Mesmo que até hoje ninguém tenha visto esse tal carro preto, o serralheiro Francisco Menezes de Araújo, 46 anos, sai para trabalhar todos os dias com o coração na mão. Os gêmeos de 6 anos ficam em casa, na QL 7 do Itapoã II, com a babá e só podem se divertir na rua quando ele chega. ;Fico vigiando-os o tempo todo;, contou. Ele diz saber de pelo menos quatro histórias de meninos e meninas que desapareceram e tiveram os corpos encontrados dias depois. O último deles seria de uma menina de 11 anos que estava desaparecida há três meses. ;Parece que acharam o corpinho dela esta semana no condomínio Bouganville, sem os órgãos. Dentro dela ainda colocaram farofa. Acho que foi macumba;, disse.
O segundo caso seria de uma adolescente de 17 anos encontrada há 15 dias decapitada. Um garoto apelidado de Totinha, 8 anos, também teria sido raptado por dois homens no tal carro preto, mas devolvido aos pais após o pagamento de resgate. Ninguém soube dizer qual o valor pago e onde o tal sobrevivente morava. Por último, Francisco disse que ouviu falarem dos restos mortais de outro jovem que foi encontrado em um contêiner no mês passado, sem os órgãos. ;É horrível trabalhar angustiado desse jeito e viver praticamente trancado;, desabafou Menezes.
Nenhum desses casos relatados pelo serralheiro foi confirmado pela delegacia. Segundo o delegado-chefe, Miguel Lucena, diversas são as ocorrências de crianças e adolescentes que saem de casa por algum motivo. ;Muitos fogem com o namorado, outros não aguentam mais a violência dentro de casa e por aí vai. Os pais registram ocorrência como desaparecimento, mas, na verdade, quando nós averiguamos, o jovem está na casa de alguém ou no outro dia ele está de volta;, contou.
Com medo das histórias que se espalharam pelo Itapoã, a dona de casa Maria Marciana dos Santos, 48 anos, resolveu alugar uma van escolar para buscar os filhos no colégio. ;Antes, eles iam de bicicleta, mas agora estou com medo de deixá-los irem sozinhos. Desde quando começaram as aulas eu os deixo na van e os pego na volta;, garantiu. Inúmeras são as recomendações para os filhos de 11 e 7 anos. ;Falo para eles não aceitarem balinha de ninguém e, se virem o carro preto, é para correr e gritar por socorro, nem que tenham que entrar na casa de algum vizinho. Esta história do carro preto eu escuto desde quando era menina, mas com a história lá de Luziânia ela voltou a circular por aqui e no mundo em que nós vivemos eu não duvido de mais nada;, disse.
A reportagem do Correio abordou pelo menos 10 pessoas e todas elas sabiam da história do carro preto e se diziam assustadas com a notícia de que ele estaria percorrendo os bairros. ;Graças a Deus eu nunca vi esse carro, mas dizem por aí que ele fica rodando bem devagar até achar alguma criança sozinha;, contou a dona de casa Dilma Ferreira da Silva, 27 anos, moradora do Condomínio Del Lago.
"Esta história do carro preto eu escuto desde quando era menina, mas com a história lá de Luziânia, ela voltou a circular por aqui"
Maria Marciana dos Santos, 48 anos
Maria Marciana dos Santos, 48 anos