Jornal Correio Braziliense

Cidades

Lojas antecipam o Natal

Setor aposta nos grandes clientes para aumentar a oferta de produtos de decoração, que têm baixa demanda em dezembro

Não importa que faltem quase 80 dias para a data: já é Natal no comércio de Brasília. Pode parecer estranho, mas é verdade. Apesar de nem o Dia das Crianças ter passado, luzes, enfeites e produtos tipicamente natalinos podem ser vistos nas prateleiras de lojas, supermercados e feiras da capital. Cada vez mais cedo, comerciantes tentam aproveitar esse clima festivo para seduzir clientes e deixá-los, o quanto antes, mais suscetíveis ao consumo. Este ano, a expectativa em torno da estratégia é ainda maior. O setor quer provar que essa história de crise foi só um susto.

Um papai-noel de 6m de altura hipnotiza quem passa pela comercial das quadras 109/110 Sul. Instalado há duas semanas em cima do prédio de uma recém-inaugurada loja especializada em artigos natalinos, o bom velhinho inflável está à venda pela bagatela de

R$ 7,5 mil. E não se espante: há compradores. O mercado de laços, bolas e o que mais for possível inventar com o tema do Natal não atrai apenas quem quer ornamentar a própria casa. Lojistas, donos de postos de gasolina e de concessionárias, por exemplo, também investem na decoração temática(1).

Em Brasília, ao contrário de cidades europeias e dos Estados Unidos, ainda não existem lojas natalinas que funcionam o ano inteiro. Porém, a venda é cada vez mais prematura. ;Quanto mais cedo abrirmos as portas, mais tempo teremos para vender. Em dezembro, a venda desses artigos cai bastante;, explicou a gerente de uma loja da 110 Sul, Bruna Marques. Por ora, ela tem cinco funcionárias para atender um público predominantemente feminino. Deve contratar mais cinco no início de novembro, quando o estoque de alguns itens começa a esgotar.

Expansão

Há clientes que chegam a gastar R$ 40 mil com objetos de decoração natalina. Uma única árvore, das mais sofisticadas, pode custar R$ 10 mil no mercado. A clientela de Bruna foi conquistada ao longo de 15 anos, período em que a mãe dela trabalhava na Feira dos Importados, vendendo justamente artigos natalinos a partir de novembro. ;Viemos para a Asa Sul para expandir essa clientela e ter mais espaço para expor os produtos;, contou Bruna. Há mais 2 mil produtos diferentes à venda. Cerca de 90% deles vêm da China, por meio de importadoras que, quase sempre, têm sede em São Paulo.

Wânia Lima, 55, oficializou a chegada do Natal no dia 22 último, quando abriu as portas da loja de produtos natalinos na Multifeira, perto da Feira dos Importados. Durante um mês, ela e mais quatro pessoas trabalharam para deixar tudo pronto. ;Estou há oito anos nesse ramo e sempre comecei a vender em novembro. Dessa vez, os artigos chegaram antes e eu decidi antecipar;, explicou. Segundo ela, valeu a pena. ;Estamos vendendo bem para turistas e moradores de condomínios. Todo mundo quer ter uma árvore bonita em casa;, comentou, ao antecipar também seus votos de feliz Natal.

Tempo dourado
Os tempos áureos das bolinhas e dos lacinhos verdes e vermelhos passaram. O dourado agora domina os enfeites, cada vez mais maiores. O mercado avançou e oferece novidades todo Natal. Algumas até esquisitas, muito além de papai-noel que dança e bate palma. Na loja de Wânia, existe uma árvore de cabeça para baixo e outra que pode ser suspensa, sem base fixa. A venda de duendes, gnomos e fadas ; que fogem ao espírito cristão da data ; cresce a cada ano. ;Os evangélicos não gostam muito, mas temos vendido bastante;, relatou.

Há quase um mês, redes de supermercado aderiram ao clima natalino e começaram a encher as prateleiras de panettone ; o pão de receita italiana que costuma ser consumido no Natal. Uma butique de chocolates da 105 Sul, de olho na concorrência, também resolveu antecipar os pedidos do produto. Desde a semana passada, os clientes podem escolher entre seis sabores diferentes. ;Se não for assim, a gente fica para trás. E sempre têm aquelas pessoas que gostam de panettone e compram antes;, comentou a gerente da loja, Kátia Vilar.

1 - Tradição
Segundo a tradição cristã, a data indicada para montar a árvore de Natal é o início do tempo do advento, período em que os católicos se preparam para a festa do nascimento de Jesus. Este ano, o advento começa em 29 de novembro, um domingo. O dia de desmontar os enfeites é 6 de janeiro, quando se celebra o encontro dos três reis magos com o Messias.

