçou o guarda responsável pelo estacionamento do TRF.
Arrombamentos
O Tribunal Regional Federal da 1; Região alegou que a presença de seguranças e a instalação da guarita foram uma medida para minimizar os riscos de assaltos e arrombamentos. De acordo com o TRF, são 190 vagas de uso privativo. ;É uma constante a ocorrência de arrombamentos de veículos, intimidações por parte de pedintes, entre outras ameaças. Embora a administração do TRF 1; Região tenha pedido a presença dos órgãos do GDF, no sentido de fazer ronda ou instalar um posto da PM, não houve atendimento;, diz a nota divulgada pelo TRF.
A assessoria de imprensa da Procuradoria Regional da República da 1; Região, na Quadra 5, afirmou que tem autorização para cercar as vagas contíguas ao edifício. A Procuradoria argumentou que o isolamento do espaço é importante porque os procuradores recebem ;muitas testemunhas e documentos importantes ao andamento de processos;. Mas a Administração de Brasília garantiu que não consta no Setor de Licenciamentos autorização para o cercamento da área pública ao lado do órgão jurídico.
No Superior Tribunal Militar, localizado na Praça dos Tribunais Superiores, o espaço público foi delimitado por piquetes de concreto. Os funcionários de alto escalão têm acesso à área, protegida por uma guarita e um segurança. A assessoria de imprensa do STM informou que o Tribunal está preocupado em regularizar a situação com o GDF, mas argumentou que o cercamento é comum diante da dificuldade em estacionar na região.
O estudante Marcelo Tagliari, 18 anos, não tem direito a vagas privativas e precisa rodar muito até encontrar um local para estacionar. Ele reclama dos privilégios concedidos aos servidores de alguns tribunais e ministérios. ;Acho isso errado. Os direitos deveriam ser os mesmos para todos;, afirma. ;Parar o carro aqui no Setor de Autarquias Sul é muito complicado. O ideal seria buscar soluções como fazer garagens subterrâneas, em vez de ficar cercando estacionamentos para algumas pessoas;, sugere o jovem.
1 - Punições previstas
Os órgãos que cercam áreas públicas sem o aval do governo local estão sujeitos a multa, notificação e até mesmo demolição da estrutura construída para isolar esses espaços. Para usar área pública, é preciso obter autorização na administração regional e pagar uma taxa de ocupação anual. Mas a Administração de Brasília informa que não dá aval para criação de vagas em espaço de uso coletivo.
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