Depois de um freio na abertura de instituições de graduação nos últimos dois anos, o crescimento da oferta de vagas no ensino superior no Distrito Federal ocorre, atualmente, nos cursos de pós-graduação lato sensu.(1)Instituições tradicionais da capital, como a Universidade de Brasília (UnB), UniCeub, Católica, UDF e Iesb, abriram nos últimos quatro anos cursos de qualificação de curta duração. Aqueles que duram de 12 a 18 meses custam até R$ 15 mil. Apesar de não haver cadastro e controle da oferta, levantamento do Correio aponta para a existência de, pelo menos, 25 instituições que oferecem MBAs (2)no DF.
Na edição de ontem, o Correio mostrou que existem pelo menos 160 mil alunos em cursos de graduação e pós-graduação no DF. Segundo dados do Ministério da Educação, mais de 23% dos brasilienses de 18 a 24 anos estão nos bancos das faculdades. No resto do país, esse número não ultrapassa a média de 13%.[SAIBAMAIS]
A maior oferta de pós-graduação vem da UnB, com 8.430 alunos. Mas também há turmas de pós na Fundação Getulio Vargas, que funciona desde o fim da década de 1970 em Brasília. Atualmente, a FGV tem 1.130 estudantes. Os cursos são procurados, principalmente, por servidores públicos que investem na carreira em busca de aumento de salário. Não são poucos os órgãos que, no plano de carreira, valorizam a qualificação profissional com pós-graduações.
Com isso em mente, Henrique de Faria, de 32 anos, planeja entrar num MBA no ano que vem. Ele trabalha no Ministério Público da União (MPU) e foi aprovado no concurso para nível médio. Após o ingresso na instituição, ele se formou em administração de empresas. O diploma de graduação rendeu um aumento mensal de 5% no salário. ;Se eu fizer o meu MBA, vou ter reajuste de mais 2,5%. E, se for na minha área, o MPU ainda ajuda a pagar;, planeja.
O colega dele, Rafael Torres, de 37 anos, já fez uma pós lato sensu. Em 2002, ele investiu num MBA de gestão para se valorizar dentro da empresa de telefonia em que trabalhava. ;Foi caro, mas me ajudou a garantir empregabilidade no mercado tão competitivo;, explica. Agora, ele estuda para um concurso público e conta com uso da pós na hora da seleção.
Na época que Rafael fez o MBA, eram poucas as ofertas de vagas se comparadas às de hoje. E o número tende a aumentar. As instituições particulares apostam, agora, na pós de baixo custo para trabalhadores da classe C. De acordo com o presidente da consultoria Hoper Educacional, Ryon Braga, é esse o novo filão de crescimento do ensino superior no DF. ;O mercado atual de graduação e pós para as classes A e B está próximo da saturação. Mas há um grande espaço para as instituições com valores mais baixos;, explica. ;Abrir instituição de graduação para cobrar R$ 1 mil por mês não é um bom negócio em Brasília. Mas dá para crescer cobrando entre R$ 250 e R$ 300;, acrescenta.
Custo
Maior grupo de ensino superior do país, com mais de 250 mil alunos, a Anhanguera, por exemplo, se instalou em Taguatinga com a compra da Faculdade JK. No momento, são pouco menos de mil alunos em pós e outros 10 mil na graduação da Anhanguera do DF. Ao contrário do alto investimento dos alunos nos MBAs tradicionais, na instituição o curso todo não sai por mais de R$ 2.600.
;Aqui, no DF, existe uma grande demanda por formação porque qualquer cargo com ensino superior ou especialização faz muita diferença;, explica Carlos Ramos, diretor regional da Anhanguera. ;O salário triplica para quem tem curso superior. A média salarial para gente com ensino médio é de R$ 980 e para quem tem ensino superior é de R$ 2.700.; A maior procura dos cursos, segundo ele, está concentrada nas áreas de gestão de pessoas, de processos e enfermagem em Unidade de Tratamento Intensivo. ;Os três cursos servem para inserção ou promoção no mercado;, completa.
O professor do Departamento de Educação da UnB Erasto Fortes se mostra preocupado com tal avanço. ;Os estudantes devem tomar cuidado com esses cursos porque não existe fiscalização rigorosa sobre os cursos e qualquer instituição pode oferecer;, avalia. ;Eles colocam nomes chiques e em inglês para parecer muito bom, mas muitas (faculdades) são, em geral, caças-níqueis;, alerta.
1 - APRIMORAMENTO
De acordo com definição do Ministério da Educação, cursos de lato sensu são de especialização em nível de pós-graduação voltados às expectativas de aprimoramento acadêmico e profissional, cuja duração, em geral, é de um a dois anos. Uma portaria de 2007 permite que qualquer instituição de ensino superior ofereça e, portanto, não há controle e fiscalização dos cursos.
2 - SIGNIFICADO
Oferta mais comum de pós lato sensu, MBA é a sigla em inglês para Master in Business Administration. Na prática, é um curso que equivale à pós-graduação em administração de empresas. Ele pode ser oferecido pela própria empresa para qualificar os profissionais. Nesse caso, chama-se MBA in company.
O número
1.130
Total de alunos que fazem especialização na FGV. A maioria, servidores públicos.
Eu acho...
;Existe uma pressão grande para os jovens, de forma geral, mas, conversando com as pessoas, tenho a impressão que aqui em Brasília é pior. Pensando em uma formação diferenciada, eu me formei em publicidade no Iesb e estou terminando ciência política na UnB. As duas formações vão me ajudar a trabalhar com marketing político. Talvez, ainda faça uma especialização em São Paulo.;
Danilo silvestre, estudante da UnB
Palavra de especialista
Falta de controle
;A ausência de uma regulação das pós-graduações lato sensu é perigosa. Quando se joga para o mercado a função de monitorar a oferta de ensino, o Estado fica isento dessa responsabilidade. Atualmente, o Ministério da Educação não dá conta de acompanhar os cursos de pós-graduação. Tudo é permitido já que as grandes exigências feitas para o mestrado e o doutorado não passam pelo lato sensu e vão diminuindo.
O problema está ligado ao fato de a pós-graduação lato sensu ter se apresentado como via necessária para a entrada no mercado de trabalho e, também, como espaço para qualificação profissional, o que tem alavancado a demanda para essa modalidade de ensino. O setor privado ficará mais agressivo com a baixa sistemática na oferta.
No entanto, ainda mais grave é o fato de grupos que não têm tradição em educação assumirem grandes instituições de ensino. Nesse caso, é o setor privado que manda inspirado apenas no retorno financeiro. O governo deve criar uma política de regulação para coibir os abusos e a má qualidade da oferta.;
Carlos Medeiros, professor do Departamento de Educação da Universidade de Brasília