Foi-se o tempo em que a iniciativa privada em Brasília não se destacava além dos limites do Distrito Federal e restringia-se a suprir as necessidades básicas dos cidadãos locais. Hoje, cresce cada vez mais o número de empresas brasilienses com capacidade para investir e projetar seus negócios em nível nacional e mesmo internacional. O fenômeno tem se intensificado de alguns anos pra cá. As histórias de empresas que surgiram, cresceram no DF e conquistaram seu lugar ao sol fora daqui estão em setores variados, como comércio, prestação de serviços e indústria.
Segundo o presidente da Federação das Indústrias do Distrito Federal (Fibra), Antônio Rocha, embora haja registros de casos particulares ocorridos no passado, a investida consistente das empresas locais para além do DF avançou mais recentemente. Para ele, o bom momento econômico vivido pelo país foi determinante para o fenômeno. ;O mais importante é que o empresário vislumbre mercado em outro estado. A renda do brasileiro cresceu, a competitividade também e isso criou um cenário favorável;, afirma.
O presidente da Fibra diz ainda que condições propícias dentro de Brasília também foram indispensáveis para que os empreendimentos prosperassem ao ponto de ser possível planejar e executar uma expansão. ;Você vê que é uma busca por novos mercados de um tipo bom para o DF. O empresário não está migrando por questões econômicas ou tributárias. Ele está se baseando aqui para expandir;, diz ele.
Para José Ângelo Costa, professor do mestrado e doutorado em economia da Universidade Católica de Brasília (UCB), visar novos mercados é um processo natural, que faz parte da dinâmica de crescimento das empresas. ;Se você faturou o mercado atual e pode investir, vai buscar a expansão;, afirma. Como o DF tem um mercado consumidor de tamanho limitado não é difícil às empresas atingir o limite e procurarem áreas do país com clientes de perfil semelhante ao dos encontrados aqui. ;A maior parte da demanda de algumas empresas está no Plano Piloto, Lago Norte e Lago Sul. Quando a empresa satura esses mercados, não vai se expandir para o Entorno, por exemplo. Vai para lugares com consumidores de alta renda;, completa Costa.
Ele acredita ainda que a atual conjuntura econômica é igualmente um fator importante. ;A gente está saindo de uma crise que não afetou tanto o Brasil. O país vinha crescendo e deve ter um crescimento razoável também este ano;, prevê.
Reinvestir
As bioquímicas Sandra Costa e Janete Vaz fundaram, em 1984, o Laboratório Sabin, à época uma sala alugada no Setor Hospitalar Norte com três funcionários, além das duas. Por anos, a empresa buscou a consolidação no mercado local e conseguiu implantar 55 unidades no Distrito Federal.
Há oito anos, começou a ir um pouco mais longe, abrindo uma filial em Formosa, cidade goiana a 30km da capital federal. Há quatro anos, foi a vez de Valparaízo, também em Goiás, na região do Entorno, ganhar uma unidade. Foi só em 2009, no entanto, que a empresa realmente colocou em prática uma estratégia de expansão.
No ano passado, aproveitando um incremento de 31% no faturamento em relação a 2008, as proprietárias do Sabin adquiriram um equipamento alemão para análise laboratorial, composto de esteira, gerenciadores de amostras e oito computadores, o que permitiu um salto de 600 mil para 1 milhão na quantidade mensal de resultados emitidos. O aumento na produtividade proporcionado pela máquina, que custou R$ 4 milhões, permitiu a abertura de mais unidades do laboratório. Como o mercado local tinha uma grande oferta de alternativas, Barreiras (BA) e Luziânia, mais uma cidade de Goiás, foram escolhidas para a instalação das unidades do Sabin, após uma pesquisa de mercado. Amanhã, mais um laboratório será inaugurado também em Anápolis.
Sandra Costa explica que as análises bioquímicas são centralizadas em Brasília, onde as amostras chegam diariamente de avião. Então, são encaminhadas via internet aos seus locais de destino. ;A expansão foi possível por meio de um procedimento que sempre foi seguido por nós, que é o de reinvestir na empresa. Investimos em recursos humanos, em conhecimento, em tecnologia e aí está o retorno;, diz ela que, em 2010, planeja implantar unidades do Sabin também em Unaí (MG) e Goiânia.
Informática
A empresa Telemicro, no Distrito Federal desde 1988 ofertando serviços de informática, se diferenciou das demais do ramo logo no início de sua atuação. Segundo o presidente, Ricardo Caldas, os pacotes oferecidos se adequavam mais ao perfil da iniciativa privada do que ao do serviço público, nicho da maioria das empresas do tipo em Brasília.
