Os donos de bares e restaurantes de BrasÃlia reagiram à notÃcia de que seus estabelecimentos têm sido visitados por policiais disfarçados de clientes. A estratégia da PolÃcia Militar para apoiar a fiscalização da lei seca do trânsito foi revelada ao Correio pelo comandante do Batalhão de PolÃcia de Trânsito (BPTrans), tenente-coronel José Ricardo Cintra. O presidente do Sindicato dos Bares e Restaurantes (Sindhobar), Clayton Machado, foi logo cedo, ontem pela manhã, cobrar uma posição do secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, Valmir Lemos de Oliveira. O representante da categoria também passou a tarde tentando, sem sucesso, falar com o governador José Roberto Arruda ou com o secretário de governo, José Humberto Pires. Como a única posição obtida foi uma promessa do secretário de estudar o caso, a direção do sindicato pretende se reunir hoje para tomar alguma atitude. Não está descartada uma ação judicial contra a atitude da PM.
O coronel Cintra estranhou a repercussão do assunto e disse que a estratégia já era adotada antes da aproximação das festas de fim de ano. Segundo ele, a utilização de agentes à paisana vai continuar. ;Não mudamos o policiamento e vamos continuar com a fiscalização rÃgida da lei;, afirmou.
Machado classificou de fascista e de bravata a estratégia do BPTrans. ;A sociedade tem que abrir o olho. Estamos vendo o retorno da ditadura;, disse. ;Já não basta a fiscalização na porta do bares, agora a polÃcia tem que estar dentro dos estabelecimentos?;, questionou. O presidente do Sindhobar definiu os policiais que ficam escondidos vigiando os clientes dos bares de espiões.
O Correio ouviu quatro especialistas no tema. Só um questionou a constitucionalidade da medida adotada pelo BPTrans, mas nem todos concordaram com o conceito. ;Fere a privacidade das pessoas. Portanto, é inconstitucional e ilegal;, argumentou o professor de direito da Universidade de BrasÃlia (UnB), Frederico Viegas. Para ele, o Estado só pode fazer a vigilância nos bares e restaurantes se for com agentes uniformizados. ;Não adianta o policial estar à paisana;, disse.
A posição do professor da UnB é contestada pelo jurista Ives Gandra Martins. ;O policial pode sim fiscalizar dessa forma. As polÃcias do mundo inteiro fazem isso. Não é a roupa que dá condição de polÃcia ao agente, mas seu status policial;, analisou. ;Quem está num bar não tem privacidade. Nada impede um policial de estar observando-o;, reforçou.
O conselheiro da seccional local da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF) Cleber Lopes concorda com Gandra. ;Embora a PM não tenha em sua esfera de atribuições a investigação, ela conta com parte de sua guarnição incumbida de exercer determinado monitoramento à paisana. O que está fazendo nada mais é que acompanhar o movimento das pessoas;, disse. ;O que o Estado não pode é interferir no cenário, provocando a ingestão de bebida alcoólica;, teorizou.
Policialesco
O jurista Luiz Flávio Gomes, criminalista e professor da Faculdade Anhangüera, de São Paulo, também não vê ilegalidade na atuação dos PMs à paisana dentro dos bares para detectar quem está infringindo a Lei 11.705/08, que proÃbe qualquer concentração de álcool no sangue de quem conduz automóvel. ;É legal;, disse. ;Mas acho insuficiente e policialesco. Só serve para procurar bode expiatório;, afirmou. Para ele, as blitzes na rua são a estratégia correta. ;Numa barreira, se fiscaliza de 20 a 30 pessoas por hora e todo mundo vê;, disse, em referência ao impacto da fiscalização na opinião pública. Na concepção dele, a estratégia adotada pelo BPTrans tem efeito limitado por demandar tempo e resultar em menos abordagens.
O consultor de trânsito e ex-presidente da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) de São Paulo, Gilberto Lehfeld, também não vê efetividade na medida implantada no DF. Para ele, o trabalho de fiscalização da lei seca se compara ao do garimpo na beira dos rios ; precisa de tempo procurando ouro no meio da lama e da água para se encontrar uma pepita. Segundo Lehfeld, a medida eficiente é a abordagem do maior número de pessoas e a realização de grande número de testes de bafômetro. Ele cita paÃses europeus, como a Suécia, que alcançaram resultados com a realização de milhares de testes de bafômetro. ;A fiscalização tem que ser em massa e todo fim de semana. Quando encontramos 1% a 2% de motoristas alcoolizados em centenas de fiscalizados é muito.;
Reforço de 140 bafômetros
O Distrito Federal irá ganhar 140 etilômetros, mais conhecidos como bafômetros, do Ministério da Justiça. A entrega faz parte dos investimentos feitos no Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), que busca combater a violência em todo o paÃs com foco na preservação da vida. Cada equipamento custou R$ 7,6 mil aos cofres públicos. Eles serão entregues à PolÃcia Rodoviária Federal (PRF). A expectativa é de que os etilômetros cheguem à cidade antes do dia 31 e sejam usados nas operações de ano-novo. ;O bafômetro já mostrou que é útil. Seu uso correto resultou em uma diminuição no número de acidentes e, principalmente, no número de mortes no trânsito em BrasÃlia;, defendeu o governador José Roberto Arruda.
Presidente do Sindhobar, Clayton Machado: "Por policiais à paisana em bares é fascismo"