As dores de cabeça do menino Lucca Souza, 11 anos, sempre preocuparam a mãe, a frentista Adriana Souza, 28. No entanto, foi somente quando o garoto perdeu a visão de uma hora para outra que ela percebeu que tinha algo de errado com o filho. Uma ressonância magnética revelou o problema: um tumor no cérebro. Sem recursos para tratar da doença em Rio Branco, no Acre, Adriana conseguiu uma ajuda do governo local para trazer o filho a Brasília. E, assim, a mãe, preocupada com a saúde do filho, se viu de repente sozinha em uma cidade estranha, onde não contava com o amparo de amigos ou parentes. ;Nunca tinha saído de Rio Branco. Não conhecia ninguém por aqui;, lembrou.
Tudo isso contribuiu para aumentar o estado de aflição da frentista, que passou os dois primeiros meses de sua estadia na capital federal a acompanhar o filho no Hospital de Base, sem ter um lugar onde ficar. Chegou a procurar pousadas, mas se assustada com os custos, muito mais altos do que em sua cidade natal. Sem emprego, Adriana não sabia o que fazer, até uma assistente social a apresentar para a Associação Brasileira de Assistência às Famílias de Crianças Portadoras de Câncer e Hemopatias (Abrace). ;Não sei o que seria de mim sem o apoio que me deram. Eles ajudam a gente em tudo. Sou muito grata ao serviço que fazem pelo meu filho;, desabafou. Lucca é uma das oito crianças atendidas atualmente pela Casa de Apoio da entidade, localizada provisoriamente na QI 07 do Guará I ; a casa definitiva passa por reformas. É lá que ficam hospedados os pacientes de outros estados.
A visão do menino retornou após três semanas de agonia. Os médicos descobriram que o tumor pressionava os nervos óticos e conseguiram resolver o problema com uma cirurgia. Ainda assim, só depois de entrar na casa de abrigo da Abrace é que o garoto voltou a sorrir. Faz três anos desde o primeiro contato que mãe e filho tiveram com a entidade. E a Abrace nunca faltou nos momentos de necessidade, nas diversas idas e vindas entre Rio Branco e Brasília.
Fundada 23 anos atrás, a Abrace assumiu a missão de dar assistência para crianças e adolescentes portadores de câncer e hemopatias. Atualmente, a instituição possui mais de 700 jovens cadastrados, que residem no Distrito Federal e em outros estados. Ela oferece vários serviços, que vão desde alimentação e entrega de medicamentos até a realização de reformas nas casas onde moram os pacientes (para que as condições precárias não coloquem em risco a saúde dos doentes) e assistência odontológica e psicológica.
A Abrace cresceu muito nos seus 23 anos de existência e, em 2005, começou a tirar do papel um projeto que irá estender ainda mais a abrangência da entidade: a construção do Hospital da Criança de Brasília. Orçado em R$ 40 milhões, as obras da primeira etapa já foram concluídas. A área de atendimento ambulatorial, quimioterapia e diagnóstico básico está pronta, com previsão de ser inaugurada no primeiro semestre de 2010. Falta conseguir a mobília e equipamento necessário para que as portas sejam abertas. A segunda etapa da obra, que compreende as áreas de internação, diagnóstico especializado, cirurgia e centro de cuidados do cuidador, ainda depende da arrecadações de recursos, conseguidos por meio de doações e campanhas, como o Mcdia Feliz.
A ajuda dada pela Abrace hoje ultrapassa os limites do simples assistencialismo. A entidade conta também com programas de capacitação para pais e mães beneficiados. ;Percebemos que podíamos ajudar alguns dos beneficiados, que não têm uma ocupação, a se virarem sozinhos;, resumiu o vice-presidente da Abrace, Newton Alarcão. Outros programas procuram dar apoio a famílias com pacientes sem possibilidade de cura, oferecendo todo o suporte psicológico e recursos necessários para garantir a qualidade de vida do doente. A Abrace também ajuda a cuidar dos pais após a perda da criança assistida. Eles ainda oferecem encaminhamento aos jovens que completam 18 anos para outras entidades que auxiliam pacientes com câncer.
O sentimento de gratidão permeia as famílias atendidas pela Abrace. ;Não imaginava o tanto que as pessoas podem ser boas;, confessou a dona de casa Shilma Nunes, 27 anos, moradora de Unaí (MG). Desde que descobriu um tumor inoperável no cérebro da filha Maria Eduarda, de um ano e sete meses, ela tem vivido um calvário. Dificuldade que passou a enfrentar melhor após receber ajuda da Abrace. ;Minha filha precisa de um leite especial que custa R$ 140. Logo que me cadastrei, já me deram nove latas. E não parou mais. Na última visita que me fizeram, deram 22 latas. Não tenho nem como agradecer;, contou.
COMO AJUDAR
Para fazer uma doação ou obter mais informações sobre o trabalho desenvolvido pela Abrace, basta ligar para os números 3212-6000 ou 3212-6070, ou ainda acessar www.abrace.com.br.
Serviço voluntário na essência
A luta da Abrace teve início em 1986, quando um grupo de pais, com filhos internados no Hospital de Base para tratamento de câncer, perceberam o sofrimento de famílias mais pobres sem esperanças para combater a doença. Assim, os pais se uniram para formar a instituição filantrópica declarada de utilidade pública, que desde o início contou com a disposição de voluntários para ajudar as famílias necessitadas. Apesar de hoje contar com um quadro de funcionários fixo, a base da Abrace ainda é formada pelo serviço voluntário. Característica que se estende até a direção da entidade. ;Recebemos ajuda de pessoas de todo tipo. Desde pais, como nós, que sentiram na pele as dores de ter um filho com câncer, até pessoas que decidiram nos procurar apenas pela vontade de oferecer a mão ao próximo;, detalhou o vice-presidente, Newton Alarcão.
O publicitário Marcos Barros, 32 anos, se encaixa no perfil altruísta mencionado pelo vice-presidente. Ele entrou na Abrace, três anos atrás, movido pela vontade de reservar uma parte do seu tempo para ajudar crianças. Desde então, todos os domingos ele leva as crianças da Casa de Apoio para passear em algum lugar, como zoológico ou shopping. ;Isso ajuda a dar motivação para a família e quebrar o desânimo que o tratamento pode trazer;, disse. ;Esse trabalho é uma via de mão dupla. Ao mesmo tempo que você se doa para alguém, também recebe em retorno um carinho enorme que justifica tudo;, concluiu.