A espécie de produtos ofertados fez com que a Telemicro não demorasse a abrir o leque de clientes em direção a outros estados. São Paulo, por exemplo, sempre foi um mercado forte para as vendas. Em 2001, a empresa abriu um escritório lá e, em 2003, foi a vez de o Rio de Janeiro ganhar uma representação. A base de operações e o cérebro da empresa, no entanto, continuam em Brasília, apesar de a capital federal, hoje, ter uma demanda menor pelos serviços prestados do que os outros dois estados. ;A matéria-prima de uma empresa de tecnologia são as pessoas. Nossos engenheiros e técnicos estão no DF, bem como a maior parte dos empregos, porque a empresa pode continuar se expandindo a partir daqui;, diz Caldas. Segundo ele, a Telemicro garante 37 empregos diretos no Distrito Federal e cerca de 10 em cada um dos escritórios fora daqui.
Para a empresária Silvana Chrystal, que tem quatro unidades de sua loja de acessórios, a Art Design, em shoppings do Distrito Federal; e para o chef Dudu Camargo, com oito restaurantes aqui, a expansão em direção a novos mercados está apenas começando.
Silvana abriu em novembro de 2009 uma filial da Art Design em São Paulo, na Vila Olímpia, no shopping que leva o nome do bairro. De acordo com ela, a implantação seguiu um projeto de expansão que terá desdobramentos ainda este ano. ;Queremos abrir outras lojas na capital paulista. Avaliamos cuidadosamente, é um mercado competitivo;, diz Silvana. De acordo com ela, a loja da Vila Olímpia tem decoração semelhante às das brasilienses e oferta exatamente os mesmos produtos, com um ou outro toque diferenciado. ;Cada região tem suas peculiaridades;, justifica. Uma empresa de recursos humanos de São Paulo foi contratada para montar a equipe da filial, que primeiro teve orientação da de Brasília, e hoje caminha com as próprias pernas. O desenho das coleções de joias e a produção ainda estão concentrados no DF.
FRANQUIAS
Além de empresas se consolidando com filiais em outros estados, Brasília tem algumas franquias promissoras. A Maki Temakeria, que começou aqui recentemente, em 2007, tem cinco lojas no DF e já abriu duas em outros estados, uma em Vitória (ES) e outra em Fortaleza (CE). A rede de fast food Giraffas começou a funcionar na capital federal em 1981. Atualmente tem lojas espalhadas por todo o país e, na última semana, anunciou que abrirá sua primeira unidade nos EUA, em Miami. Franquia é uma espécie de cópia de negócios que estão montados. Cada um desses clones leva o nome de franquia, que é implantada e gerida por um terceiro. Brasília é a quarta cidade mais promissora para se instalar uma franquia, segundo a Consultoria Rizzo Franchise.
Dicas
O que o empresário deve observar antes de abrir uma filial
# Conhecer o mercado para saber em que região seu produto será mais bem aceito
# Estudar convenções trabalhistas, carga tributária e afins de onde pretende se instalar
# Investir em mão de obra local
# Manter a qualidade do produto ou serviço
# Checar a existência de insumos necessários à produção
# Checar infraestrutura e logística do local (água, energia, condições de transporte)
# Pesquisar o potencial do mercado consumidor para o produto que vai ofertar
Caminho inverso
Dudu Camargo, que comanda restaurantes com diferentes especialidades em Brasília, criou uma outra marca em 2000 para o Rio de Janeiro, a partir do interesse de um amigo em uma sociedade. A Stravaganzze vende pizzas no estilo das encontradas no Fratello Uno, estabelecimento que Dudu mantém nas quadras 103 Sul e 109 Norte em Brasília, e tem controle de qualidade feito pelo chef. ;Tenho uma boa equipe de gestão de operações e de vez em quando dou um pulo lá pessoalmente;, conta ele. Após a experiência bem-sucedida, Dudu pode levar ainda este ano sua marca Dudu San ; restaurante japonês ; também para o Rio de Janeiro, e abrir uma filial em Fortaleza (CE).
Presente em Brasília quase desde a inauguração da capital, a German Móveis, que vende mobília com design e fabricação próprios, foi fundada em 1960 e já teve duas filiais em São Paulo e uma em Goiânia na década de 1980. De acordo com o proprietário, José Luiz Fernandez, por ;questões de estratégia de mercado;, a empresa voltou a concentrar seus pontos de venda em Brasília e quer mesmo trazer sua fábrica, que fica em Anápolis, de volta para cá.
;Isso é cíclico, no momento é melhor concentrar tudo aqui;, afirma Fernandez, que diz que a empresa pretende continuar revendendo móveis com o seu selo para outros estados ; São Paulo, regiões Norte e Centro Oeste são os principais compradores ; e expondo-os em feiras. ;Pretendemos até expandir a venda no atacado, mas avaliamos que é importante consolidar os pontos de venda no DF;, diz.