Um dos crimes de maior repercussão no Distrito Federal em 2009 vai alcançar o próximo ano sem solução. Ao completar hoje quatro meses de investigação, os assassinatos do ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) José Guilherme Villela, 73 anos, da mulher dele, a também advogada Maria Carvalho Mendes Villela, 69, e da principal empregada do casal, Francisca Nascimento da Silva, 58, permanecem cercados de mistérios. São mais perguntas do que respostas acumuladas desde o dia do triplo homicídio, ocorrido em 28 de agosto no apartamento dos Vilela, o 601/602 do Bloco C da 113 Sul. As vítimas levaram, ao todo, 73 facadas.
Os corpos só foram encontrados em 31 de agosto (leia Cronologia). Desde então, a polícia trabalhou muito, teve tropeços, enfrentou dificuldades e não conseguiu solucionar o caso. A equipe de investigadores não é a mesma do início ; a unidade policial mudou por ordem da Justiça. Não há suspeitos presos. Não se descobriu a arma usada no crime nem o destino das joias e dos dólares levados do imóvel logo após os assassinatos das vítimas.
Nenhuma autoridade da Polícia Civil do DF fala sobre o assunto. Principalmente depois que a 1; Delegacia de Polícia, na Asa Sul, perdeu o comando da apuração. A unidade policial, chefiada pela delegada Martha Vargas, ficou à frente por menos de três meses. O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) apontou irregularidades, como prisões sem mandado, e recomendou à Justiça que tirasse o controle do caso da 1; DP. O juiz Fábio Francisco Esteves, do Tribunal do Júri de Brasília, acatou a sugestão e determinou que o inquérito passasse para a Coordenação de Investigação de Crimes Contra a Vida (Corvida), especializada em homicídios.
No entanto, a direção da corporação, na tentativa de preservar a imagem da delegada Martha Vargas, criou uma força-tarefa com representantes da Corregedoria-geral da Polícia Civil, da Divisão de Repressão a Roubos (DRR), da Corvida e da própria 1; DP. Mas a iniciativa se mostrou ineficiente. E a investigação acabou concentrada na Corvida desde o fim da primeira quinzena de dezembro.
A unidade especial tem a coordenação do delegado Luiz Julião Ribeiro, um dos mais respeitados investigadores do país. É característica dele não falar sobre os trabalhos em andamento, apenas depois de concluídos. Julião não parou de trabalhar no fim do ano. O Correio o localizou no Departamento de Polícia Especializada (DPE), onde fica a sede da Corvida. À reportagem, ele disse que as informações levantadas pela polícia nos últimos quatro meses passam por avaliação. ;Estamos fazendo a análise de tudo que foi feito até aqui. Vamos ver o que precisa ser aprofundado;, explicou.
Detidos
Os investigadores da 1; DP prenderam pelo menos seis pessoas em quase três meses. Mas apenas as três últimas detenções se aproximaram de possíveis elementos ligados ao triplo homicídio. No início de novembro, a polícia chegou a Cláudio José de Azevedo Brandão, 38 anos; Alex Peterson Soares, 23; e Rami Jalau Kaloult, 28, por meio de denúncia anônima. Com os dois primeiros, os investigadores encontraram uma chave do apartamento dos Villela.
Cláudio e Alex ficaram pouco mais de um mês presos, mas acabaram liberados pela Justiça por falta de provas e, provavelmente, por um erro da polícia ; perdeu-se o prazo para pedir a prorrogação da detenção. Dias depois, porém, a divulgação de parte do depoimento de Alex reforçou as suspeitas. Um dos trechos revela diálogo entre Cláudio e o próprio Alex. O primeiro teria pedido para o outro guardar uma chave, que seria da casa da namorada dele. Mas a chave abria a porta de serviço a chave do imóvel dos Villela. O favor renderia uma ;uma recompensa alta que você nunca viu!”.
