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Cidades

PMs acusados de matar brasilienses na Bahia devem ser julgados hoje

Está prevista para hoje a quarta tentativa de julgamento dos cinco policiais militares acusados de torturar e executar dois brasilienses no interior da Bahia. O caso, ocorrido em 1998, se arrasta há 11 anos na Justiça. Houve três adiamentos desde a primeira sessão, em dezembro de 2008. Desta vez, familiares das vítimas e entidades de direitos humanos denunciarão o Brasil a cortes internacionais caso os acusados escapem novamente de uma sentença em São Desidério (BA). Sentarão no banco dos réus os cinco PMs baianos denunciados pelas mortes do policial civil do DF Jésus Antônio de Oliveira e do técnico do Ministério da Fazenda Daniel Pereira da Silva. O tenente Alexandre César Freire Lima, o sargento Paulo Tasso Costa e os soldados Carlos Alberto Ribeiro Nunes, Reinaldo Silva dos Santos e Ronaldo Silva dos Santos, da PM de Barreiras (BA), respondem a processo por duplo homicídio triplamente qualificado. E jamais deixaram de exercer as funções na corporação. Além do desfecho demorado, o processo chama a atenção pelas pressões e os imprevistos. O primeiro julgamento acabou suspenso quatro minutos antes do início. O advogado de um dos réus alegou cirurgia dentária para justificar a falta. A informação chegou via fax. O júri ficou para março deste ano. Mas a intimidação de testemunhas por PMs armados nos arredores da comarca adiou a definição. A terceira tentativa, em junho, ficou sem desfecho após dois dias de trabalho. Um jurado passou mal. Em todas as ocasiões, familiares e representantes de órgãos de direitos humanos viajaram até o município distante 580km de Brasília e 869km de Salvador (BA). Voltaram frustrados, como a irmã de Jésus, Affonsa de Ligório Oliveira, que aparece entre as 41 testemunhas citadas na denúncia do Ministério Público (MP) local. Segundo ela, os detalhes dos crimes evidenciaram sinais de tortura. ;É difícil acompanhar o julgamento, mas necessário. Para matar, foram rápido. Mas a justiça demora;, reclamou. Direitos humanos Representantes da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), do governo baiano e da Polícia Civil do DF estarão em São Desidério a partir de hoje. O advogado Dálio Zippin Filho, membro da Comissão Especial de Direitos Humanos do Conselho Federal da OAB, atuará como assistente da acusação. Segundo ele, nada do julgamento anterior será aproveitado. ;Vai recomeçar do zero, pois o último acabou com a dissolução do corpo de jurados.; Caso o julgamento em São Desidério seja adiado mais uma vez, Zippin denunciará o Judiciário baiano e o Brasil à Corte Internacional de Direitos Humanos(1), da Organização dos Estados Americanos (OEA). ;Só se leva algo ao conhecimento deste tribunal quando todos os recursos estão esgotados. Mas, nesse caso, a morosidade da Justiça fará valer a denúncia;, explicou. A condenação é moral, mas podem ocorrer ordens para indenizações. A previsão é de que o júri baiano se prolongue até quarta-feira. 1 - VERGONHA INTERNACIONAL O tribunal com sede em São José, Costa Rica, é independente e formado por sete membros eleitos em Assembleia-Geral da OEA. O Brasil reconhece a competência dele. E, dos 25 membros da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, o país aparece em 5; lugar no ranking das denúncias em trâmite. São 108 processos contra o Brasil por casos graves de violações. Fica atrás apenas de Peru, Argentina, Colômbia e Equador. MEMÓRIA Tortura e morte As mortes do policial civil do DF Jésus Antônio de Oliveira (foto) e do técnico do Ministério da Fazenda Daniel Pereira da Silva ocorreram em fevereiro de 1998. Ambos moravam em Sobradinho. Conheceram-se na infância. E perderam a vida a caminho da confraternização anual da turma, em 8 de fevereiro daquele ano, em Angical (BA). Enquanto mais de 30 pessoas seguiam em um ônibus alugado, os amigos dirigiam um Gol. Acompanharam o grupo até que um problema nos pneus do ônibus os dividiu. Continuaram a viagem por algumas horas, mas pararam para descansar às margens da BR-020. A investigação levantou que os acusados os abordaram ao concluir que se tratavam de assaltantes. Atiraram em direção ao carro, e um tiro pegou em cada. Jésus fugiu. Daniel acabou executado com um tiro na nuca. O policial civil correu 9km ferido e pediu ajuda a um agricultor. Imaginava-se vítima de assalto. Ao sair de carona, porém, os PMs o localizaram. Não adiantou se identificar. Sofreu torturas e levou três tiros. Os cinco voltaram a Barreiras (BA) e apresentaram os corpos como de ladrões de ônibus.