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Quer dançar tango? Brasília já tem um baile por semana do mais famoso ritmo portenho

O abraço é cerrado. A música começa e logo pernas e pés se entrelaçam quase incompreensivelmente em giros, caminhadas, cortes, ganchos. O tango arregimenta apaixonados não apenas em Buenos Aires, Argentina. Em Brasília, o mais famoso ritmo portenho ganha espaço, ou melhor, espaços. Já existem na cidade quatro bailes por mês, um por semana, para quem deseja se aventurar ou se aprimorar no baile.

A cena tangueira na capital ainda está bastante circunscrita às academias de dança de salão. Nem por isso é antidemocrática. A confraria recebe adeptos das mais variadas idades, que começam como alunos e se tornam autênticos milongueiros. No último mês, até um restaurante abriu o salão para dançarinos e ouvintes da música, do tradicional Gardel aos expoentes da fusão com o eletrônico, como os grupos Gothan Project e Bajofondo.

As milongas, assim chamados os bailes onde tocam-se o tango (mais lento) e a milonga propriamente dita (mais rápida), ainda atraem os corajosos ; em geral, professores e pupilos aplicados. Os tímidos, no entanto, podem encontrar na pista um palco discreto para dançar com desconhecidos e uma oportunidade para admirar o desenho dos passos e as imponentes coreografias ou improvisações dos mais experientes. ;Um bom milongueiro tem horas e horas de observação;, atesta Cléa de Paula, organizadora do baile mais antigo de Brasília, realizado desde 2006. Antes conhecida como baile da Cléa, a milonga A media luz acontece sempre no último domingo do mês, na Academia de Dança Marcelo Amorim, na 710 Norte.

Por quase um ano e meio, A media luz reinou absoluta em terras brasilienses. Um encontro mensal, no entanto, era pouco. Surgiria, em princípios de 2008, a milonga Entre sueños, promovida no segundo domingo de cada mês por Oscar Ricarte, no Núcleo de Dança do Cresça, na 703/903 Sul. Atraído pelo tango há uma década, quando a mãe começou a ter lições, o professor de 24 anos garante que o público tem crescido. ;O interesse das pessoas vem aumentando, elas veem que se trata de uma dança diferente das outras, mais clássica. Muitas descobrem isso no salão, que é onde se dança o verdadeiro tango;, comenta. Na última Entre sueños, em 12 de julho, cerca de 50 pessoas prestigiaram a festa, enchendo a sala espelhada da academia. Ao contrário das pistas de outros ritmos, não há tanta discrepância entre o número de dançarinas e o de dançarinos. Na maioria das vezes, haverá cavalheiros dispostos a tirar as damas para bailar.

Etiqueta
Exige-se etiqueta no bailado. Quatro a cinco músicas tocam em sequência ; trata-se da tanda. O mesmo casal deve dançar todas. A interrupção se dá com uma canção de outro gênero, como forró ou samba, que pode ser completa ou não. Nesse intervalo batizado de cortina, novos casais se formam e a ronda se reorganiza. No salão, as duplas têm de seguir o fluxo (eis a ronda), movimentando-se em sentido anti-horário.

Os grandes incentivadores da multiplicação das milongas são os próprios produtores. ;Tentamos sempre ir aos bailes uns dos outros, afinal é só um por semana. Também há alguns alunos que frequentam todos os eventos e, assim, vão aprendendo mais;, explica Flávia Valente, carioca que trocou os tablados do Rio pelos de Brasília há um ano e meio. A professora, graduada em licenciatura em dança, trabalha com tango há 14 anos. Ela e João Corrêa, sócios na Academia Estilo e Dança, na 712 Norte, organizam o Bailongo da Estilo no terceiro domingo do mês. O evento conta com um detalhe argentiníssimo ; vendem-se empanadas (uma espécie de pastel assado). No panfleto da academia sobre o ritmo, um recado a quem teme se arriscar: ;Vergonha é algo que deve ficar em casa;.

Boemia
Só faltava mesmo um autêntico argentino para completar o circuito. Ele não só apareceu, como decidiu mexer com a rotina da dança na capital. Guilhermo Abraham optou pelos ares candangos no ano passado, formando parceria com Ana Szerman. Os dois inauguraram em julho a Noites de tango, a única milonga aos sábados (sempre o primeiro do mês, ou seja, hoje) e fora de uma academia, no restaurante Cassimiro (302 Norte). ;O tango faz parte de uma cultura boêmia que combina com o sábado. Por isso, não definimos horário para encerrar o baile: a dança acabará quando o último milongueiro deixar o salão;, diz Abraham. Ele e Ana também dão aulas e lançaram um projeto, patrocinado pelo GDF, de ensinar o ritmo em escolas públicas. Em agosto, o Tango para todos passará por colégios do Paranoá e do Lago Sul.

Agora, com o calendário em dia, basta arrumar a produção para as noites de gala. ;Faço questão de chamar para dançar aquelas colegas que aparecem no baile pela primeira vez. Essa integração cria um clima fraterno entre os milongueiros da cidade, pois o que se preza é a dança;, explica o uruguaio Júlio Ayala, 48 anos, 30 de Brasil, 16 de Brasília. Aliás, Júlio considera injusta a fama exclusivamente argentina do tango. ;Tinha tango na minha mamadeira;, brinca o empresário, que mesmo com música e passos na veia, faz aulas há cinco anos. Ele, a mulher e até a filha, de 10 anos, são assíduos nas milongas.

Outra adepta da dança há pelo menos seis anos é a psicóloga Sueli Amorim, que, em um vestido branco no último domingo, deslizava abraçada ao cavalheiro nas tantas músicas que dançou. Ela explica: ;No tango, a música tem sua importância, mas o abraço é fundamental. É ele que modula a sintonia do par;. Então, que o abraço seja seguro, porém terno, e que siga el baile, como diriam os portenhos.

