Jornal Correio Braziliense

Cidades

Artigo de professor da UnB trata do uso dos espaços públicos pelo brasiliense

"A decisão de uma fração da comunidade de moradores do bairro de Águas Claras de literalmente eliminar uma praça pública que reunia pessoas totalmente estranhas ao seu convívio ; consideradas ameaça a seus bem-estar e segurança; é revelador de graves problemas na gestão urbana de uma Capital planejada para ser o centro de elevada vida intelectual e de uma qualidade de vida exemplar ; segundo o genial humanista que a concebeu, Lucio Costa. Como urbanista, acredito que a decisão da comunidade é séria e deve ser levada a sério. Tão grave que devemos traçar os fundamentos desse repúdio a um espaço público que sempre foi essencial à civilidade, desde a origem das cidades: as suas praças.

[SAIBAMAIS]Numa explicação sumária, pode-se dizer que a comunidade sempre repudiará os espaços públicos sobre os quais não tem controle, com os quais não tem a menor identidade, que não servem às suas necessidades ou estilos de vida. Como resolver o problema? A comunidade deve ter parte predominante na gestão dos espaços públicos diretamente vinculados a seu "espaço vital", de comunidade.

Na proposta vitoriosa de revitalização da via W3, de 2002 (terminativamente repudiada pelo próprio Governo do Distrito Federal, que promoveu o concurso e não aceitou o resultado), a gestão direta dos espaços públicos de interesse das comunidades moradoras e usuárias era peça central da revitalização, ou da própria vitalidade dos espaços urbanos.

A verdade é que Brasília ; o que inclui necessariamente Águas Claras e os demais bairros ; tornou-se, nos últimos 25 anos de "democracia", uma presa de interesses imobiliários e políticos de má qualidade. O vitorioso "projeto imobiliário" é repleto de exclusividades, avesso à inclusão, ao comunitarismo de qualidade. O próprio governo do DF tem ensinado a comunidade a burlar a Lei (como atestam os mais de 600 condomínios irregulares promovidos por grileiros distritais), a ser desonesta e egoísta, e a ridicularizar a Lei (como atesta a distribuição generosa de dinheiro público a políticos da maior importância em nossa Cidade, por um Secretário de Estado de Relações Institucionais).

A comunidade de Brasília deveria ser assistida por iniciativas públicas baseadas em conhecimentos científicos, em projetos responsáveis por seu bem-estar. Uma das primeiras conseqüências de "um novo tempo para Brasília" seria a compreensão ; e inclusão ; dos "estranhos", o controle das ameaças "vindas de fora" e a perda de medo e de iniciativa diante do crime organizado ; que, como vemos, começa a partir do exemplo do próprio governo local."

Professor Frederico Flósculo Pinheiro Barreto, do Departamento de Projeto, Expressão e Representação em Arquitetura e Urbanismo da UnB