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Depoimentos e fitas sinalizam que suposto esquema de corrupção teve início na gestão do Roriz

A colaboração de Durval Barbosa na investigação da Operação Caixa de Pandora tirou do caminho de Joaquim Roriz um forte adversário nas próximas eleições. A força das denúncias de corrupção na administração de José Roberto Arruda, no entanto, virou um transtorno para a campanha do político que governou o Distrito Federal quatro vezes, tendo Durval a seu lado durante quase oito anos. A confissão do aliado de Roriz ao Ministério Público e à Polícia Federal de que arrecadava recursos com empresas prestadoras de serviços para abastecer o governador Arruda e a base aliada é um indício de que o suposto esquema não começou agora.

Nos primeiros depoimentos, Durval Barbosa se restringiu a contar detalhes sobre pagamentos de propinas a integrantes do atual governo, em contratos da gestão Arruda. Mas as fitas que ele mesmo divulgou não deixam dúvidas: existem evidências claras de que a corrupção começou na gestão anterior. Consideradas as imagens mais fortes do escândalo da Caixa de Pandora, as gravações de Arruda, do ex-presidente da Câmara Leonardo Prudente (sem partido), da deputada Eurides Brito (PMDB) e do ex-distrital Júnior Brunelli (PSC) ocorreram no governo anterior. Por isso, a meta dos investigadores agora é conseguir detalhes de irregularidades praticadas por intermediários de Roriz entre 1999 e 2006.

Durval Barbosa e Roriz são alvos de duas ações penais em que se questiona o mesmo assunto tratado agora: corrupção envolvendo empresas de informática que prestam serviços ao governo. Num dos processos, o Ministério Público Federal sustenta que dinheiro da empresa Linknet financiou a compra de urnas eletrônicas usadas para treinar o eleitor a votar em Roriz. Na outra, a acusação é de desvio de R$ 28 milhões das empresas Linknet e Adler para a campanha à reeleição de Roriz em 2002. Curiosamente, o advogado de Roriz na época era o mesmo Nélio Machado que agora defende Arruda.

Com a mesma contundência, ele tentou em 2003 desqualificar as denúncias envolvendo seu cliente. Em 2002, Roriz sofreu turbulências políticas fortes e até o presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou a declarar publicamente acreditar que ele poderia perder o mandato para o petista Geraldo Magela devido a denúncias de uso da máquina na campanha. ;Na ocasião, não conhecia a figura nefasta, nebulosa do Durval;, afirma Nélio Machado, que cuidou do andamento da ação penal contra Roriz no Superior Tribunal de Justiça (STJ). O caso não foi para a frente porque a Câmara Legislativa não deu autorização para a abertura de processo contra Roriz.

As ações penais agora tramitam na 1; Vara Criminal de Brasília, já que Roriz não tem mais foro especial. O assessor de imprensa de Roriz, Paulo Fona, afirma que as denúncias são velhas e já foram desqualificadas em julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), quando se discutiu crime eleitoral que teria sido praticado na campanha de 2002. Por quatro votos a dois, os ministros do TSE avaliaram, na ocasião, que não havia provas contra Roriz de uso da máquina e abuso de poder político e econômico nas ações protocoladas pelo Ministério Público Federal e pelo PT.

Discípulos
Nos primeiros depoimentos, Durval Barbosa citou Roriz. Disse que partiu dele a autorização para que a estrutura da Codeplan fosse usada nos interesses eleitorais da campanha de Arruda ao Governo do Distrito Federal. A íntegra do vídeo entregue por Durval ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) durante a fase de delação premiada mostra uma relação próxima entre Arruda e Roriz, na ocasião. No momento em que recebia o maço de dinheiro das mãos de Durval no gabinete da presidência da Codeplan, Arruda atendeu uma ligação de Roriz. No diálogo, ele disse que estava com ;saudades; do então governador do DF.

Durval Barbosa também contou que a engenharia jurídica para os contratos com empresas de informática, feitos sem licitação de forma que houvesse liberdade para escolha das prestadoras de serviço, partiu de Benjamin Roriz, pessoa da maior confiança de Joaquim Roriz(1). Em depoimento à Polícia Federal, ele contou que Benjamin ; ex-secretário de Governo de Roriz e secretário-adjunto de Relações Institucionais de Arruda ; apresentou como solução convênios entre a Codeplan e o Instituto Candango de Solidariedade (ICS) para a realização de contratos. Esse modelo é contestado pelo Ministério Público e foi considerado irregular pela Justiça. Vários contratos resultantes desses convênios renderam ações penais e de improbidade administrativa contra Durval, em tramitação no Tribunal de Justiça do DF.

Entre os investigados na Operação Caixa de Pandora, há integrantes do grupo arrudista que não tiveram destaque na administração Roriz, como o conselheiro Domingos Lamoglia, do Tribunal de Contas do DF, e o jornalista Omézio Pontes, ex-assessor de imprensa de Arruda. Mas há muitos políticos que estiveram ao lado de Roriz, como Leonardo Prudente (sem partido), Eurides Brito (PMDB), Rôney Nemer (PMDB), Benício Tavares (PMDB) e Benedito Domingos (PP), que foi vice de Roriz, entre 1999 e 2002. Júnior Brunelli (PSC), que renunciou por ter recebido dinheiro de Durval e por ser o autor da famosa oração da propina, era cotado para ser candidato ao Senado neste ano na chapa encabeçada por Roriz.

