Para trabalhar na Companhia do Metropolitano do Distrito Federal, o Metrô, é preciso mais que passar em um concurso público com vários candidatos por vaga. É necessário ter a aparência adequada. O visual dos funcionários se tornou motivo de polêmica desde a sexta-feira última, quando a diretoria da companhia distribuiu um documento com procedimentos operacionais a serem adotados pelos empregados.
Os trabalhadores não podem pintar o cabelo em tom diferente do natural. Usar piercings, brincos grandes, pulseiras, alargadores na orelha e unhas muito longas, nem pensar. Os homens estão proibidos de ter cabelos longos e as mulheres de usá-los soltos. Além disso, a barba deve estar sempre feita. Exibir bijuterias ou joias ;extravagantes; também é proibido. O prazo para se adequar é de 30 dias.
Caso não respeite as medidas, o funcionário público pode ser alvo de um processo administrativo. Uma comissão tem a responsabilidade de julgar a gravidade da infração. A pena pode ir da advertência à demissão. Não é difícil encontrar pessoas fora do padrão estético definido pela norma dentro do metrô. Um funcionário que não quis se identificar por medo de punição usa cabelo longo e vermelho e piercing. ;O metrô vive de aparência. O serviço funciona mal, falta manutenção e segurança para os usuários. Enquanto isso, a direção se preocupa com a cor do meu cabelo;, reclamou.
Funcionário do centro de controle do Metrô, Gilson J. David, 42 anos, se sentiu reprimido com a novidade. Ele trabalha nesse setor há 12 anos. Em 2006, David decidiu deixar os cabelos crescerem. Os fios chegam quase à altura dos ombros. Se quiser se adequar ao código de conduta da empresa para a qual trabalha, David terá de abrir mão das madeixas. ;Não vou cortar meu cabelo de jeito nenhum. A função exercida por mim é considerada atendimento ao público. O que me deixa mais chateado é que fico dentro de uma sala onde nenhum passageiro entra;, explica.
Constituição
David considera as regras impostas pela diretoria do Metrô absurdas. ;Deve existir uma norma, sim. Mas há pontos arbitrários nesse documento. Nele constam palavras como extravagante, insensato e insano. É, no mínimo, ofensivo. Regras devem ser objetivas. O que é extravagante para você pode não ser para mim;, queixa-se. O Sindicato dos Metroviários reagiu contra a decisão e enviou um ofício ao Ministério Público do Trabalho. ;Não estamos falando de um quartel militar. Essas normas ferem os direitos individuais garantidos pelo Artigo 5 da Constituição Federal. Recebi 50 ligações em um dia de funcionários reclamando dessa medida abusiva;, afirma o diretor de assuntos jurídicos do sindicato, Carlos Alberto Cassiano.
O diretor de operação e manutenção do Metrô, José Dimas Simões, não vê ilegalidade ou poder ofensivo no procedimento operacional. ;A norma pretende padronizar a aparência dos funcionários. São mais de 700 pessoas. Se não tivermos regras, cada um se comporta como quer e isso aqui não deixa de ser uma empresa;, justifica. ;Nossa preocupação é com quem tem contato direto com o público. Essas pessoas representam a imagem da companhia;, completa. O diretor, no entanto, admite a possibilidade de rever alguns itens do documento.
Na visão do advogado especialista em direito do trabalho e professor da Universidade de Brasília Victor Russomano Júnior, não há ilegalidade na medida. ;A empresa tem direito de estabelecer regras e de definir como quer ser vista pelo público;, diz. ;É comum em várias atividades que tratam de atendimento ao público normatizar a aparência. O objetivo desse código de conduta é evitar exageros. A liberdade individual não é absoluta;, acrescenta.
Memória
Guerra aos bigodes
Em maio deste ano, os carregadores de bagagens da Rodoferroviária de Brasília sofreram com a imposição de uma mudança de aparência no local de trabalho. A administração do local exigiu que eles retirassem os bigodes. Quem teimasse seria impedido de trabalhar. A justificativa era melhorar o visual tornando-o mais limpo e passar maior credibilidade para os usuários do serviço. Depois da polêmica, muitos pelos faciais retirados e da intervenção do Ministério Público do Trabalho, a administração voltou atrás e liberou o uso do bigode.
CARA A CARA
José Dimas Simões, diretor de operação e manutenção do Metrô
;Entendemos que não é apropriado alguém com cabelo rosa, corte moicano ou cheio de piercing prestando serviço em uma empresa que pretende passar segurança a seus passageiros. A ideia é manter um padrão normal. Queremos valorizar os usuários desse meio de transporte não os expondo a extravagâncias. Os funcionários devem saber o que podem usar ou não. É impossível administrar uma empresa na qual cada um faz o que quer. Ninguém será punido de forma arbitrária se descumprir as regras. Temos a comissão disciplinar que atua em favor dos funcionários, com participação do sindicato.;
Carlos Alberto Cassiano, diretor de assuntos jurídicos do Sindicato dos Metroviários do DF
;Quando esses trabalhadores prestaram concurso público, não havia nada no edital sobre regras para regular a aparência. Eles não sabiam que seriam tratados como soldados em um quartel. Os procedimentos adotados por uma empresa devem acompanhar a sociedade. No Brasil, ter cabelo grande, colorido ou usar piercings é muito comum. Espero que o Ministério Público do Trabalho nos chame ainda essa semana para discutir o assunto. Com a intervenção da Justiça, os direitos à personalidade de cada um devem ser preservados.;
- Regras questionadas
- Cabelos
- Devem estar sempre limpos e penteados
- Os homens devem usar cabelos curtos;
- As mulheres de cabelos longos devem prendê-los na altura da nuca;
- No caso de tingimento dos cabelos, a cor adotada deve ser de tom natural, sendo vedada a utilização de cores extravagantes e incomuns;
- É vedado o uso de cortes e penteados extravagantes e incomuns.
- Devem estar sempre limpos e penteados
- Barba
- Para o empregado que não usa barba, deve mantê-la sempre feita e bemescanhoada (barbeada);
- Para o empregado que usa barba, deve mantê-la limpa, aparada e delineada.
- Unhas
- As unhas devem estar sempre aparadas em tamanho curto ou médio e bem higienizadas
- Disposições gerais
- É vedado o uso de bijuterias ou joias extravagantes
- No caso de uso de brincos, estes somente poderão estar presos às extremidades dos lóbulos das orelhas e seus feitios devem ser discretos;
- É vedado o uso de piercings, pulseiras, alargadores de orelhas e acessórios similares;
- O uso de óculos escuros só é permitido quando o empregado estiver
- conduzindo veículos ou trens, ou em casos excepcionais, expressamente
- Autorizados pela chefia imediata
- Não é permitido o uso de fones de ouvido, exceto aquele que esteja ligado ao transceptor portátil.
- É vedado o uso de bijuterias ou joias extravagantes
- Fonte: Procedimento operacional estabelecido pelo Metrô-DF