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Azulejos desenhados por Athos Bulcão em 2007 são instalados em prédio da Fiocruz

Imagine os traços das colunas que compõem o Palácio da Alvorada. Agora, reduza o desenho e pinte-o de verde. Ao lado dessa imagem, passe duas linhas curvilíneas em cor azul, uma mais grossa que a outra. É assim o azulejo criado por Athos Bulcão para a ornamentação da sede regional da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em construção no câmpus da Universidade de Brasília (UnB) na Asa Norte. As peças são as últimas desenhadas pelo artista plástico, morto em julho de 2008. E começaram a ser montadas ontem.

O painel projetado por Athos Bulcão em 2007 é grandioso. Vai ocupar uma parede de 25m de largura por 5m de altura. Ao todo, são 3.584 peças divididas em 64 módulos de 56 azulejos cada. A obra de arte ficará aos olhos de qualquer pessoa que passar pelo prédio, pois compõe a fachada do auditório da Fiocruz. Os azujelos têm as formas das colunas do Palácio da Alvorada porque Athos Bulcão quis homenagear o centenário do arquiteto Oscar Niemeyer (em 15 de dezembro de 2007), seu amigo de longa data.

O responsável por assentar os azulejos é o pedreiro João Alves dos Santos, 54 anos, mais de 30 de experiência. Paranaense, ele nunca tinha ouvido falar em Athos Bulcão até ser contratado por uma empresa do estado que venceu a licitação para fazer o serviço na capital federal. Quando chegou a Brasília, João Santos foi ao Congresso Nacional ver um dos painéis de Athos. O pedreiro estudou a obra do salão verde da Câmara dos Deputados e sabe a riqueza que tem em mãos. ;Já vim para Brasília sabendo o que ia fazer. Aceitei o desafio, mas fiquei com um pouco de medo. Será que vou dar conta?;, questionou o pedreiro.

Guiado pelo projeto
João se guia pelo projeto do painel feito por Athos, que orienta a disposição das peças. E procura seguir fielmente o plano do artista. Na última segunda-feira, ele recebeu a visita da diretora-executiva da Fundação Athos Bulcão, Valéria Cabral, que explicou as regras para a montagem do painel: nunca colocar azulejos lado a lado de modo que as linhas curvas fechem um círculo, não juntar mais que quatro peças brancas nem apontar mais do que quatro figuras para a mesma direção. ;Ele também tem liberdade de criar. Assim, se cometer algum erro, não precisa desmontar tudo;, ressaltou Valéria.

Por enquanto, o pedreiro tem preferido não usar a criatividade: coloca cada azulejo de acordo com o projeto. ;Seguindo o projeto, estou respeitando o artista. É melhor assim;, justificou. Ao fim do primeiro dia de trabalho, João confessou que não achou a tarefa difícil. ;Só foi mais complicado acertar como começar. Depois, ficou fácil. É só colocar tudo invertido. Espero que fique bom.;

[SAIBAMAIS]A Fundação Athos Bulcão vai acompanhar a execução da obra. A previsão é que os azulejos estejam assentados até o meio da semana que vem. Em 15 dias, o painel deve estar completo, até com o rejunte pronto. A parede que sustenta os azulejos terá que ser ampliada em 9cm, para que não seja necessário cortar nenhuma peça.


O processo
Athos não deixou milhares de azulejos prontos para o
trabalho. A Fundação Athos Bulcão os encomendou ao
azulejeiro que trabalhou com o artista plástico por mais de 30 anos. O mestre tem uma oficina no Rio de Janeiro e possui as paletas de cores usadas pelos amigo. A figura é impressa nas peças de cerâmica, que, então, vão ao forno para a queima.

; Concluído inventário do acervo no DF

Apenas pouco mais da metade dos painéis de Athos Bulcão espalhados pelo Distrito Federal está em perfeito estado de conservação. A conclusão é do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que divulgou ontem o inventário sobre o trabalho de intervenção na arquitetura feito pelo artista. A equipe da Tríade Patrimônio, empresa contratada pelo órgão para fazer o levantamento, encontrou 261 obras de Athos instaladas em instituições governamentais, estabelecimentos comerciais, educacionais e culturais, hospitais, templos religiosos e casas em todo o DF. Pela avaliação dos técnicos, apenas 174 delas estão bem preservadas, 61 estão em estado aceitável e 26 precisam de recuperação imediata.

O inventário acaba de ficar pronto e, por enquanto, apenas cinco exemplares do livro, que traz detalhes como localização, dimensão e descrição de cada obra, foram feitos. Um deles vai ficar com a Tríade, dois serão dados ao Iphan (para o nacional e para a superintendência do DF), um vai para a Fundação Athos Bulcão e apenas o último ficará disponível para consulta pública, na Biblioteca Nacional. Até dezembro, porém, o Iphan pretende publicar cerca de 2 mil exemplares do livro, em linguagem menos técnica, que serão distribuídos em escolas, faculdades e bibliotecas.

A diretora da Tríade, Lana Guimarães, elegeu quatro locais onde os painéis estão mais bem conservados e as três obras mais abandonadas. O bom exemplo vem do Palácio do Itamaraty, do Congresso Nacional, da Rede Sarah e do Aeroporto Juscelino Kubitschek, que, juntos, guardam 55 obras.

Prédios do governo
Já os três piores, como adiantou o Correio na edição da última sexta-feira, são os painéis da Rodoferroviária, do Mercado das Flores e da Escola Classe 407 Norte. ;Uma das coisas que percebemos é que há uma gestão variada desses bens que se reflete no estado de conservação deles. De uma maneira geral, as obras de Athos em prédios do governo federal estão mais bem preservadas;, concluiu Lana.

Há 52 obras que não passaram pelo inventário porque não foram encontradas, estão destruídas, a autoria de Athos não está comprovada ou os pesquisadores não tiveram acesso ao local onde elas estão instaladas. O superintendente regional do Iphan, Alfredo Gastal, acredita que a documentação vai impedir que casos como o da sede social do Clube do Congresso (que foi derrubada em março deste ano com três painéis do artista) se repitam. ;O inventário tem que ser uma ferramenta de vigilância. Estou até pensando em mandar um exemplar para o Giffoni (Roberto Giffoni, secretário da Ordem Pública). Nosso papel é cuidar daquilo que é de todos os brasileiros;, disse.