Jornal Correio Braziliense

Cidades

Imóveis em antigas invasões são oferecidos a valores que ultrapassam os de áreas nobres do DF

A lama e o esgoto a céu aberto foram substituídos pelo asfalto, sistema de abastecimento d;água e pelos equipamentos públicos. Lentamente, invasões se transformam em cidades com infraestrutura consolidada e qualidade de vida. Com a urbanização de regiões carentes, entretanto, surgiu um outro fenômeno: a especulação imobiliária. O metro quadrado de alguns lotes em cidades como o Varjão ou o Itapoã supera o valor cobrado em áreas nobres, como os lagos Norte e Sul (veja quadro abaixo). Até mesmo terrenos doados por meio de programas habitacionais do governo são oferecidos a preços que impressionam inclusive corretores acostumados ao mercado imobiliário da capital federal.

Um dos locais que virou alvo da alta dos preços é a Estrutural. A antiga invasão recebeu obras públicas e a paisagem da cidade mudou completamente nos últimos dois anos. As ruas empoeiradas ganharam pavimentação, escola e centro de saúde. Agora, muitos beneficiados por lotes no passado pensam em vendê-los para morar em regiões mais desvalorizadas e embolsar a diferença.

Como o comércio desses imóveis doados pelo GDF é proibido pela legislação, quem compra e quem vende não quer aparecer. Na Estrutural, é difícil achar faixas de ;vende-se; nas casas e terrenos porque a fiscalização na área é rígida. Mas os moradores e investidores fazem negócio por meio de anúncios colocados na associação de moradores localizada na entrada da cidade. Há dezenas deles afixados em um mural. ;Tem muita gente vendendo por mais de R$ 40 mil. Se eu conseguir esse preço, vou passar meu lote para a frente. Aí compro outro em uma cidade mais barata ou volto para a minha terra, na Bahia;, conta uma diarista de 45 anos, que colocou seu anúncio na associação e negocia boca a boca com os vizinhos.

O líder comunitário da Estrutural Evandro Batista se impressiona com os valores dos imóveis negociados na região. ;Tem gente de fora querendo investir na Estrutural, para vender ainda mais caro depois que estiver tudo regularizado. Mas o povo que mora aqui não tem condições de pagar esses preços tão caros que estão sendo cobrados;, revela Evandro.

O diretor do Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci) Luiz Cláudio Nasser atribui a valorização dos lotes de áreas carentes aos investimentos recentes em infraestrutura. Mas ele classifica esses altos preços como uma ;euforia; do mercado e alerta os compradores para terem alguns cuidados na hora do negócio. ;É grande a valorização nessas áreas que receberam investimentos do governo. A expectativa de regularização sempre gera essas movimentações. Mas o otimismo é exagerado e os valores muitas vezes fogem da realidade;, alerta o diretor do Creci.

Luiz Cláudio Nasser acredita que a alta dos valores de lotes em áreas carentes vai começar a expulsar a população mais pobre dessas áreas. ;O Guará, quando foi criado, abrigava apenas pessoas mais pobres. Com o tempo, como a região era bem localizada, a classe média foi comprando tudo e os mais carentes foram empurrados para áreas mais distantes;, acrescenta o diretor da entidade que representa os corretores.

Regularização
No Itapoã, que também está em processo de regularização, a especulação imobiliária assusta até mesmo os moradores antigos. ;O preço dos terrenos aqui, especialmente os comerciais, está absurdo. É impossível achar um lote pequeno por menos de R$ 100 mil;, conta o presidente da Associação Comercial do Itapoã, Mário Pereira da Costa. ;Foi só a infraestrutura chegar para os preços dispararem;, acrescenta o líder comunitário.

A avenida Del Lago, a mais movimentada do Itapoã, ganhou asfalto e iluminação no início do ano. Comprar uma loja na região é garantia de um bom negócio, já que quase toda a comunidade do bairro passa por ali diariamente. Com a urbanização, os lotes são anunciados por até R$ 170 mil ; caso de uma área de 128m; às margens da avenida Del Lago, onde hoje funciona um depósito de gás. Nesse caso, o metro quadrado sai por R$ 1.328. Na QL 16 do Lago Sul, o metro quadrado custa R$ 1.287. Segundo o vendedor do terreno no Itapoã, ele começou a anunciar o imóvel há apenas duas semanas, mas dezenas de interessados já teriam ligado em busca de informações.

; Compare os preços

Lago Norte X Varjão

Lote de 800m; na QL 8 do Lago Norte ; preço: R$ 750 mil ; valor por metro quadrado: R$ 937

Lote de 160m; na Quadra 7 do Varjão ; preço: R$ 250 mil ; valor por metro quadrado: R$ 1.562

Lago Sul X Itapoã

Lote de 128m; na Avenida Del Lago do Itapoã ; preço:
R$ 170 mil ; valor por metro quadrado: R$ 1.328

Lote ponta de picolé de 1.087m; na SHIS QL 16 do Lago Sul ; preço: R$ 1,4 milhão ; preço por metro quadrado: R$ 1.287