;Socorro! Estou secando;. Uma placa com esses dizeres foi fincada no fundo do Lago Paranoá, na altura da QL 6 do Lago Sul, por um morador da quadra há um ano. Naquela época, só havia água no local. Hoje, mato e lixo encobrem metade do pedido de salvação. Em menos de uma década, a aparência de todo o lago se transformou graças ao desenvolvimento urbano e o crescimento desordenado do Distrito Federal. Cidades erguidas sem planejamento e falta de sistema de contenção dos sedimentos afetaram diretamente as nascentes da Bacia do Paranoá e, consequentemente, a qualidade do lago. Se nada for feito para mudar esta realidade, a situação tende a piorar com o constante desenvolvimento do DF nos próximos anos.
O Plano Diretor de Ordenamento Territorial do Distrito Federal (Pdot) prevê novos centros urbanísticos. Um deles é o Setor Habitacional Catetinho. Ainda sem previsão de ser instalado, o empreendimento contará com 637 hectares ; o correspondente à 637 mil m; ; entre o Gama e o Park Way. A 22km do Plano Piloto, o novo bairro será composto por casas e condomínios de prédios de até 12 andares. O governo espera levar 40 mil pessoas à região. No novo setor batizado de Jardins Mangueiral, situado entre os condomínios do Jardim Botânico e a entrada de São Sebastião, a área será parcelada a fim de criar mais 8 mil unidades imobiliárias para uma população estimada em 30 mil habitantes. Segundo o Governo do Distrito Federal, a construção deste bairro será ecologicamente correta.
[SAIBAMAIS]A construção destes setores habitacionais impactarão diretamente nas nascentes. Próximo ao Park Way passam os córregos Vicente Pires e Riacho Fundo, os dois maiores da parte sul da Bacia do Paranoá. O Vicente Pires é alimentado ainda por outros quatro córregos menores, que estão ameaçados: Vereda Grande, Arniqueira, Vereda da Cruz e Samambaia. O documento responsável pela organização territorial do Distrito Federal, no entanto, prega medidas de defesa ambiental contra a contaminação dos cursos d;água com sedimentos em geral sem tratamento prévio. ;É necessária a definição de áreas para transbordo, tratamento, processamento e disposição dos resíduos sólidos antes de chegar ao Lago Paranoá;, determina o documento.
Do lado oposto do Distrito Federal está prevista a construção do Setor Noroeste. Ainda que idealizado como ;bairro verde;, ou seja, voltado para o meio ambiente, os especialistas temem a influência do aumento demográfico e urbano nesta região. ;A preocupação ali é menor. Além de a parte norte sofrer menos impacto, ainda tem o Parque Nacional de Brasília para amenizar os danos;, explicou Eduardo, assessor de recursos hídricos da Adasa. O novo bairro contará com alguns bolsões de retenção dos resíduos, a fim de evitar que os sólidos cheguem ao Lago Paranoá.
Assim como o morador responsável pela placa de socorro dentro do lago, o empresário Adriano Freire, 28 anos, também previa o assoreamento da região. Assustado com a situação, ele pede pressa ao governo para revitalizar a Bacia do Paranoá. Da janela de casa, ele acompanha a evolução do assoreamento no braço sul do lago. O deck do terreno às margens do lago está rodeado de vegetação. E a situação se repete na casa de todos os vizinhos em direção à QL 1. Ele mora na casa há 13 anos e acompanhou o assoreamento rápido desta parte do lago. O pai, Eduardo, 51, gostava de andar de lancha na região. Hoje, a embarcação não chega perto do terreno. Em épocas de seca, as plantas que se transformam em ilhas. ;Há seis anos, eu via o lago. Agora é só terra. O assoreamento aconteceu em uma velocidade gigantesca;, contou Adriano. Animais silvestres, como capivaras, começaram a viver entre as plantas e água suja.
Córregos
A atual situação do lago é um reflexo do que ocorre nos córregos da Bacia do Paranoá. Ao redor destes cursos d;água estão cidades em desenvolvimento, como Taguatinga, Núcleo Bandeirante e Águas Claras. Sedimentos de construções e lixo gerado pela comunidade são levados pela chuva. Com o passar do tempo, algumas nascentes deixaram de existir. Outras tornaram-se intermitentes. Para evitar que o problema se agrave ao longo dos anos, a população precisa se envolver na causa.
O Córrego Sucupira, próximo ao Riacho Fundo, sumiu do mapa. Ele aparece para os moradores da região em períodos de chuva. O Veredas da Cruz, que abastece o Vicente Pires, rebaixou 5lcm do leito original desde a construção de Águas Claras. ;Os órgãos responsáveis devem desassorear e recuperar as nascentes. Os moradores devem ter cuidados com o lixo e se preocupar com o meio ambiente;, aconselhou Eduardo, da Adasa.
O Instituto Brasília Ambiental (Ibram) tem um grupo de recuperação das nascentes do Distrito Federal desde 2001 chamado Adote uma nascente. Segundo a coordenadora do programa, Vandete Maldner, 55 nascentes estão sob cuidados de voluntários. ;Todos eles estão ameaçados em função da ocupação urbana;, explicou. Pessoas fazem doações em dinheiro ou de materiais para a recuperação córregos. ;As placas são derrubadas e pichadas. A comunidade precisa preservar essas áreas;, explicou Vandete. Pessoas interessadas em adotar uma nascente podem ligar no 3214-5658.