Rosa Maria Mendes trabalha como empregada doméstica em uma casa na QI 28 do Lago Sul. Há cerca de duas semanas, ela acordou com febre. Na manhã seguinte, as dores nas costas, na cabeça e nos olhos foram as causas da madrugada em claro. Procurou um médico e ouviu o diagnóstico: estava com dengue. No domingo, percebeu um sangramento na gengiva e correu para o hospital, com suspeita de dengue hemorrágica. Ligou para a casa onde trabalha e descobriu que a patroa apresentava os mesmos sintomas que a fizeram sofrer. A dengue hemorrágica ainda não foi confirmada. ;Mas sinto dores pelo corpo até hoje;, afirma Rosa Mendes.
A poucas casas de distância, o bancário Adriano Meira, 40 anos, acordou com febre e dor abdominal. Depois, vieram as dores nas articulações, na cabeça e nos olhos. Ele também procurou um médico e recebeu o mesmo diagnóstico. De lá para cá, seis casos da doença já foram confirmados na mesma quadra. No conjunto em que Rosa trabalha e Adriano vive, há uma casa desabitada onde a equipe de vigilância sanitária encontrou larvas de mosquito na piscina. ;A situação aqui é grave;, alertou o prefeito da QI 28 do Lago Sul, Jorge Dias.
E a gravidade não está restrita ao Lago Sul. ;Estamos diante de uma epidemia de dengue no Distrito Federal. Houve aumento brusco e além do esperado na incidência da doença;, advertiu o subsecretário de Vigilância à Saúde, Allan Kardec Rezende, responsável local pelo combate à doença. Entre janeiro e fevereiro do ano passado, 60 casos foram confirmados. Até o momento, as estatísticas de 2010 apontam para 390 casos, o que representa um aumento de 465% com relação ao mesmo período de 2009. Segundo o secretário de Saúde, Joaquim Barros Neto, é a maior epidemia de dengue nos últimos oito anos, no Distrito Federal.
Outro dado preocupante é o de transmissões ocorridas dentro do Distrito Federal. No dois primeiros meses do ano passado, foram 25 ocorrências. Neste ano, já são 294, o que significa aumento de 848%. Os casos de pessoas infectadas em outros estados pularam de 35 no ano passado para 96 no mesmo período deste ano. ;Mas este número tende a piorar, já que depois do carnaval muitas pessoas podem voltar para Brasília infectadas;, alertou o subsecretário.
Na avaliação de Allan Kardec Rezende, a comunidade está esquecendo de colocar em prática cuidados simples que podem afastar o mosquito. Esta também é a opinião do prefeito da QI 28. ;Houve um afrouxamento da prevenção da dengue e as pessoas estão deixando de se cuidar;, avaliou. Com o aumento dos casos, a Vigilância Sanitária pediu à Secretaria de Saúde para definir uma força-tarefa. O secretário determinou a participação de todos os funcionários da pasta que tiverem envolvimento direto ou indireto com a doença. Eles serão treinados para multiplicar informações que ajudem a população a se proteger. O Exército também vai ceder cerca de 200 homens para dar suporte ao trabalho educativo. Técnicos de Vigilância Sanitária farão visitas a todas as regiões onde há maior concentração de casos.
Visitas
Na última quinta-feira, o mutirão teve início na Vila Planalto, um dos locais onde a epidemia se espalha com maior rapidez no DF. A cidade já recebeu a equipe de combate à dengue em meados de janeiro, mas como os casos não param de se multiplicar, a mobilização foi repetida. Durante as visitas, técnicos vistoriam as casas, dando informações e checando possíveis lugares propícios à reprodução do mosquito aedes aegypti, vetor da dengue. Quando encontram um foco de proliferação, o tratamento é localizado na área de risco e se estende por um raio de 300 metros. Nesses casos, os técnicos eliminam as larvas com o produto químico Temefós e, para acabar com os mosquitos, aplicam uma espécie de fumacê de menores proporções. O fumacê, ou UBV pesado, só é aplicado por caminhões quando toda a região já foi comprometida.
Uma das estratégias implementadas na visita às cidades é mobilizar estudantes. ;A criança é um agente importante. Se trouxer informação da escola, sensibiliza os pais;, garante Rezende. Ele alerta que sempre que os sintomas se manifestarem, é essencial procurar o centro de saúde mais próximo. Se a área de Saúde não for avisada, a equipe responsável por coibir os casos não recebe as notificações e, consequentemente, não consegue detectar as áreas que merecem mais atenção. ;Damos prioridade a locais onde há maior número de focos;, esclarece.
O clima tem sido propício para que a epidemia se alastre ainda mais. O mosquito vetor da doença se reproduz na água empoçada, frequente na época de chuvas, e o calor acelera sua proliferação. ;Nós também falhamos. Não conseguimos manter a vigilância sempre atuante;, admitiu o secretário Joaquim Barros. Segundo ele, o efetivo, de cerca 465 agentes, não é suficiente. Para manter o combate em dia, seria necessário triplicar a equipe.
Assista a vídeorreportagem sobre a epidemia de dengue no DF
"A criança é um agente importante. Se trouxer informação da escola, sensibiliza os pais"
Allan Kardec Rezende, subsecretário de Saúde
Vila está no alvo
Na Vila Planalto, equipes de saúde e moradores armam uma operação de guerra para evitar que o mal se alastre ainda mais. Afinal, já são 106 casos confirmados e quase 200 notificações ; a mais grave situação encontrada no Distrito Federal. Nas praças, a doença virou assunto cotidiano e quem tem informações sobre a saúde dos vizinhos passa adiante. O bairro já foi alvo de uma operação de combate à dengue em meados de janeiro. Uma equipe da Secretaria de Saúde fez visitas às 1.600 casas e checou as condições de saúde em que vivem os cerca de 12 mil habitantes da vila. Distribuíram folhetos, deram orientações e pediram às famílias que deixassem na porta das casas todo o lixo e entulho dos quintais. ;Retiramos 590 metros cúbicos de entulho, o equivalente a cerca de 27 caminhões-caçamba;, relatou a coordenadora da Unidade de Vigilância Ambiental responsável pela Vila Planalto, Ildeci da Silva. A etapa final foi a aplicação do fumacê, feita em cinco ciclos, uma vez por semana.
Depósitos
Para checar o resultado, voltaram a visitar 20% do total de moradias. Deste universo de casas, 3% delas voltaram a apresentar os mesmos problemas de antes. Como o índice aceitável é 1% e cada vez mais casos chegavam aos serviços de saúde, a ação recomeçou na última quinta-feira. Deve durar todo o fim de semana, já que alguns moradores passam o dia fora de casa e não foram encontrados nos dias úteis. A prioridade agora é atacar os possíveis depósitos de larvas e, para isso, cada um dos 32 agentes que participam da operação visita cerca de 25 casas por dia.
Segundo o agente de Vigilância Ambiental Henrique Alves, os problemas mais frequentes na cidade são caixas d;água abertas, lixo acumulado no chão e tambores e tonéis destampados. Na primeira casa visitada, na Rua do Acampamento, um isopor antes utilizado para este fim estava de cabeça para baixo, sem qualquer sinal de acúmulo de água. Aos primeiros sinais de epidemia, os vasos de planta passaram a ser cobertos com areia e as garrafas armazenadas, guardadas com o gargalo virado para baixo.
Ainda assim, mosquitos transmissores da doença, chamados pelo funcionários da área de saúde de ;alados;, voavam livremente pelo quintal. Uma semana depois da operação, os agentes farão nova pesquisa .