Uma semana depois de o Correio Braziliense denunciar com exclusividade esquema de venda e emissão de certificados de conclusão de ensino médio, uma operação-surpresa realizada ontem por três órgãos de fiscalização notificou o Instituto Latino-Americano de Línguas (Ilal). Representantes da Promotoria de Defesa do Consumidor (Prodecon), da Delegacia do Consumidor (Decon) e do Instituto de Defesa do Consumidor (Procon) deram 10 dias para a escola se defender das suspeitas de estelionato, falsidade ideológica e falsificação. Os proprietários podem receber multa milionária e ter as atividades suspensas.
A ação conjunta ocorreu na sede do Ilal, na 502 Sul, e durou uma hora e meia. Apesar do prazo previsto em lei para que os donos da instituição se defendam, o grupo de fiscais deixou o local às 15h30 com pelo menos um crime comprovado. ;Não há dúvida nenhuma sobre a prática de publicidade enganosa, uma vez que os cartazes com as expressões ;supletivo; e ;MEC; induzem o consumidor ao erro;, explicou o presidente do Procon, Ricardo Pires. A fiscalização determinou a retirada imediata das placas fixadas na fachada voltada para a W2 Sul.
Flagrante
Também participou da operação o promotor Guilherme Fernandes, da Prodecon. Foi um dos primeiros a chegar ao local e flagrou um funcionário do Ilal ; mais tarde identificado como filho do responsável legal ; explicando a uma vítima que a escola mantém convênios fora do DF. Seria, assim, autorizada a representá-la na capital do país. ;Essa instituição do Rio de Janeiro já perdeu o credenciamento no estado de origem. Atuamos a escola, enfim, para evitar que outros consumidores continuem a ser enganados;, afirmou.
Fernandes, Ricardo Pires, agentes e uma delegada da Decon tiveram uma reunião com advogados e representantes do Ilal ; o dono não apareceu no local. ;Marquei uma audiência com eles para o dia 25 deste mês. Mas já propus que ressarçam os pais e os estudantes em dobro pelo que foi pago;, contou o promotor. É possível ainda que seja encaminhada pela Prodecon uma ação de dissolução de sociedade por conta das irregularidades levantadas junto à instituição. Não se descarta, assim, o fechamento das cinco unidades no DF ; uma na Asa Sul, outra na Asa Norte, a terceira em Águas Claras e duas em Taguatinga.
O Ilal atua há cinco anos no DF. A emissão de certificados sem autorização da Secretaria de Educação colocou sob suspeita a entrada de inúmeros brasilienses no ensino superior. A fraude fez com que as principais universidades do DF descobrissem, no total, 138 casos em 2009. Só a UnB encontrou 81 estudantes com matrículas garantidas por certificados do Ilal. O Uniceub tem 39 alunos na mesma situação. O Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb), 11. E o Centro Universitário do DF (UDF), sete.
; Investigação concentrada
A investigação policial do caso Ilal ficará sob responsabilidade da Delegacia de Defraudação e Falsificação (DEF). Ao concentrar a apuração, a especializada receberá inclusive os dados levantados pela Delegacia do Consumidor (Decon). A titular da DEF, delegada Ivone Rossetto, ouviu quinta-feira o representante legal da escola. Ele alegou que só captava alunos e não oferecia supletivos. Também negou que algumas provas fossem aplicadas pela internet. ;Vamos agora ouvir vítimas para aprofundar a investigação;, contou Ivone.
Dados levantados pela Secretaria de Educação do DF apontam que o Ilal cobrava de R$ 1,5 mil a R$ 3 mil por certificado de conclusão de ensino médio. A Coordenação de Supervisão Institucional e Normas de Ensino (Cosine) descobriu a fraude depois de receber denúncias de pais, estudantes e universidades. ;A notificação contra o Ilal representa um alívio e mostra que o poder público está atuando no problema. Educação é coisa séria. Desta forma, valoriza as pessoas e as instituições que agem corretamente;, avaliou a coordenadora da Cosine, Leila Pavanelli.
Um dos advogados do Ilal, Reginaldo Silva, voltou a negar irregularidades. Segundo ele, o contrato que a empresa oferece é de prestação de serviços. ;O aluno apenas se prepara aqui para o supletivo. Existe uma confusão nessa modalidade;, alegou. Silva também argumentou que o Ilal não precisa de autorização da Secretaria de Educação do DF para emitir certificados a partir de parceria com órgãos com sede no Rio de Janeiro. Alguns diplomas, por exemplo, levam o nome Empresa de Pesquisa, Ensino e Cultura (EPEC). Mas a entidade acabou descredenciada pelo governo carioca. (GG)
; Suspeitas e crimes
Publicidade enganosa
O Ilal não tem autorização da Secretaria de Educação do DF para oferecer supletivo ou emitir certificados de conclusão de ensino médio. Materiais informativos e pinturas na fachada das unidades da escola, no entanto, atestam documentos com reconhecimento do Ministério da Educação (MEC). O artigo 37, do Código de Defesa do Consumidor, proíbe toda publicidade enganosa ou abusiva. São capazes de induzir erro, incitar a violência, explorar o medo ou a superstição etc. Os infratores podem ser multados ou ter as atividades suspensas. No caso do Ilal, a prática ilícita acabou comprovada pelos órgãos de fiscalização. Tanto que retiraram os cartazes com informações do MEC ontem à tarde.
Estelionato, falsificação de documentos e falsidade ideológica
A escola emite declarações e certificados de alunos supostamente formados pelo programa Educação de Jovens e Adultos (EJA), em educação a distância. A participação de menores de 18 anos é proibida pela Resolução n; 1/2009 do Conselho de Educação do Distrito Federal. Parte dos documentos emitidos pelo Ilal também revela o nome de instituições de outros estados. Alguns dos diplomas e históricos escolares, por exemplo, são atestados por instituições do Rio de Janeiro.
Pais e estudantes pagaram até R$ 3 mil por certificados sem valor perante as autoridades locais de educação. A maioria só descobriu a fraude depois de levantamento realizado pela Coordenação de Supervisão Institucional e Normas de Ensino (Cosine), da Secretaria de Educação do DF, e da denúncia do Correio Braziliense. Estelionato (artigo 171, do Código Penal), falsidade ideológica (artigo 299) e falsificação de documentos (artigo 298) preveem penas de um a cinco anos de reclusão.