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Arara azul macho que vive no zoológico passa por depressão desde morte de companheira

Arara azul macho que vive no Zoo de Brasília há seis anos passa por um período difícil e enfrenta depressão desde que sua companheira morreu. Quando conseguiram que ele se interessasse por outra fêmea, ela fugiu de casa. Resultado: ele voltou a ficar arredio

Diferentemente de alguns seres humanos, as araras são todas monogâmicas. O compromisso entre elas, muitas vezes, vai além da vida. Se o companheiro ou a companheira morre, a probabilidade de o animal que ficou não querer ter mais nenhuma relação amorosa é grande. Foi o que ocorreu com Pirata, uma arara- azul macho que vive no Zoológico de Brasília desde 2003. A ave passou a viver ali depois de ser apreendida pela polícia. Escapou das mãos de traficantes de animais, mas não sem antes ter um olho furado pelos criminosos. Quando chegou ao zoo, era apenas um bebê. Recebeu mimos e um apelido carinhoso relacionado à visão de um olho só. Ganhou também uma esposa. Ela, menos mimada pelos funcionários que ele, não tinha nome. Mas, em 2006, veio a tristeza: Pirata ficou viúvo e entrou em depressão.

Os veterinários e biólogos tentaram de tudo. Ofereceram-lhe várias fêmeas, forçaram o convívio entre eles e levaram-nos para morar no mesmo recinto. De nada adiantou. ;Eles são como a gente, se não bater um feeling, não adianta;, explicou a veterinária Clea Lúcia Magalhães. Depois de muito esforço, Pirata, exigente que é, conheceu um novo amor: uma fêmea também viúva e de penas esvoaçantes com um azul brilhante conseguiu quebrar o gelo daquele coração sofrido. Pirata, que antes era carrancudo, parecia mais alegre, mais sociável e até receptivo com os visitantes. Até que, em novembro do ano passado, sem nenhuma explicação, a nova namorada decidiu ir embora. A fêmea, supertinhosa, rasgou com o bico a tela de ferro do viveiro e voou.

Abandono
Era o começo da solidão para Pirata, novamente. O impacto foi grande, porque outra característica das araras, e também da maioria dos outros psitacídeos (família das aves), é ficar colado no parceiro o tempo todo, coçando-se e sempre demarcando o território. Tanto desgosto deixou marcas profundas e uma personalidade retraída. Hoje, Pirata não costuma se abrir para os humanos nem para os outros animais. Se ele está almoçando e algum pavão se aproxima ; as duas espécies vivem no mesmo local ;, a arara logo se afasta e fica isolada em um canto.

Os tratadores suspeitam que Pirata tenha tomado raiva de fêmeas em geral. Eles dizem que Pirata não se dá muito bem com as humanas, especialmente com as loiras. ;Uma estagiária loirinha entrou na casa dele um dia e o Pirata agarrou a menina pelos cabelos. Você precisava ver a dificuldade para fazer o bicho soltá-la;, relatou o tratador Ronaldo Macedo, 27 anos. Com as morenas, o animal é um pouco mais educado. E com os homens que cuidam dele, chega a ser dócil. ;Ele é de lua. Mas até sobe no ombro da gente, quando dá na telha;, relatou o tratador Davino Cardoso, 70 anos, 42 deles dedicados ao trabalho no zoológico.

Mimado
Alguns acreditam que a desilusão amorosa não é o único motivo para o comportamento manhoso de Pirata. Talvez o excesso de cuidados com o animal que chegou frágil ao zoológico ajude a explicar a má convivência social. Pirata recebe milho fresquinho todos os dias, ração e frutas. E ainda tem um tronco de buriti, árvore preferida das araras, só para ele. ;O Pirata é muito mimado. Ganhou e ainda ganha atenção demais por causa do problema na vista e pelo histórico de vida;, disse Clea Lúcia.

Quem visita Pirata percebe um comportamento reservado. ;Dá para perceber que ele está triste, fica pelos cantos. Pelo jeito que morde a grade, parece querer fugir também;, opinou o vigilante Wesley Gusmão, 40 anos, morador da Cidade Ocidental. ;É incrível. Os relacionamentos dos seres humanos andam tão enfraquecidos, acabam por qualquer coisa, e um bichinho desse é dedicado, sofredor e fiel assim;, observou. Na manhã de ontem, Wesley conheceu a arara quando passeava com a mulher dele, a vendedora Vaneia Costa, 37 anos. Esta ficou com inveja da devoção de Pirata. ;Tá vendo? Você tem que ser igual a ele. Se eu morrer, não pode encontrar substituta fácil não;, brincou Vaneia com o marido.

É difícil precisar a idade de Pirata, devido às circunstâncias nas quais ele chegou ao zoo. Mas os veterinários estimam que a ave tenha oito anos. A expectativa de vida de uma rara em cativeiro é de, em média, 50 anos. O zoo tenta agora encontrar uma nova arara azul fêmea solteira para apresentar a Pirata. ;Ela fugiu, mas pode retornar. É comum o bicho voltar. Dá saudade de casa;, torce Clea Lúcia. Até lá, Pirata continua solitário, à espera da volta da amada.

Novidades na casa dos bichos
Na manhã de ontem, o zoológico inaugurou quatro novos recintos para aves. Pirata não se mudou, mas outras 23 araras que dividiam espaço com ele foram levadas para as casas novas, com direito a paisagismo especial para atender as necessidades das aves e a uma lagoa em cada uma. As moradias têm 60 metros quadrados e seis metros de altura. O tamanho é cinco vezes maior do que o exigido pela legislação brasileira. Antes, os animais viviam todos misturados dentro de um recinto grande e apropriado para a reprodução, mas afastado do público.

Agora, eles ficam próximos dos visitantes e cada uma das quatro espécies vive em um compartimento. O público poderá apreciar ali o voo de araras-canindé, vermelhas, da-testa-vermelha e macao. De acordo com o diretor-presidente do zoológico, Raul Gonzales, de todas essas, somente a canindé não está na lista de animais ameaçados de extinção do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

Um dos objetivos de mover os bichos para novos recintos é facilitar a formação de casais entre eles e, assim, incentivar a reprodução, além de proporcionar mais conforto. Quando for o momento de procriar, as fêmeas serão levadas de volta para a antiga moradia para chocar os ovos. A obra custou R$ 170 mil. As araras azuis, no entanto, permanecem separadas das demais, porque têm o bico muito forte e precisam de recintos reforçados.

Há outras duas araras azuis além de Pirata, mas elas moram em outro espaço. Duas araras vermelhas não foram retiradas do local onde Pirata vive, porque fazem companhia a ele e a falta delas poderia deixá-lo ainda mais deprimido. Nas próximas semanas, o zoológico passará por mais mudanças. Em 15 dias, os hipopótamos também vão ganhar casa nova. As inovações fazem parte de uma reforma geral do zoo orçada em mais de R$ 1,1 milhão. (LM).