Embora hoje sejam considerados inimigos políticos, Roriz e Arruda já tiveram muitas afinidades. Arruda foi secretário de Obras de Roriz, quando deu início ao projeto de construção do Metrô de Brasília. Em 1998, Arruda disputou eleição ao governo, anunciando uma alternativa a Roriz e ao PT. Perdeu e depois se reaproximou do antigo padrinho. No último governo de Roriz, Arruda, Paulo Octávio, Tadeu Filippelli e Maria de Lourdes Abadia disputaram abertamente o apoio do ex-governador para a campanha ao governo. Com a sinalização de que Roriz apoiaria Abadia, Arruda e Paulo Octávio fecharam uma chapa puro-sangue ao governo. Assim que se tornou governador, Arruda cooptou vários antigos colaboradores de Roriz, como o ex-secretário de Fazenda Valdivino de Oliveira e o presidente do PMDB-DF Tadeu Filippelli.

1 - Recluso
Até 27 de novembro, Joaquim Roriz estava engajado numa campanha política para aumentar o número de filiados do PSC, partido que ingressou depois de deixar o PMDB. Todo final de semana, ele vinha fazendo caravanas nas cidades e recebia aliados em seu escritório político, inaugurado no Setor de Indústrias e Abastecimento (SIA). Depois que o escândalo veio à tona, ele ficou mais recluso e só falou sobre o assunto no programa do partido na televisão, quando disse: ;É tão vergonhoso, tão escandaloso... Fico numa indignação, fico numa vergonha...;


Opinião do internauta
Leitores comentaram no site do Correio Braziliense os desdobramentos da crise política no Distrito Federal.


Do mesmo lado
Confira os secretários e políticos que participaram tanto do governo Roriz quanto da gestão Arruda

Weligton Moraes
Da equipe de Joaquim Roriz ao longo de suas gestões como governador, Weligton Moraes assumiu cargo correspondente como chefe da Agência de Comunicação na administração de Arruda. Tinha como responsabilidade os contratos de publicidade institucional do GDF.

Fernando Leite
Considerado um dos técnicos de empresa pública mais próximos de Joaquim Roriz, ele foi um dos coordenadores da campanha de Maria de Lourdes Abadia em 2006 à reeleição, mas manteve a função de presidente da Caesb quando Arruda virou governador.

Valdivino de Oliveira
Veio para Brasília em 1999 com a meta de aumentar a arrecadação tributária do GDF. Foi secretário de Fazenda durante os dois últimos mandatos de Joaquim Roriz. No início de sua gestão, Arruda chegou a criticar suposto rombo do governo anterior, mas chamou Valdivino de volta para a pasta.

Ricardo Penna
Especialista em estatísticas e análises políticas, ele foi um dos conselheiros de Joaquim Roriz, quando exerceu cargo de secretário de Planejamento. No governo Arruda, permaneceu na mesma função, com a tarefa de trabalhar pela redução dos gastos supérfluos da máquina administrativa.

Eurides Brito
Foi secretária de Educação de Roriz e líder de seu governo na Câmara Legislativa. Mesmo fora do Executivo, ela indicou pessoas da confiança para cargos estratégicos na administração de Roriz. A peemedebista integrou um grupo do PMDB que se rebelou contra Roriz e apoiou Arruda na campanha. Foi líder de seu governo até as denúncias da Caixa de Pandora.

Fábio Simão
Nos primeiros mandatos de Joaquim Roriz, ele foi secretário particular do governador. Era considerado uma das pessoas mais próximas dele. Depois, eles se afastaram. No PMDB, Simão foi um dos líderes do movimento de apoio a Arruda na campanha de 2006. No atual governo, era poderoso. Além de gerente do projeto Copa 2014, ele assumiu o cargo de chefe de gabinete.

Durval Barbosa
Foi presidente da Codeplan de 1999 a 2006, durante dois governos de Joaquim Roriz. Organizou a contratação das empresas de informática, a princípio por meio do Instituto Candango de Solidariedade (ICS), que resultou nas denúncias de desvios de recursos. No governo Arruda, foi mantido em cargo no primeiro escalão, como secretário de Relações Institucionais.

Rogério Rosso
Amigo da família de Joaquim Roriz, Rogério Rosso deixou a atividade empresarial para se dedicar a um projeto político ao lado do então governador. Foi secretário de Desenvolvimento Econômico e administrador de Ceilândia. É o primeiro suplente de deputado federal do PMDB e conquistou cargo de presidente da Codeplan, com a atribuição de organizar programas para o Entorno.

Tadeu Filippelli
Presidente regional do PMDB, era o braço direito de Roriz nas obras. Na campanha de 2006, apoiou a candidatura de Maria de Lourdes Abadia e era nos primeiros meses depois da eleição um crítico do atual governo. No final de 2008, ele se aproximou de Arruda, indicou toda a direção da Novacap e chegou a ser cotado como vice numa chapa encabeçada pelo governador hoje afastado e preso.