A quantidade de pessoas nascidas no Distrito Federal está cada vez mais próxima do número de migrantes que adotaram a capital federal como moradia. Os brasilienses somam - da população local, de acordo com a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) - dado referente a 2008. O registro de brasilienses no DF passou de 1,204 milhão, em 2007, para 1,236 milhão, no ano seguinte.
No ano passado, 15 mil pessoas nascidas em outros estados ou países se mudaram para Brasília. Boa parte delas era estrangeira: 3 mil pessoas cruzaram a fronteira para viver na capital brasileira. No entanto, o volume de brasilienses que nasceram ou retornaram ao DF naquele ano é muito maior: 32 mil. Com o acréscimo, o total de pessoas nascidas em Brasília aumentou em 0,35% - subiu de 48,57%, em 2007, para 48,92%, em 2008. A evolução de 0,35 ponto percentual coloca os habitantes naturais do DF mais perto do equilíbrio - o total de brasilienses precisa crescer apenas 1,08% para as duas partes se igualarem.
Os moradores nascidos aqui são descendentes de pioneiros e de pessoas que se mudaram para a capital ao longo das últimas cinco décadas. A estudante Paula Soares, 27 anos, nasceu em Brasília, mas tem paladar nordestino. Herdou o gosto por cuscuz e tapioca dos pais, um baiano e uma paraibana, e adora visitar os estados de origem da família. Fora isso, ela é brasiliense por completo. "Gosto muito daqui. Quero criar meu filho em Brasília e formar uma família", garantiu.
O desejo de aventura fez o pai de Paula, o marceneiro José Afonso de Oliveira Sobrinho, 60 anos, pegar um ônibus e deixar o município de Santa Maria da Vitória, na Bahia, aos 20 anos. Ele desembarcou em Brasília em janeiro de 1970 com uma pasta a tiracolo %u2014 o suficiente para carregar duas mudas de roupa e um par de sapatos. "Desci do ônibus e fiquei olhando para cima. Não conhecia ninguém aqui", lembrou. No dia seguinte, José conseguiu emprego na construção de casas do Guará e logo virou o instalador de portas mais rápido da obra: eram 18 por dia.
José encontrava os conterrâneos aos domingos nas agências de ônibus para observar quem chegava e partia da cidade. "Ia muita gente do Piauí, do Maranhão e da Paraíba. Era o ponto de encontro", disse. Uma das paraibanas o encantou e surgiu o casamento. Com a dona de casa Bernadete Soares de Lima, 52 anos, o marceneiro construiu uma legítima família brasiliense. Os dois filhos e os três netos nasceram no DF. Eles se estabeleceram e não pensam em se mudar. "Lá (na Bahia) eu ficaria estacionado, não ia evoluir em nada. Brasília me adotou, quero morrer aqu", comentou José.
Líderes no ranking
Os estados que mais têm representantes no DF são Minas Gerais, Goiás, Bahia, Piauí e Maranhão. "Essa migração mostra que os governos não estão preocupados com o desenvolvimento regional. Se isso acontecesse, as regiões beneficiadas deixariam de liberar população", explicou o geógrafo e professor emérito da Universidade de Brasília (UnB), Aldo Paviani.
Os migrantes saem de municípios menores e circulam entre grandes cidades e metrópoles. O que seguraria os viajantes na terra de origem seriam melhorias na qualidade de vida dos moradores. Até que isso aconteça, a tendência da migração é continuar. "Se houvesse qualquer grande iniciativa fora do DF, isso mudaria. Mas não vejo nenhuma no horizonte, então provavelmente continuará havendo", completou Paviani. O professor ressalta que a distribuição de lotes ainda é um grande atrativo para a migração. "Já prevejo que, em 20 anos, Brasília será uma São Paulo, com trânsito e espigões. A terra aqui é exígua, daqui a pouco não tem mais terreno para distribuir", conclui o professor.
Assim como José, a maioria dos moradores do DF é fiel à unidade da Federação. Em 2004, a Companhia de Planejamento do DF (Codeplan) fez uma pesquisa e descobriu que 43% da população local vive na região há mais de 20 anos. O mesmo levantamento revelou os principais motivos para a mudança de cidade. Quase metade dos entrevistados - 46% - disseram ter saído de casa para acompanhar parentes. Outros 17,5% vieram em busca de moradia. Melhorar de vida vem em terceiro lugar, tendo sido a motivação de 13,4% das pessoas.