Jornal Correio Braziliense

Cidades

Bandidos não perdoam nem as crianças

Creche Renascer, que abriga 51 meninos e meninas filhos de catadores do lixão da Estrutural, é invadida por criminosos. Mantimentos, um aparelho de DVD e R$ 1 mil em dinheiro foram furtados

Era de manhã cedo quando a diretora Maria do Socorro Nogueira chegou para abrir a creche Renascer, na Vila Estrutural. Levou um susto ao ver a porta de um quarto escancarada e diversos brinquedos espalhados pelo chão. Um pouco mais à frente, outra porta de ferro fora arrombada. Roupas, um sofá e prateleiras com livros estavam fora de lugar. Criminosos invadiram a creche, entre a noite de domingo e a manhã de ontem e, além de bagunçarem o espaço, levaram um aparelho de DVD, 20 quilos de arroz, achocolatado, macarrão, feijão, verduras e R$ 1 mil em dinheiro referente ao pagamento dos três funcionários da instituição. Com medo de andar com o dinheiro pela rua, a professora Sônia Maria Macedo, dona da Renascer, tinha guardado a quantia em um livro. A polícia desconfia que o autor do furto (1)conhecia a rotina da creche.

A história da Renascer foi publicada ontem pelo Correio. Sônia abriga 51 crianças de 2 a 10 anos, filhas de catadores do aterro sanitário da Estrutural, o famoso ;lixão;, e não cobra mensalidade pelo serviço. Com a ajuda de voluntários, realização de bazares e do próprio salário, ela consegue, na marra, manter abertas as portas da creche. Pensou diversas vezes em fechar as portas, mas o amor pelos pequenos sempre fala mais alto. ;Quando olho para elas, não consigo;, disse. Sônia não imaginava que um dia bandidos fossem capazes de tirar comida da boca de crianças e levar o dinheiro suado, de um mês inteiro de trabalho como professora da Secretaria de Educação. É na creche, inclusive, que boa parte das crianças forra o estômago. ;Algumas delas não têm nem o que comer em casa e vêm aqui só para tomar café e almoçar;, contou Maria do Socorro. Ontem, na hora do almoço, as crianças comeram apenas arroz e alguns poucos pedaços de carne. ;Acho que quem tira da boca de uma criança é um monstro;, disse a professora Marlene Alves de Souza.

O episódio levou medo os funcionários da creche, aberta há cinco anos. ;Fiquei nervosa quando entrei e olhei para as portas arrombadas. Ainda estava escuro lá fora, mas as luzes da creche estavam acesas e pensei que ainda houvesse algum bandido dentro;, contou Maria do Socorro. ;Quando fui para o quarto dos fundos, fiquei apavorada. A cena foi forte no momento em que vi que os mantimentos haviam sido roubados e os livros estavam espalhados pelo chão;, continuou, com os olhos marejados.

Em meio à bagunça dos livros, Kayky, 2 anos, e Felipe, 5, brincavam sem entender o que havia acontecido no local. Durante o dia de ontem, os pequenos de divertiram apenas em cima dos poucos brinquedos do parquinho, mas à tarde não tiveram como assistir ao desenho em razão do furto do aparelho de DVD. ;Era o que os meninos mais gostavam de fazer depois do almoço;, disse a diretora. Para Sônia, o furto ocorreu entre as 20h de domingo e a madrugada de ontem. Ela acredita que os autores tenham pulado o muro para entrar na creche, mas ela não tem nenhum suspeito. ;Todo mundo da região sabe que a gente não tem nada. Quando soube da notícia, já pensei de novo em fechar;, desabafou Sônia, sem segurar o choro. O caso foi registrado na 8; Delegacia de Polícia (Estrutural). Segundo a delegada-chefe da unidade policial, Débora Menezes, os investigadores já estão trabalhando para descobrir a autoria do crime.

1 - Sem violência
Subtrair algo de alguém sem emprego de violência caracteriza furto, diferentemente de roubo, quando há emprego de arma de fogo. A pena para o furto é de 1 a 4 anos de reclusão e pode ser aumentada em 1/3 quando há concurso de mais pessoas, abuso da confiança de alguém ou uso de chave falsa.


PARA AJUDAR

Quem quiser auxiliar a creche com alimentos, roupas ou material de higiene pode entrar em contato pelo telefone 3465-4957. Doações em dinheiro podem ser feitas também. A conta para depósito é: 058/025.245-0 ; Banco Regional de Brasília (BRB)[SAIBAMAIS]