Há quem diga que o amor é cego, surdo e mudo. Mas a rotina de um morador da Quadra 2 do bairro Fazendinha, no Itapoã, parece desmentir essa máxima ; ou, quando muito, concorda que amar pode prescindir da visão. Cansado de ser acordado com os gemidos de um casal vizinho, o rapaz, de 32 anos, resolveu apelar para a polícia. No último dia 5, após passar cerca de quatro horas ; da 1h às 5h ; ouvindo gritos e ;barulhos constrangedores;, ele foi até a 6; Delegacia de Polícia (Paranoá) e registrou ocorrência contra a dupla. Reclamou dos ;gritos da mulher; e das ;palavras de baixo calão; pronunciadas em voz alta durante o ato sexual dos vizinhos. As extravagâncias sonoras seriam comuns entre o casal.
A reclamação foi registrada no item ;perturbação da tranquilidade; e esta semana marido e mulher ; bem como alguns vizinhos ; serão chamados para depor. A ocorrência um tanto inusitada chamou a atenção dos policiais. Acostumados a registrar crimes violentos como homicídios, estupros e roubos, eles não esperavam que alguém se sentisse incomodado com o barulho oriundo de uma relação sexual do vizinho. ;É difícil constatar que houve perturbação da tranquilidade neste caso. Tem que ser uma coisa muito acintosa, proposital;, avaliou o delegado-chefe adjunto Pablo Aguiar. Ao que tudo indica, essa gritaria não tem nenhuma conotação de antipatia ou desavença entre moradores, uma vez que o denunciante sequer sabe o nome dos vizinhos.
O fato de os filhos de 2 e 3 anos do reclamante ouvirem o sexo barulhento teria motivado o homem a levar o caso ao conhecimento das autoridades. ;Ele contou que as crianças constantemente têm o sono prejudicado em razão do comportamento da mulher;, relatou o delegado-chefe adjunto. Nessa situação, a delegacia não tem muito que fazer, além de encaminhar a denúncia ao Ministério Público. Perturbar a tranquilidade dos outros caracteriza uma contravenção penal, ou seja, um crime de menor potencial ofensivo com previsão de penas que vão desde a multa até prisão simples (regime semiaberto ou aberto) até prestação de serviços comunitários.
Multa na Inglaterra
Pelo menos no Distrito Federal, não é comum pessoas registrarem ocorrência dessa natureza ; mas a reclamação parece ser comum em outros países. No mês passado, a britânica Caroline Cartwright, 48 anos, foi multada por desobedecer ordem judicial de controlar os impulsos na hora H. Em novembro, a mulher teve de pagar 200 libras (R$ 570) após perder recurso na justiça. Ela e o marido Steve Cartwright ainda foram obrigados a desembolsar 300 libras (R$ 854) pelos custos do processo e outras duas taxas no valor de R$ 613 pela audiência de apelação, conforme afirmou reportagem do jornal inglês The Sun. Para provar a incidência de ruídos altos durante o ato sexual do casal em questão, os vizinhos instalaram aparelhos especializados de gravação que registraram níveis médios de 30 a 40 decibéis, com um pico de 47 decibéis.
; Memória
Síndica queria proibir sexo
Em 1993, a decisão de uma síndica de um prédio na 516 Sul de proibir sexo entre os condôminos provocou intensos debates na capital federal. Ela enviou uma carta aos moradores do Edifício Jardim Tropical recomendando que fizessem um ;reexame pessoal do comportamento ético, social, emocional e sexual; para evitar que ;sons e ruídos que o entusiasmo deixa escapar; perturbassem os vizinhos. A carta deixou a comunidade indignada. Os moradores reclamavam que esse tipo de cobrança era inaceitável e que, para se ouvir o barulho provocado pelas relações sexuais, era necessário ;se colocar o ouvido na parede;. Naquele ano, o caso chegou a ser analisado pela Delegacia de Costumes e Diversões Públicas (DCDP), mas, como nenhum morador registrou queixa por ;perturbação do sono;, acabou arquivado depois das investigações preliminares.