Iniciada em setembro de 2008 e com menos turbulência agora, a crise econômica mundial provocará efeitos no Distrito Federal no próximo ano. A avaliação é do secretário de Planejamento e Gestão, Ricardo Penna, que pela prudência ficou conhecido no governo pelas previsões pessimistas, muitas das quais realizadas conforme expectativa. Os números levantados pela equipe na área de orçamento mostram que o Executivo terá de evitar novos reajustes salariais em 2010, no ano eleitoral, justamente quando o servidor fica tentado a fazer pressão para engordar o contracheque.
O problema é que o GDF nunca gastou tanto com a folha de pagamentos. Uma projeção da Secretaria de Planejamento indica que as despesas com pessoal terão crescido 53% em relação ao último ano do governo anterior, ou seja, vão mudar de R$ 8,6 bilhões para R$ 13,2 bilhões. Nesse mesmo período, o aumento da arrecadação tributária, fonte destinada a esse tipo de despesa, vai crescer 44%, ainda segundo estimativas do governo. Ricardo Penna explica que a ampliação dos compromissos com pessoal ocorreu, ao longo dos últimos três anos, por dois motivos: a contratação de 15.789 servidores ; sendo 11.509 para trabalharem nas áreas de saúde, segurança e educação ; e a concessão de reajustes para várias categorias acima da inflação anual registrada.
Por conta do aumento da folha, o GDF começa a se aproximar dos tetos impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para gastos com pessoal. O limite prudencial estabelecido pela lei é a aplicação de até 46,55% do que o Estado arrecada em pagamento de salários. Em 2010, o Executivo atingirá o índice mais alto (43,8%) registrado na década. Desde 2006, esse percentual vem aumentando ano a ano. O descumprimento da LRF impõe ao Poder Público penalidades, como a suspensão do direito de captar recursos e financiamentos externos e com a União. Esse é um fantasma que o governador José Roberto Arruda quer evitar.
Investimentos
Praticamente metade dos recursos destinados a investimentos nos últimos três anos é fruto de recursos captados em financiamentos internacionais e com a União, além de programas do governo nacional. Aliado à arrecadação própria, o GDF tem batido recordes no volume de investimentos na capital do país. Em 2010, o Executivo espera aplicar R$ 1,9 bilhão em investimentos para obras em todo o DF. Esse montante é 158%, ou seja, mais do que o dobro dos gastos com a mesma finalidade no último ano do governo de Joaquim Roriz, compartilhado com Maria de Lourdes Abadia.
Penna explica que os reajustes já negociados, como o para os médicos e professores, estão garantidos. Arruda vai sancionar o projeto de lei (1)que garante reajuste médio de 21,9% para os servidores da carreira de administração direta, autarquias e fundações. O aumento beneficia cerca de 14 mil servidores. O secretário de Planejamento afirma que muitos servidores, políticos e sindicatos têm feito grande pressão no governo para garantir novos aumentos acima da inflação.
Aumento de 6,5%
O texto aprovado na Câmara Legislativa na semana passada, com o voto de 22 deputados distritais e duas ausências, estabelece que os servidores receberão neste ano reajuste de 6,5% retroativos a outubro. No próximo ano, eles receberão aumento de 7% e o mesmo percentual será concedido em 2011.
O senhor sempre fez balanços pessimistas em relação ao impacto da crise mundial no Distrito Federal. Qual avaliação o senhor faz agora que a turbulência maior já passou?
Antecipava que a crise teria impacto importante na arrecadação do DF. Chamei a atenção que o DF, por ter uma economia diferente, estaria de certa forma blindado, mas que a crise chegaria aqui. E chegou de duas formas. Pela redução do Fundo Constitucional, que no próximo ano vai aumentar apenas 1%. No que diz respeito ao Tesouro local, as receitas de origem tributária, numa projeção para este ano, cresceram 4,5%. Descontando a inflação, significa dizer que a arrecadação vai crescer zero, que haverá um rebatimento para 2010.
Qual é o impacto em 2010?
Mais de 80% da receita tributária são usados para pagar pessoal. Não podemos pagar pessoal com venda de projeções do Noroeste ou com operações de crédito, por exemplo. Como a receita e o Fundo Constitucional caíram, o principal problema é que temos dinheiro para fazer obras, mas não temos recursos para pagar novos aumentos de salários.
O governador Arruda está ciente dessas dificuldades?
Eu tenho chamado a atenção do governador. Sei que o momento é difícil, um ano pré-político, que tem pessoas de todo lado, de fora e de dentro do governo, fazendo uma associação política com os sindicatos dos servidores para alavancar aumentos. É uma coisa legítima, mas há uma queda de braço muito pesada entre aumentos e capacidade de pagar esses reajustes.
Nos últimos anos, houve um aumento expressivo de gastos com pessoal. Foi uma decisão política?
Os aumentos de pessoal vêm de duas origens basicamente: reajuste de salários dos servidores e a contratação de servidores. A concessão de reajustes foi significativa, muito acima da inflação, com ganhos significativos.
Há risco de descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal?
A história nos mostra que, ao longo de 10 anos, os limites flutuaram entre 32% e 33%. Nesses últimos dois anos, passaram para 42% e 44%. Por isso, precisamos fazer uma arrumação e mostrar ao servidor que não podemos conceder aumento acima de nossa capacidade de pagamento. O governo deve ficar com os aumentos que já negociou. Não pode conceder aumentos que estavam sendo pleiteados. O governo não tem como ceder a pressões fora da realidade.
Os aumentos já negociados estão garantidos?
Com certeza.
No ano que vem, a pressão vai aumentar?
Haverá uma pressão normal e legítima do jogo político. Gostaria de lembrar que os maiores gastos de pessoal dos últimos quatro anos ocorreram no último ano do governo anterior. Houve uma pressão gigantesca, mas não podemos ceder.