Os advogados do fazendeiro Flávio Parente Macedo, condenado a 32 anos e 11 meses de reclusão pelos crimes de homicídio duplamente qualificado, tentativa de ocultação de cadáver, lesão corporal contra a ex-mulher e a enteada e atentado violento ao pudor contra a última, vão recorrer da sentença e pedir redução da pena, que consideram exagerada. Já o Ministério Público julga pequena a condenação e protocolou ontem um pedido de aumento dos anos de prisão. O fazendeiro, de 59 anos, também terá de indenizar em 400 salários mínimos (R$ 186 mil) a ex-mulher Rosineide Martins da Silva, a enteada e a família do médico Fábio Henrique de Oliveira, 41 anos, assassinado em 2006 por Flávio.
O fazendeiro foi condenado na madrugada de ontem pelo Tribunal do Júri do Paranoá. A leitura da sentença pela juíza Maria da Graça de Paula, à 1h, deixou comovidos amigos e parentes das vítimas. Em entrevista ao Correio, antes da condenação, a enfermeira Rosineide Martins, ex-mulher de Flávio, esperava a pena máxima para o homem que matou o namorado dela e que teria molestado sua filha, na época com 14 anos. Ela contou as dificuldades psicológicas e emocionais que enfrenta desde a morte de Fábio Henrique (leia entrevista).
O médico foi assassinado a pauladas e tiros na noite de 27 de agosto de 2006, no Condomínio Ville de Montagne, no Lago Sul. Flávio estaria inconformado com o fim do relacionamento com Roseneide. O julgamento do fazendeiro começou às 9h25 da última segunda-feira, mais de três anos depois do crime. O júri foi formado por quatro homens e três mulheres. As promotoras Vívian Caldas e Raquel Tiveron não economizaram na apresentação de provas que incriminassem o réu por quatro crimes, um deles o atentado violento ao pudor, que ele não confessou.
Agarrada a um exemplar de O evangelho segundo o espiritismo, de Allan Kardec, que continha uma foto de Fábio Henrique, Rosineide se recusou a ir para casa mesmo após ser liberada pela juíza. Dezenas de pessoas vestidas com camisas com a foto do médico e uma mensagem da Canção da América revezavam lugares no plenário. Todos queriam assistir à condenação do responsável por um crime que chocou o DF. Os familiares do fazendeiro não quiseram dar entrevistas.
Discurso emocionado
Aplausos e um discurso emocionado da irmã da vítima, Glivânia de Oliveira, marcaram o fim da leitura da sentença. ;Hoje, nós, parentes e amigos, batemos palmas para a Justiça, para os promotores e para todos que nos ajudaram até aqui nesta luta, como a Pró-Vítima (Subsecretaria de Proteção às Vítimas);, disse. ;O sentimento é de que a justiça foi feita. Sabemos das dificuldades do Judiciário brasileiro e, por isso, enxergamos a decisão como uma vitória. Prevaleceu a verdade sobre aquela noite tenebrosa. Não dá para dizer que a Justiça foi rápida como queríamos. Para a nossa dor, o julgamento tinha que ser no dia seguinte ao crime. Foram três anos e 88 dias de sofrimento, angústia e espera;, ressaltou.
O advogado do fazendeiro Pedro Barreto vai recorrer da sentença. ;Houve um excesso na pena. O primordial é sempre a vida, mas em relação aos demais crimes houve pelo MP um julgamento voltado ao emocional;, defendeu. O MP protocolou no Judiciário um pedido de aumento da penalidade. Flávio Macedo, porém, deve aguardar o resultado do recurso no Complexo Penitenciário da Papuda, onde já está preso há três anos.
Entrevista - Rosineide Martins da Silva
Qual é sua expectativa em relação à condenação do seu ex-marido?
É muito difícil confiar na Justiça, porque eu ia para delegacia de madrugada denunciar o Flávio e eles nunca fizeram nada. Eu nunca tive proteção. Ele teve que matar para ser preso. Agora, eu espero que se faça justiça, porque ele destruiu a vida de muita gente.
Hoje, você sente alguma coisa pelo seu ex-marido, Flávio?
Sinto pena. Ódio, eu não tenho mais. O ódio consumia toda a minha vida.
Depois da tragédia, você conseguiu se relacionar com mais alguém?
Não. Eu não tenho cabeça para isso. Eu amo o Fábio ainda, muito, muito.
Você tem medo de ele (Flávio Parente) vir atrás de você após cumprir a pena?
Ele nunca me deixou em paz. Eu tive que entrar num programa de proteção. Tive de ir à penitenciária para implorar para ele me deixar em paz
Por que ele faz isso? Amor?
Isso não é amor, quem ama não bate, quem ama não trai, quem ama não trata como um brinquedo. Quem ama quer o bem da outra pessoa. Eu conheci o que é o amor. O que ele tem é posse. Amor era o que o Fábio sentia por mim, o que eu senti por ele.
Você se relaciona com a família do Fábio?
Não tenho relacionamento com ninguém, eu não converso com ninguém, eu fico dentro de casa dia e noite. Tenho medo de sair na rua, não gosto de conversar. Admiro muito a mãe (do Fábio), os irmãos, a força que eles têm. Eu fui toda consumida naquela noite. Tudo o que eu tinha, todas as minhas forças se foram naquela noite. Me sinto uma flor murcha, uma morta-viva. Quero poder ajudar meus filhos e depois quero que Deus me leve, porque minha vida não tem mais sentido.