Jornal Correio Braziliense

Cidades

Horta cuidada com esmero desde 2006 na 713 Norte acabou depredada

Terreno servia de cultivo para frutas, temperos e ervas

Um trabalho de três anos destruído em pouco menos de meia hora. A horta comunitária da 713 Norte teve mudas arrancadas e arbustos danificados em um ato de vandalismo praticado no último domingo. A área verde oferece frutas, temperos e ervas medicinais (1)de 103 espécies para os moradores da residencial desde 2006. O estrago comprometeu o sistema de irrigação e a estrutura do criadouro de minhocas. Restos de troncos e vasos quebrados revelam os danos causados no local. Os canos estão rachados e não servem mais para levar água às plantas. Cinco pés de funcho e três de mamão foram partidos ao meio e abandonados no local.

A idealizadora do projeto, a escritora Sandra Fayad, 61 anos, se espantou com os latidos do cachorro por volta das 13h de domingo. Ela correu em direção ao jardim e viu mudas reviradas e misturadas a pedaços de papel higiênico. Sandra havia deixado a horta há menos de meia hora e estava tudo em ordem. ;Arrancaram os bambus, a jurubeba está com os galhos quebrados e a cerca viva acabou no chão. Quando vi aquilo, tive a impressão de que as plantas estavam chorando e chorei também;, lembrou Sandra.

A escritora vive na 713 Norte desde 1984. A ideia de montar a horta surgiu em 2006, quando o pai dela limpou o gramado e o deixou pronto para o plantio de mudas. Meses depois, ele morreu. A filha decidiu levar a plantação adiante para prestar uma homenagem ao pai. A família tinha tradição no cultivo de ervas medicinais, por isso Sandra não teve dificuldade em cuidar do jardim.

A horta começou no gramado em frente à casa da escritora e se expandiu pelas áreas verdes de dois vizinhos, com a aprovação dos moradores. O espaço conta com sistema de irrigação próprio e cerca viva. As espécies são identificadas por placas e há panfletos informativos por toda parte. Fica aberta 24h. Para manter tudo em ordem, Sandra dedica o tempo livre à poda, adubação e a outros cuidados. ;Acontece de eu chegar aqui às 8h e só sair às 18h. Tenho afinidade com a natureza desde que nasci. Eu entendo as plantas e elas me entendem;, explicou.

Sandra cataloga todas as espécies vegetais e animais da horta. A presença de frutos e flores atraiu alguns bichos, que aparecem com frequência na quadra. Tem beija-flor, bem-te-vi, gavião, lagartixas, morcegos e sabiás. Ela tira dinheiro do bolso e conta com a ajuda dos vizinhos para fazer a manutenção. E suspeita que o vandalismo tenha sido praticado por alguém insatisfeito com a iniciativa.

A aposentada Leoni Pasinato, 72, é uma das defensoras da área verde na 713 Norte. Ela se mudou para a residencial há pouco mais de dois anos e reparou na quantidade de espécies mantidas no local. Amante da natureza, Leoni logo se ofereceu para cuidar das plantas. ;Eu cresci na roça, adoro mexer na terra. Amo tudo o que é relacionado à natureza;, comentou. A aposentada retira dali temperos e ervas medicinais para uso doméstico. Quando coloca as mãos em uma planta nova, deixa as mudas crescendo na varanda e depois faz o plantio no gramado. ;Olha quanto espaço vazio tem aqui. A horta é um incentivo para que outras pessoas também cultivem;, opinou a moradora.

Apesar da boa vontade dos voluntários, nem todos os moradores são favoráveis à iniciativa. Sandra lembra que, há três semanas, um proprietário avisou que pretendia remover a parte da plantação que fica em frente à casa dele e cobrir o espaço com grama. A comunidade se mobilizou e coletou mais de 100 assinaturas em um abaixo-assinado em favor do plantio.

A escritora teme que o cultivo seja devastado para a passagem de carros na área verde. Ela luta pelo reconhecimento da horta como um espaço comunitário, de área definida e aberto para visitas e pesquisas. O problema é que a plantação é considerada invasão de área pública. De acordo com a Administração Regional de Brasília, o gramado entre a calçada e a casa não pode ser usado para esse fim ; até mesmo o plantio de uma cerca viva na região seria irregular.

1 - Medicina natural
As ervas medicinais encontradas na horta comunitária são usadas em infusões para curar todo tipo de mal. O alecrim é bom para a digestão de gordura e combate a dor de cabeça. Chá de manjericão ameniza insônia, é diurético e abre o apetite. O capim-santo leva fama de inimigo de gases e cólicas intestinais.