Após 16 dias de apuração, a Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) ainda não conseguiu fechar o quebra-cabeça que desvenda o triplo assassinato da 113 Sul. Não há uma linha de investigação definida (são pelo menos três hipóteses). Muito menos provas suficientes para pedir a prisão de alguém. Não por falta de esforço. As equipes envolvidas trabalham praticamente sem folga. Mas, apesar de terem total apoio da instituição, elas enfrentam dificuldades, como a inexistência de uma testemunha ocular e de registros no sistema do prédio onde as vítimas morreram esfaqueadas. Por outro lado, os policiais demoraram a agir em algumas situações, como na convocação de pessoas que podem ter muito a contar, a exemplo do chaveiro chamado para abrir o imóvel onde os corpos das vítimas ficaram por três dias, até serem encontrados na noite de 31 de agosto. Ele só depôs ontem (leia na próxima página).
Delegados, peritos e agentes estiveram ao menos 12 vezes no cenário do crime, o apartamento 601/602 do Bloco C da 113 Sul, onde moravam as vítimas: o casal de advogados José Guilherme Villela, 73 anos, e Maria Carvalho Mendes Villela, 69; e a empregada deles, Francisca Nascimento da Silva, 58. Os agentes colheram impressões digitais, vestígios de sangue, documentos e objetos. Encaminharam tudo aos bem equipados laboratórios da PCDF. Ainda ouviram 55 pessoas e fizeram diligências dentro e fora do DF. No entanto, os laudos não apontaram nada que conduza, de forma inconteste, ao assassino. Apenas confirmaram que as vítimas morreram esfaqueadas, sem chance de se defenderem. Não ingeriram substância química. Mas nem isso garante uma certeza. A polícia suspeita que os três podem ter sido sedados com um produto volátil, como éter molhado em pano.
Quando chegaram ao apartamento pela primeira vez, em 31 de agosto, peritos encontraram uma faca de 15cm. Mas eles desconfiam que a arma não seja a mesma usada para matar os Villela e a empregada. Os agentes acreditam que a faca, do tipo comum em uma cozinha, pode ter sido colocada lá para confundi-los. Policial federal, o homem que encontrou os corpos afirmou ter mantido o imóvel intacto até a chegada dos investigadores e peritos. O closet estava revirado quando os peritos entraram. Joias da família teriam sumido, mas dinheiro foi deixado no local. Na porta de serviço, havia manchas de sangue.
Desguarnecido
As manchas e as impressões digitais, porém, não coincidiram com as de nenhum suspeito. Os laudos do Instituto de Identificação (II) teriam apenas constatado marcas de dedos das vítimas entre as digitais colhidas no apartamento. Provas levantadas pelos técnicos do Instituto de Criminalística (IC) são fundamentais para indicar o autor e convencer um juiz a dar ordem de prisão a ele, além de mantê-lo atrás das grades. No entanto, a cena do crime recebeu outras pessoas, além dos investigadores, após a descoberta dos corpos. Isso dificulta a coleta de vestígios e pode ter apagado rastros do criminoso.
Após a perícia do último dia 31, nenhum policial permaneceu no Bloco C para isolar a cena do crime. Moradores e funcionários do prédio circularam pelas escadas, elevadores e o corredor que leva ao imóvel onde ocorreu o triplo homicídio. A polícia colocou apenas uma faixa listrada de plástico no acesso ao apartamento. Investigadores e peritos só retornaram à 113 Sul e ao Bloco C na tarde de 2 de setembro, quando conversaram com moradores e funcionários do prédio e fizeram um segunda perícia. Repetiram o trabalho no dia seguinte, mas apenas na escadaria, no hall de entrada e nos elevadores, onde coletaram impressões digitais.
Com base em perícia, uma das poucas certezas dos investigadores é o momento do crime. Ele ocorreu entre as 19h30 e as 20h de 28 de agosto, uma sexta-feira. Mas os corpos acabaram encontrados somente três dias depois.