O delegado Julião preferiu não comentar o envolvimento da dupla nos assassinatos da 113 Sul. Ele não descarta a possibilidade de recomeçar do zero alguns pontos da apuração.
Cronologia
O trabalho de apuração começou na noite de 31 de agosto, quando a polícia encontrou os corpos das vítimas na SQS 113.
As três pessoas haviam sido assassinadas três dias antes. Confira os principais momentos das investigações:
Agosto
Dia 28 ; O casal de advogados José Guilherme Villela, 73 anos, e Maria Carvalho Mendes Villela, 69; e a principal empregada deles, Francisca Nascimento da Silva, 58, são assassinados a facadas no apartamento 601/602 do Bloco C da 113 Sul. Estima-se que tenham sido atacados por volta das 20h.
Dia 31 ; A neta dos Villela contrata um chaveiro para abrir a porta do imóvel dos avós. Está acompanhada de três amigos policiais, que encontram os corpos e chamam a polícia. A 1; Delegacia (Asa Sul), chefiada pela delegada Martha Vargas, fica à frente da investigação.
Setembro
Dia 1; ; Relatório do Instituto de
Medicina Legal aponta que as vítimas
levaram, ao todo, 73 facadas.
Dia 7 ; Quase 10 perícias são feitas nos primeiros dias de inquérito. A polícia abre duas linhas de investigação: latrocínio (roubo com morte) e crime encomendado.
Dia 29 ; A polícia prende o primeiro suspeito de participação no triplo homicídio. O homem, identificado como D., é acusado de envolvimento com grupo de extermínio ligado ao Primeiro Comando da Capital (PCC), facção criminosa de São Paulo. A polícia o prende em um Astra roubado.
Outubro
Dia 3 ; A polícia prende o segundo suspeito no caso. A. acaba detido porque testemunhas o viram, acompanhado do primo D., na 513 Sul na noite do crime. Os dois suspeitos acabariam soltos por falta de provas que os ligassem ao triplo homicídio.
Dia 15 ; A polícia estima que os assassinos fugiram com US$ 700 mil e pelo menos 12 joias.
Dia 21 ; A delegada Martha Vargas divulga fotos e esboços das 12 joias roubadas do imóvel.
Novembro
Dia 3 ; Após denúncia, a polícia prende dois homens. Eles viviam em uma casa em Vicente Pires, onde a polícia encontra uma chave do apartamento dos Villela. Os mandados de prisão foram expedidos no dia seguinte.
Dia 6 ; O Instituto de Criminalística da Polícia Civil divulga laudo sobre a dinâmica parcial do crime. Pelo menos dois bandidos invadiram o apartamento e usaram duas facas para matar as vítimas.
Dia 11 ; A Justiça manda que a investigação saia da 1; DP e seja encaminhada para a Coordenação de Investigação de Crimes Contra a Vida (Corvida). Cita arbitrariedades.
Dia 13 ; Mais um suspeito acaba detido. Agora, são três presos: Cláudio José de Azevedo Brandão, 38 anos; Alex Peterson Soares, 23; e Rami Jalau Kaloult, 28.
Dia 21 ; Depois de 10 dias, a polícia cumpre ordem judicial e faz a primeira reunião da força-tarefa designada para resolver o mistério. Há representantes de duas delegacias especializadas, da Corregedoria da Polícia Civil e da 1; DP.
Dezembro
Dia 3 ; O Tribunal do Júri de Taguatinga manda soltar Cláudio Brandão por falta de provas.
Dia 5 ; Os outros dois detidos também acabam liberados. No mesmo dia, a delegada Martha Vargas, à frente do inquérito por mais de três meses, pede afastamento do caso.
Dia 9 ; Polícia divulga depoimento de Alex Peterson no qual ele afirma que Cláudio José lhe pediu para esconder uma chave (a do apartamento dos Villela). Receberia uma recompensa por isso.
Dia 10 ; Implode a força-tarefa organizada para desvendar o crime. A investigação fica concentrada na Corvida.