; Programe-se

- De 16 a 18 de outubro, será realizado o 1; Festival de Tango de Brasília. Haverá aulas com professores de dança do Brasil e do exterior, além de três bailes, o último dos quais no Clube do Exército. Nos três eventos, estão programadas apresentações dos mestres.
As inscrições estão abertas para todos os níveis e os 50 primeiros pacotes vendidos custarão R$ 150 cada um. Informações:



; Homenagem

O evento começou no salão de festas do prédio onde Cléa morava e migrou para uma academia ao ganhar popularidade. A milonga sempre contou com a coprodução de Giovani Fabiano de Almeida, um dos primeiros disseminadores da cultura tangueira em Brasília. Giovani morreu neste ano e foi homenageado no Dia do Tango (8 de junho).

; Para saber mais Da Argentina para o mundo

O tango nasceu em fins do século 19 como um amálgama de batuques dos negros e de ritmos dos imigrantes e dos crioulos descendentes dos primeiros colonizadores. As teorias são muitas, algumas controversas, mas estudiosos tendem a concordar que as palavras tango e milonga têm origem africana ; a primeira seria usada tanto para designar o espaço dentro de casa onde se podia dançar, as próprias danças africanas e até o tocar de um instrumento. A etimologia da segunda pode significar tanto baderna e confusão como um feitiço de amor, o milongo. Enfim, em castelhano, o termo milonga começou a indicar os locais onde negros e mestiços se reuniam para dançar.

O tango surgiria em meio a comunidades mais pobres, nos subúrbios perto do porto de Buenos Aires, na Argentina. Inicialmente, em público, homens dançavam com homens ; contam alguns estudiosos que, à época, considerava-se indecente um homem e uma mulher dançarem juntos. Segundo outros leitores do assunto, porém, isso se devia ao fato de a população feminina ser pequena em uma região com intensa imigração de trabalhadores. Assim, era nos bordéis que se concentrava o baile de mulheres com homens ; nessas casas, aliás, os passos e a música foram descobertos pelas classes mais prósperas.

No início do século 20, a música e a dança chegaram a Paris, na França, causando tremendo sucesso. De 1913 em diante, o tango tomou o mundo, encantado com o ritmo vindo da então rica e glamurosa Argentina, forte parceira de uma Inglaterra ainda imponente. Essa popularidade mudou as letras da música, antes mais lascivas. Nascia assim, já na transição dos anos 20 aos 30, o tango-canção, mais romântico, embora conservando um quê de lamento. Os cantores ganharam fama. O principal deles é quase um clichê, de tão conhecido: Carlos Gardel, morto aos 45 anos em desastre de avião em 1935.

Mas o auge ainda estava por vir ; os anos de ouro do tango (com sua riqueza de variedades da dança) são os das décadas de 1940 e 1950. Destacam-se, nesse período, duas orquestras: a de Carlos Di Sarli, conhecido por um estilo mais lento e elegante, e a de Osvaldo Pugliese, sinônimo de inovação e habilidade em atrair os pares para o salão.


; Onde dançar tango

Primeiro sábado do mês (hoje)
Milonga Noites de tango
Local: Restaurante Cassimiro, na 302 Norte, Bloco D, lojas 3 a 53, Subsolo
Horário: das 21h até o último tangueiro
Entrada: R$ 10
Informações:
9272-2825 (Ana)

Segundo domingo do mês
Milonga Entre sueños
Local: Núcleo de Dança do Cresça, na 703/903 Sul (entrada lateral)
Horário: das 19h às 11h
Entrada: R$ 10
Informações:
8489-4872 (Oscar)

Terceiro domingo do mês
Bailongo da Estilo
Local: Academia Estilo e Dança, na W3 Norte, Quadra 712, Bloco C, Sobreloja 32
Horário: das 19h às 23h
Entrada: R$ 10 (até
20h, R$ 7)
Informações: 3273-2023

Último domingo do mês
Milonga A media luz
(Baile da Cléa)
Local: Companhia de Dança Marcelo Amorim (CDMA), na 710 Norte, Bloco A, sobreloja
Horário: das 19h às 23h
Entrada: R$ 10
Informações: 3274-9261


; Onde aprender tango

Academia Estilo e Dança
W3 Norte, Quadra 712, Bloco C, Sobreloja 32
Informações: 3273-2023
Companhia de Dança Marcelo Amorim
710 Norte, Bloco A, Sobreloja
Informações: 3274-9261

Casa da Dança
707 Norte, Bloco B, Casa 44
Informações: 3349-9908
Dança de Salão Paulo Pivetta
Escola de Parque da 303/304 Norte
Informações: 3245-1797

Centro de Danca Alex Gomes
W3 Norte, Entrequadra 708/709, Bloco F, Loja 1/3, Asa Norte
Informações: 3272-7072

Estúdio de Dança Emmanuel Sócrates
506 Norte, Bloco D, Sala 220, Asa Norte
Informações: 3273-0633

Núcleo de Dança do Cresça
Colégio Cresça, na 703/903 Sul, ao lado da UniDF, Asa Sul
Informações: 8489-4872

Estúdio de Danca By Cia
Entrequadra 712/912 Sul, no Clube dos Previdenciários, Asa Sul
Informações: 3345-6924

Academia de Dança Arthur Murray
QI 15 Bloco G, comércio local, sobreloja, Lago Sul
Informações: 3248-6814

Dança Comigo
CLSW 302, Bloco B, Subsolo, Edifício Parque Center, Sudoeste
Informações: 3344-9636

Escola de Dança Corpos em Par
CNB 4, Lote 10, 2; andar, Taguatinga Norte
Informações: 3563-1260