Jornal Correio Braziliense

Cidades

Com suspeitas de fraudes e sem dinheiro em caixa, a Fácil não faz recarga dos cartões para os alunos desde terça-feira

Governo promete repassar valor a mais solicitado pela empresa hoje e faz auditoria para apurar o que está ocorrendo

Especial para o Correio

Indignação. Era o sentimento de pais e estudantes que procuraram ontem os postos de atendimento da Fácil, onde é possível conseguir o benefício do passe livre. Desde terça-feira, eles não conseguem recarregar os créditos dos cartões, uma situação que vai ser manter até segunda-feira próxima. O que significa que terão que bancar do próprio bolso as passagens até a escola. A Secretaria de Transportes garante que vai repassar, hoje, o dinheiro a mais para a recarga, mas o serviço só será normalizado no começo da próxima semana. O governo suspeita de fraude no sistema e já começou uma auditoria.

A recarga ainda não foi liberada porque o dinheiro mensal repassado à Fácil já acabou. Segundo a assessoria de comunicação da Secretaria de Transportes, a empresa de bilhetagem eletrônica enviou um relatório informando que os R$ 4,5 milhões depositados para esse mês foram creditados nas carteiras dos estudantes e não é possível atender as novas demandas. Porém, o pedido do adicional solicitado pela Fácil só chegou ontem à Secretaria de Fazenda, órgão responsável pela liberação do dinheiro. ;As coisas não são tão instantâneas. É preciso ver se tem dinheiro em caixa, analisar os recursos que já foram disponibilizados para, só depois, liberarmos essa quantia a mais;, explica André Clemente, secretário de Fazenda.

Porém, ele adianta que devido ao caráter social da demanda, serão liberados hoje R$ 2 milhões destinados à Fácil. Dessa forma, o dinheiro só estará na conta da empresa amanhã e, por isso, só na segunda-feira o serviço de recarga voltará ao normal. Enquanto isso, estudantes como Fábio Guarino, 23 anos, terão que pagar integralmente o transporte até a escola. ;Já não tem posto de recarga no Paranoá, por isso tenho que me deslocar até o Setor Comercial Sul, aí quando chego aqui descubro que vou ter que pagar passagem inteira;, queixa-se o aluno de fisioterapia, que vai desembolsar R$ 6 por dia até a normalização do sistema.

A despesa a mais no orçamento está preocupando a dona de casa Neri Teixeira Belém, 53 anos, e o zelador Raimundo Nonato dos Santos, 48. Ambos têm filhos que estudam longe de casa e terão gastos além do previsto. ;Era melhor pagar um terço da passagem e ter o benefício do que ter o direito à gratuidade e, no fim, ter que desembolsar a passagem inteira;, reclama Raimundo, que vai gastar, no mínimo, R$ 10 por dia. ;Minha filha já não foi para a escola hoje porque tava sem crédito;, conta Neri, que ficou ontem quatro horas na porta da Fácil de Taguatinga na expectativa de que o dinheiro saísse.

Cálculos não batem
Desde 13 de janeiro, quando a lei do passe livre foi publicada, os tropeços não param de acontecer. Já na primeira remessa que o DFTrans, órgão da Secretaria de Transportes, repassou à Fácil o dinheiro não foi suficiente. Estavam previstos R$ 4,4 milhões, que tiveram que ser acrescidos de mais R$ 2,8 milhões. Nesse mês, a situação não foi diferente e, novamente, os estudantes ficaram sem os serviços.

Segundo a lei, o crédito gratuito dos estudantes seria pré-pago pelo governo à empresa. Baseado nos 120 mil alunos que já utilizavam o serviço de um terço do passe estudantil, o GDF calculou que seriam gastos, em média, R$ 4,5 milhões por mês. Porém, segundo a assessoria da Fácil, existem 97 mil estudantes cadastrados e os gastos nos dois primeiros meses de gratuidade estouraram em R$ 2 milhões.

Com suspeitas de fraudes ; desde pessoas que não estão estudando até deficientes físicos que estão pegando o benefício estudantil e de portadores de necessidades especiais ao mesmo tempo ; técnicos da Secretaria de Transportes estão, desde terça-feira, promovendo uma auditoria na Fácil. Ontem, o governo decidiu abrir frentes de ação para a resolução definitiva do problema, como a continuação da auditoria, ajuste no orçamento e até licitação do sistema de bilhetagem automática que irá substituir a empresa Fácil.

Passível de multa
O Procon-DF foi acionado sobre o caso e comunicou que a Fácil pode ser multada em até R$ 3 milhões por descumprir o tempo de espera nas filas e por não estar com o serviço disponível. ;Essa situação é inadmissível, todo início de período letivo temos problemas com a Fácil;, diz Jarcy Burdal, gerente de fiscalização do Procon-DF. Os serviços de telefone da empresa também ficaram congestionados durante todo o dia e a compra de crédito pela internet não era possível.

; O que diz a lei

A Lei n; 4.462 entrou em vigor no dia 13 de janeiro de 2010. Ela garante a gratuidade de transporte coletivo ; ônibus, metrô, micro-ônibus e veículo leve sobre trilhos ; a estudantes dos ensinos básico, fundamental, médio e superior de escolas públicas e particulares do Distrito Federal. Os alunos de cursos técnicos, profissionalizantes e os teológicos também têm direito ao benefício, desde que tenham mais de 200 horas. Porém, a lei não diz se essas 200 horas devem ser por mês, por ano ou por curso. A gratuidade será custeada pela Secretaria de Fazenda do DF, que pagará antecipadamente o valor mensal à empresa responsável, no caso, a Fácil.