Apelo por denúncia
No imóvel dos Villela estava instalado sistema de alarme monitorado que, uma vez acionado, permitiria a detecção de qualquer tentativa de intrusão no ambiente por meio de sensores. No entanto, a empresa de segurança privada contratada pela família reiterou que o equipamento não estava ligado. Em uma rara declaração sobre as investigações, o diretor-geral da Polícia Civil, Cléber Monteiro afirmou que o sistema não estava em operação na residência dos Villela havia três meses.
A falta de provas levou Monteiro a pedir publicamente ajuda à população para elucidar o crime da 113 Sul. Por meio de nota oficial, distribuída na última sexta-feira, ele fez um apelo para quem tiver qualquer informação sobre o caso entrar em contato com o Disque-Denúncia (197). A delegada Martha Vargas, chefe da 1; Delegacia de Polícia (Asa Sul), responsável pelo caso, repetiu o apelo diversas vezes.
; Planejamento minucioso
Investigadores reconhecem que o assassino foi meticuloso e deve ter contado com a ajuda de um informante. Delegada já colheu 55 depoimentos e diz ter um ;forte suspeito;
Edson Luiz, Naira Trindade e Ary Filgueira
; OAB espera laudos
Os conselheiros da Ordem dos Advogados do Brasil no Distrito Federal (OAB/DF) se reúnem hoje para, entre outras coisas, discutir a atuação no caso da 113 Sul. Eles vão indicar juristas para atuar na acusação durante a fase processual. No entanto, precisam de informações da polícia para entender como ocorreu o triplo assassinato. O advogado Raul Livino, conselheiro da entidade designado para acompanhar a investigação, esteve ontem com a delegada Martha Vargas, chefe da 1; Delegacia de Polícia (Sul). Ao contrário do esperado, ele deixou a unidade policial sem qualquer relatório oficial. A delegada prometeu entregar a ele um laudo definitivo amanhã. O documento era previsto para a última segunda-feira. ;Só temos como entender a dinâmica do crime com base no laudo da perícia;, ressaltou Livino, criminalista com atuação em mais de 300 processos de assassinatos no DF. Ele, porém, evitou criticar o trabalho da polícia. ;Trata-se de um crime de difícil elucidação.;
; Prefeito é testemunha indireta
José Olinto levou a agenda para mostrar onde estava no último dia 28
Entre as pessoas ouvidas ontem na 1; DP sobre o crime da 113 Sul, estava o prefeito de Planaltina de Goiás, José Olinto Neto, que chegou sem saber por qual motivo fora chamado. Ele contou, no depoimento que durou 20 minutos, que não tinha qualquer relação com o caso. Ao fim do testemunho, a delegada Martha Vargas declarou que o político era ;uma testemunha indireta das investigações; ; aquele que ouviu alguém contar ou relatar sobre um determinado fato, mas não o presenciou. O nome de José Olinto teria vindo à tona por meio de denúncia anônima.
O prefeito reiterou à polícia e aos jornalistas presentes o que já havia falado ao Correio ontem: ;Nunca conheci ou mesmo vi José Guilherme Villela;. ;Não há qualquer prova dessa relação;, afirmou Benedito Castro da Rocha, um dos dois advogados que acompanharam José Olinto Neto. ;É um absurdo este abuso de poder. Não houve nem sequer uma explicação do porquê da convocação;, reclamou.
Segundo José Neto, a delegada quis saber o que ele havia feito no dia do crime, 28 de agosto. Os compromissos mencionados pelo prefeito ; todos no município goiano ; estavam marcados na agenda que ele levou à 1; DP. Havia atividades registradas das 8h às 19h do último dia 28. ;Ele não saiu de Planaltina naquela data;, reiterou a secretária dele, Daniele Bezerra Silva. Os dois advogados não descartam a hipótese de pedir uma retratação pública da Polícia Civil do Distrito Federal por ter ;tentado sujar; a imagem do prefeito de Planaltina de Goiás. José Olinto levantou a hipótese de que a suposta denúncia anônima envolvendo seu nome tenha motivação política.