Inadimplência em queda desde julho

; A inadimplência no comércio do Distrito Federal vem caindo desde julho e deixa o setor otimista para as vendas de fim de ano. O índice de setembro, divulgado ontem pela Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), ficou em 4,9%. Segundo levantamento no banco de dados do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), 139.994 pessoas tiveram o nome incluído na lista de inadimplentes. Dessas, 49,58% são homens e 50,42%, mulheres. Em relação à faixa etária, a maioria tem entre 30 e 39 anos (27,35%). A pesquisa apontou ainda que 133.455 consumidores conseguiram limpar o nome na praça. O índice de setembro caiu em relação ao percentual registrado no mês anterior (5,1%) e no mesmo período do ano passado (5,3%). ;Estamos otimistas. Os lojistas estão renovando estoques acreditando no crescimento das vendas;, confirma o presidente da CDL do DF, Vicente Estavanato. Para tirar o nome do SPC, o consumidor deve procurar a loja, a financeira ou o banco credor, para renegociar ou pagar a dívida. Para saber se o nome está no cadastro, a pessoa deve procurar o balcão de atendimento da CDL, no Bloco A da Quadra 6 do Setor Comercial Sul (SCS).

Palavra de especialista
Tática busca incentivar as compras


;Os consumidores são facilmente influenciados. E o varejo sabe muito bem disso. Por isso, utiliza estratégias para incentivar as compras. Tanto é que todo mês existe uma data come-morativa. Enfeites natalinos ainda no início de outubro é uma tentativa de fazer as pessoas já começarem a pensar no assunto. No entanto, não é porque o consumidor está pensando que ele vai comprar. Muita gente ainda está sem dinheiro. O brasileiro deixa tudo para última hora e não é à toa. Na maioria dos casos, não saiu o 13;, por exemplo. De qualquer forma, a estratégia pode funcionar. Não se estimula a compra, mas o consumidor começa a pensar nela. E aí, quando ele tiver o dinheiro em mãos, estará mais suscetível a concretizar o pensamento.;

Eu acho...




Silvana Petrizzi, 56 anos, aposentada

;O tempo está passando rápido. Quando menos se espera, o Natal já chegou. Gosto muito de ver esses enfeites natalinos. E eles, com certeza, atraem o consumidor. Eu mesma tenho a decoração toda em casa, mas preciso me segurar para não gastar. Nessa época, o coração da gente amolece e fica mais fácil consumir, mas é preciso lembrar que depois do Natal vem um novo ano e a vida continua.;


Estratégia surpreende

A antecipação das vendas natalinas assusta a população. Até o presidente do Sindicato do Comércio Varejista do Distrito Federal (Sindvarejista), Antonio Augusto de Moraes, se surpreendeu com a notícia. ;Estamos a mais de dois meses do Natal. Pode ser que um ou outro comerciante já tenha iniciado sua estratégia de marketing, mas acho que é um pouco prematuro. Está muito cedo para pensar em fim de ano;, reconheceu Moraes.

Segundo ele, a campanha oficial do setor para o Natal só começa em 15 de novembro, e será veiculada em jornais e no rádio. Ainda não foi feita a pesquisa que mede a expectativa de aumento nas vendas, mas Moraes espera que o índice fique entre 7% e 8%. No ano passado, esse percentual não passou de 6%. ;Só que estávamos no auge da crise;, lembrou.

Para o economista e professor da Universidade Católica de Brasília (UCB) José Carneiro, os consumidores tendem a comprar mais este ano. Ele destacou que várias categorias do serviço público, que rege a dinâmica da economia local, ganharam aumento de salário. ;Além disso, este ano, há menos incertezas em relação ao futuro. A insegurança por conta da crise está bem menor;, afirmou.

Pesquisa

A Federação do Comércio do DF (Fecomércio-DF) também não definiu o índice estimado para o aumento nas vendas, apesar de prever melhor desempenho em relação a 2008, ano em que esse percentual ficou em 1,57%. No entanto, uma pesquisa realizada pela federação em janeiro apontou um aumento real de 3,2% nas vendas de fim de ano.

O Natal é, para o comércio, a melhor data comemorativa, pois movimenta vários segmentos. Os comerciantes, inclusive, costumam reforçar o quadro de funcionários nesta época do ano. No DF, a estimativa é que cerca de 6 mil vagas sejam abertas em lojas de rua e de shoppings. O pico de vendas geralmente ocorre em dezembro.